Denúncia ignorada vira 'jogo de empurra' entre polícia e sindicalistas
Do UOL, em São Paulo
A existência de uma denúncia de que um técnico de segurança do trabalho alertou os engenheiros responsáveis pela construção do estádio do Corinthians sobre o risco de acidente antes da queda do guindaste virou um jogo de empurra-empurra entre sindicalistas, empresa e polícia e, até o momento, não ajudou na solução do caso, que causou a morte de dois operários.
Segundo Antônio de Sousa Ramalho, presidente do Sintracon-SP (Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção Civil de São Paulo), a queixa de risco de segurança foi ignorada por um engenheiro de produção que, mesmo sabendo da possibilidade de acidente, ordenou a continuação dos trabalhos. Ramalho é deputado estadual pelo PSDB.
O delegado Luiz Antônio da Cruz, do 65° DP (Artur Alvim), responsável pela investigação, disse que está aguardando o funcionário que fez a denúncia para prestar depoimento. O deputado Ramalho afirmou que não vai levar o técnico em segurança para a delegacia porque a polícia já tem uma lista de todos os funcionários que estavam no canteiro de obras no momento do acidente.
Ramalho da Construção, como é conhecido, disse que foi procurado por um funcionário da obra do Corinthians que lhe contou que o engenheiro da segurança do trabalho fez um relatório sobre os riscos de se usar o guindaste na quarta-feira. O deputado afirma que a denúncia anônima foi encaminhada para a Fenatest (Federação Nacional dos Técnicos de Segurança no Trabalho) para, então, chegar à instituição que preside.
O sindicato que responde pela maior parte dos operários que trabalham na construção do novo estádio corintiano, porém, afirma que não sabia do problema. "Fiquei sabendo por meio do Ramalho dessa denúncia", afirmou o presidente do Presidente do Sintrapav (Sindicato dos Trabalhadores da Indústria da Construção Pesada de São Paulo), Antonio Bekeredjian. "Se aconteceu mesmo, esse funcionário vai ter que provar", completou.
A Odebrecht negou a existência de qualquer relatório que alertasse sobre a possibilidade de acidente.
Até agora, só fofoca
O delegado Cruz disse que ainda não ouviu a informação de que houve um alerta ignorado e se colocou à disposição de qualquer funcionário que tenha detalhes do caso a dar à polícia. "Preciso ouvir pessoas que estavam na obra. Meu trabalho vai se basear nos depoimentos que tomar. O que está fora dos autos, é fofoca. Não dá para levar em consideração."
Como nenhum documento que provasse a denúncia foi divulgado, Ramalho lembrou que o funcionário que fez o alerta deu entrevista à TV Record. Sem aparecer nem ter o nome divulgado e falando com a voz modificada eletronicamente, o técnico em segurança no trabalho diz que o engenheiro de segurança de trabalho da obra não liberou o içamento da peça da cobertura.
"O solo estava abaixando porque [o guindaste] é muito peso", disse o funcionário. "Foi feita uma inspeção e o engenheiro de segurança não liberou o trabalho porque ele viu que o solo estava afundando e não ia aguentar aquela capacidade, aquele peso." O profissional, então, teria levado um relatório para o engenheiro de produção da obra, que liberou os trabalhos. "Ele disse: 'Vou fazer porque tem que fazer e pronto'", disse o homem que se apresentou como técnico de segurança do trabalho.
ÁREA INTERNA DO ITAQUERÃO NÃO FOI AFETADA PELA TRAGÉDIA DE QUARTA
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Se fez bastante estrago na fachada do estádio, a queda do guindaste deixou a área interna praticamente intocada, como mostra a foto acima. Nela, o guindaste tombado aparece no lado esquerdo, de forma quase imperceptível
ITAQUERÃO TINHA INAUGURAÇÃO PREVISTA PARA JANEIRO
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Com um custo estimado de R$ 1 bilhão, o Itaquerão tinha previsão de entrega para dezembro e inauguração para janeiro. O estádio estava com 94% das obras concluídas. O Itaquerão será sede da partida de abertura da Copa do Mundo. O Brasil fará o jogo inicial do torneio, contra adversário não definido. Para ser a abertura do torneio, o Itaquerão teve que aumentar a sua capacidade para 69.160 lugares apenas para a Copa do Mundo.
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