Olhar estrangeiro: americanos ainda não entendem a seleção de Klinsmann

Graham Parker

Do The Guardian US (EUA)*

Há uma discussão de que o plano de Jurgen Klinsmann para a Copa do Mundo de 2006 na Alemanha só foi claro depois de uma análise retrospectiva, já que só depois que o torneio começou é que ele conseguiu conduzir o muito criticado e jovem time alemão à reação. A esperança de que ele esteja utilizando o mesmo método com a seleção dos Estados Unidos, apesar de contar com recursos mais limitados e sob circunstâncias logísticas mais desafiadoras, está por trás de todo o otimismo que cerca a futura campanha da seleção americana.

Klinsmann partiu de um esquema bastante defensivo, nos primeiros estágios da preparação da seleção, para formações mais expansivas nos jogos mais recentes. No começo, os torcedores faziam piadas sobre a quantidade de volantes empregados, como se ele estivesse querendo congestionar o meio de campo na esperança de que a bola ricocheteasse e entrasse no gol. Mas depois que Klinsmann definiu alguns jogadores para essa área do campo, o foco mudou para outras áreas problemáticas da seleção, como os laterais.

Com o passar do tempo, Klinsmann demonstrou a tendência de jogar com um 4-2-3-1, colocando Michael Bradley na função do volante que chega ao ataque e Jermaine Jones correndo ao seu lado. Com este sistema, Clint Dempsey normalmente joga atrás do atacante e Landon Donovan e/ou Graham Zusi, do Sporting Kansas City, abertos na ponta. Na maioria das vezes Jozy Altidore, apesar do terrível ano no Sunderland, tem sido o homem de frente, apesar de sua permanência em Wearside poder ameaçar o seu lugar, já que Klinsmann acredita que o condicionamento físico, e não a reputação, é que determinará a escolha de sua seleção.

O problema para Klinsmann, e para aqueles entre nós que tentam adivinhar os seus movimentos táticos, é a dualidade que se apresenta nas diferentes escalações de jogadores em diferentes estágios nas temporadas que disputam. Em um mês aparece um elenco recheado de jogadores da MLS e de americanos que jogam no México, enquanto no outro equipe é escalada com os jogadores que atuam na Europa, em especial com um número de germano-americanos que Klinsmann tem descoberto, ao estilo Jack Charlton, desde que assumiu o comando.

Isso fez com que assistíssemos nas duas últimas partidas preparatórias, antes da convocação da seleção, um time apático, apresentando um Altidore isolado na frente perder para a Ucrânia em Chipre, seguido por uma seleção de jogadores da liga MLS, com um meio de campo experimental em forma de diamante jogar, contra o México no Arizona. Neste jogo, Kyle Beckerman, um possível substituto para Jones e Bradley, jogou na função defensiva que joga no seu time, Real Salt Lake, enquanto Bradley foi avançado para a ponta do diamante. No primeiro tempo, tudo funcionou bem, e os EUA abriram uma vantagem de 2 a 0, mas ao final do jogo a seleção teve sorte em conseguir manter o placar em 2 a 2, quando o México ajustou sua formação.

Como uma resposta tática para a defesa mexicana de cinco homens, quase funcionou, mas se serviu de alguma forma para ajudar na preparação para a Copa do Mundo, ninguém sabe. E esse é o problema. Com a mudança radical da equipe a cada jogo, fica difícil enxergar para onde o pensamento tático de Klinsmann está conduzindo a seleção, apesar de que em seus comentários sobre "aprender a jogar compactado" e avançar rapidamente para o ataque, fique subentendido a compreensão da realidade tática defensiva de uma fase de grupos contra Gana, Portugal e Alemanha. Os torcedores americanos esperam que os planos de Klinsmann logo sejam revelados.

Perfil: Michael Bradley

Michael Bradley funciona como um tipo de Pedra de Roseta na seleção dos Estados Unidos. De sua posição recuada no meio de campo, Bradley é o jogador que, mais do que qualquer outro, domina todos os dialetos do futebol norte-americano.

A seleção de Jurgen Klinsmann às vezes tem dificuldades para equilibrar a técnica de posse de bola mexicano-americana, o vigor atlético da MLS (liga principal do futebol dos EUA) e a influência germano-americana de Klinsmann e, por isso, em alguns momentos o viajado e experiente Bradley parece ser o único jogador da seleção que consegue se comunicar com as várias linguagens futebolísticas de cada um de seus companheiros de equipe.

Não é de se admirar que o ex-jogador americano, agora analista da "ESPN", Alexi Lalas, o chame de homem de ligação dentro do campo. "Eu acho que ele é o jogador dos jogadores", diz Lalas. "Não importa de onde você venha, ele te compreende e você consegue compreendê-lo. No campo ele é literalmente o homem de ligação, mas acredito que fora do campo também desempenhe essa função, por causa de sua experiência e da sua compreensão do jogo. Ele consegue jogar com qualquer jogador. Agora não existe nenhum jogador mais importante na seleção dos Estados Unidos, nem aparecerá um mais importante neste ano"

Simplificando, sempre que a mistura especial da seleção americana para de funcionar, você quase sempre poderá apostar que o jogador que irá fazer a máquina retomar o funcionamento harmonioso será Bradley.

No entanto, essa sua qualidade nem sempre foi reconhecida. Na verdade, durante um longo período ele foi mal compreendido ou provocou desconfiança. Selecionado por seu pai/técnico, Bob, para o seu primeiro time profissional, o New York Metrostars, e depois novamente para a seleção nacional quando seu pai se tornou o técnico, Bradley lutou para superar a sugestão de nepotismo, mesmo após o time holandês Heerenveen ter transformado ele no mais jovem jogador a ser contratado da MLS em 2005, quando notaram seu potencial em uma partida amistosa de pré-temporada.

Sua cabeça raspada e seu comportamento carrancudo também ajudaram a criar uma imagem estereotipada de xerife, quando na verdade sua inteligência natural e boa compreensão do jogo fazem que ele esteja sempre procurando um papel mais criativo no meio de campo, sem jamais fugir da necessidade do trabalho pesado. Após boas passagens pela Holanda e pela Alemanha, e um curto e infeliz empréstimo ao Aston Villa, Bradley realmente floresceu quando recebeu a chance de se mudar para a Itália, possivelmente porque (e não de apesar de) foi jogar em um dos times menos famosos da Série A.

Foi no Chievo que a compreensão de Bradley sobre os aspectos táticos do jogo foi aprimorada enquanto o jogador, que se tornou fluente em italiano no espaço de três meses, absorvia a filosofia de treinamentos baseada em encontrar formas para competir em jogos contra times com mais qualidade. Bradley declarou recentemente: "Os times pequenos da Itália estão convencidos que o único modo de serem competitivos é serem taticamente perfeitos e taticamente preparados para qualquer cenário... nos dias que antecediam uma partida do Chievo, nós ficávamos no campo durante duas horas e meia e o técnico ficava gritando como um louco sobre as cobranças de lateral, saídas do goleiro e tiros de meta. Ele colocava 11 pessoas alinhadas para nos mostrar o que fazer em um tiro de meta".

Lalas, um colega americano que também conheceu o futebol italiano, concorda. "Michael é um jogador dez vezes melhor do que eu fui, mas eu aprendi muito quando joguei na Série A italiana por causa do modo como eles encaram o futebol, a disciplina tática e a devoção e paixão que sentem pela tática do jogo. Acho que quando ele chegou à Itália, ele se viu imerso em uma cultura que pensava como ele. E ele evoluiu como pessoa e como jogador vivendo naquela cultura, porque era parecida com a sua interpretação do jogo. Ele tinha as ferramentas para executar essa filosofia."

Esse tipo de filosofia será crucial para as esperanças dos Estados Unidos no Brasil, onde podem esperar jogar grande parte de seus três jogos na fase de grupos, contra Gana, Portugal e Alemanha, em desvantagem, na esperança de aproveitar as raras oportunidades que venham a aparecer. Para aqueles que não são confiantes é um tipo de dinâmica de jogo que pode gerar um acanhamento. Para Bradley, que aprecia um contra-ataque bem aplicado e que em uma recente entrevista declarou que a domínio da posse de bola "é a estatística mais supervalorizada", lutar na defensiva combina com seu estilo.

O estilo de jogo de Bradley já foi parecido com o de Roy Keane, mas foi modificado para o estilo mais sutil de passes longos e curtos de Demetrio Albertini durante sua estadia na Itália. Em sua parceria com Jermain Defoe no Toronto, não é incomum observar Bradley lançando bolas através de pequenos espaços para que o inglês corra atrás.

É claro que ainda existem momentos em que apresenta o estilo direto de Keane. Se você assistir aos melhores momentos da campanha das eliminatórias para a Copa do Mundo, verá que durante uma partida contra o Panamá, em Seattle, Bradley corre até o meio do campo, sem dar a impressão que estava correndo para o gol do Panamá, parecendo que iria passar por cima do goleiro. Quando chega perto do limite da área, ele lança uma bola aberta até um companheiro na pequena área finalizar e só depois disso Bradley muda de direção e corre para comemorar. Com toda sua capacidade de movimentação, o "homem de ligação" sabe que a menor distância para o gol é em uma linha reta, correndo na hora certa. Os torcedores americanos esperam que este seja o mês de Bradley.

Jogo Rápido - EUA
  • Quem será o jogador que surpreenderá a todos na Copa?
    Existe uma grande expectativa sobre o meia-atacante Graham Zusi, mas observem o seu companheiro do Sporting Kansas City, o zagueiro Matt Besler. Ele é o capitão dos atuais campeões da MLS. Tem havido mais comentários nos últimos dois anos sobre o parceiro de Besler na defesa, Omar Gonzalez, mas desde que passou a acompanhar Gonzalez na seleção, Besler sem dúvida tem sido o atleta mais consistente
  • Qual é a meta realista de sua seleção na Copa do Mundo e por quê?
    O 1º jogo contra Gana, nas palavras de Klinsmann, será ?uma final?, e qualquer outro resultado que não a vitória diminuirá terrivelmente as chance de classificação. Mas se eles conseguirem absorver a pressão e contra-atacar com calma, podem com certeza atrapalhar Portugal e talvez esperar que a Alemanha já tenha feito o suficiente para que possam conseguir um bom resultado também no jogo final.

Curiosidades - EUA
  • Best Photo Agency & C / Pier Gia
    Omar Gonzalez
    Gonzalez será observado com cuidado, especialmente depois que o seu condicionamento físico caiu para um nível inferior ao que o levou para a seleção há um ano. Sua reputação não foi ajudada pelos grandes lapsos de concentração durante as partidas, apesar dos problemas que ele criou para si mesmo não pararem por ai. Aqui ele é visto usando um saxofone para tapar sua dignidade no Instagram. Foto: Best Photo Agency & C / Pier Gia
  • Best Photo Agency & C / AB
    Kyle Beckerman
    Talvez Kyle Beckerman não pise nos gramados do Brasil (com o titular Jermaine Jones sendo uma verdadeira máquina de cartões amarelos, sempre existe uma chance). Mas a 1ª vez que a câmera de TV filmar o banco de reservas deverá garantir que o capitão do Salt Lake alcance a condição de ícone entre os descolados do futebol, por causa de seus dreadlocks (ele afirma não cortar o cabelo há 9 anos). Foto: Best Photo Agency & C / AB
  • Divulgação
    Jermaine Jones
    O cabelo de Beckerman não é o que chamará mais a atenção dos cabeleireiros entre os jogadores dos EUA. Essa honra deverá ser conferida à Jermaine Jones, que em uma partida vergonhosa das eliminatórias para a Copa, jogada em meio a uma nevasca no ano passado, nos deu o hashtag #snofro. É curioso que o homem que jogará ao lado de Beckerman ou Jones, Michael Bradley, não tem cabelo nenhum. Foto: Divulgação
  • Best Photo Agency & C / AB
    Graham Zusi
    Quando tinha oito anos, Zusi fez parte da cerimônia de abertura da Copa de 94. Então, se os EUA avançarem para a 2ª fase e enfrentarem uma disputa de pênaltis, esse homem viu pessoalmente o que não se deve fazer ao assistir Diana Ross. Um dos rostos do atual campeão da MLS, o Sporting Kansas City, muitas pessoas acreditam que ele será o substituto natural de Donovan. Foto: Best Photo Agency & C / AB

* Este artigo é parte da série "Olhar Estrangeiro", produzida por 32 veículos de mídia dos países que disputam a Copa do Mundo, como UOL, Guardian (Inglaterra) e France Football (França).

Tradutor: George El Khouri Andolfato

Veja também



Shopping UOL

UOL Cursos Online

Todos os cursos