Olhar estrangeiro: lateral da Costa do Marfim tem estilo de Roberto Carlos
François Kouakou
Do Challenge (Costa do Marfim)*
Quando Serge Aurier fez sua estreia pela seleção da Costa do Marfim, contra Gâmbia pelas eliminatórias da Costa do Marfim, em junho passado, não imaginou que chegaria tão longe tão rápido. Hoje o jogador de 21 anos de Ouragahio, uma pequena cidade no oeste da Costa do Marfim, está a caminho do Brasil com o filho mais famoso de seu país, Didier Drogba, jogador com quem compartilha um passado semelhante -- e talvez, só talvez, um destino semelhante.
Como Drogba, que vem da mesma região, Aurier trocou sua terra natal pela França muito cedo. Estudou futebol em Villepinte, departamento de Seine-Saint-Denis, começando como meia defensivo, antes de ser contratado, juntamente com seu irmão Christopher, pelo Lens em 2006. Sua personalidade forte o levou a ser indicado capitão dos reservas do Lens e ele assinou seu primeiro contrato profissional com o clube aos 16 anos.
Mais tarde naquele ano, o Lens terminou em segundo lugar na liga sub-16 da França, e dois anos depois venceu a sub-18. Aurier estava ganhando nome -- embora esse nome fosse Serge o Bisão, apelido que lhe deram por causa da força com que jogava. As autoridades da Costa do Marfim tentaram transformar o Bisão em Elefante, mas Aurier recusou vários convites de seu país natal e parecia ter o coração decidido a representar a França, depois de obter a dupla nacionalidade.
De Lens ele passou para Toulouse e, em 1º de abril de 2012, marcou seu primeiro gol como profissional. Se esse feito foi notável só por motivos acadêmicos, seu segundo gol ainda é lembrado como uma obra de beleza: contra o Saint Etienne na segunda partida da temporada 2012-13, Aurier encontrou uma bola alta com um voleio requintado na borda da área e disparou a bola para o canto superior da rede com a parte externa do pé direito.
Apesar de hoje ser usado como lateral direito, Aurier não perdeu o gosto pelo ataque, nem o olho para gols espetaculares. Ele marcou seis e criou outros seis para o Toulouse na última temporada no Campeonato Francês, tornando-se um dos defensores mais prolíficos da Europa. Não foi surpresa, portanto, quando ele foi escalado para lateral direito no time do campeonato na temporada.
Então, no ano passado, Aurier decidiu finalmente que gostaria de representar a Costa do Marfim, e o treinador Sabri Lamouchi não hesitou em chamá-lo. Seus desempenhos nesta temporada mostraram que está crescendo. A Costa do Marfim há tempo procurava uma alternativa confiável a Emmanuel Eboué, e parece que Aurier poderá se tornar um jogador melhor que o ex-defensor do Arsenal.
Esse clube é um dos grandes da Europa que disputam seu contrato neste verão europeu. Aurier sabe disso, e só deverá aumentar, se possível, o apetite desse guerreiro nato para se apresentar bem no Brasil. Ele pode ter só sete jogos pela seleção em seu nome, mas provavelmente mostrará uma presença impenetrável em uma defesa de pedra de seu país.
No Brasil ele também poderá disparar para o estrelato global, pois o jogador em quem modelou seu jogo é Roberto Carlos. Ele possui um poder explosivo semelhante no avanço, e embora não cobre muitas faltas é uma ameaça formidável nos escanteios, graças a seu timing certeiro e seus saltos poderosos. Uma longa e ilustre carreira parece estar começando para Aurier.
Como joga a Costa do Marfim
Diante do calibre dos jogadores de que dispõe, a Costa do Marfim, como todas as boas equipes, deveria ser capaz de criar um estilo de jogo coeso que use ao máximo seus recursos. Infelizmente, nos grandes torneios na última década, os Elefantes tenderam a parecer amadores. A Copa do Mundo do Brasil poderá ser sua melhor oportunidade de causar boa impressão no cenário global e realizar a ambição que o país alimenta há muito de se tornar o primeiro país africano semifinalista, pelo menos, na Copa do Mundo.
Segundo o ranking da Fifa, a Costa do Marfim foi o melhor time na África nos últimos três anos. Eles receberam um grupo cujo progresso é eminentemente possível, com jogos contra o Japão, a Grécia e a Colômbia, e a equipe está cheia de jogadores que já têm experiência de jogo em duas Copas do Mundo. Seu poder de fogo é enorme. Com Yaya Touré, Didier Drogba, Gervinho, Salomon Kalou e Wilfried Bony, tem cinco jogadores que chegarão ao Brasil depois de excelentes temporadas em que marcaram mais de cem gols ao todo.
Enquanto cada parte do time é rica em experiência, eles são liderados por um treinador, o ex-jogador da França Sabri Lamouchi, que nunca experimentou uma Copa do Mundo como atleta ou como técnico. Desde a Copa das Nações da África em 2013 e durante as eliminatórias, Lamouchi mudou entre duas formações, às vezes usando um 4-4-2, com maior frequência 4-3-3, de modo a aproveitar ao máximo seus muitos atacantes talentosos.
Nessa formação, Gervinho tende a começar pela esquerda, Kalou à direita e Drogba como centroavante, atrás de um meio-campo com Touré, Serey Die, do Basel, e Cheick Tioté, do Newcastle, o homem com a responsabilidade de romper os movimentos do adversário.
O centro da defesa provavelmente terá muita experiência mas mobilidade questionável: Kolo Touré e Didier Zokora. O lateral esquerdo provavelmente será Arthur Boka, como foi na maior parte da última década, enquanto Serge Aurier, o lateral direito do Toulouse fortemente ligado ao Arsenal, parece certo que comece na direita depois de uma temporada em que marcou seis gols para seus clubes e acrescentou o mesmo número de assistências.
Escolher a formação é a parte fácil: Lamouchi sabe que se tiver de convencer os céticos torcedores da Costa do Marfim de que ele é o homem certo para o cargo sua equipe deve jogar com foco e qualidade suficientes para que seus planos funcionem. Se classificar para a segunda fase é o requisito mínimo.
* Este artigo é parte da série "Olhar Estrangeiro", produzida por 32 veículos de mídia dos países que disputam a Copa do Mundo, como UOL, Guardian (Inglaterra) e France Football (França).
Tradutor: Luiz Roberto Mendes Gonçalves