Após pedir carinho, seleção se isola e cria ambiente crítico em Goiânia

Gustavo Franceschini, Luiz Paulo Montes, Paulo Passos e Ricardo Perrone

Do UOL, em Goiânia

  • Flavio Florido/UOL

    Protesto em frente ao hotel da seleção, na última terça, foi o último ato de uma passagem conturbada

    Protesto em frente ao hotel da seleção, na última terça, foi o último ato de uma passagem conturbada

Na chegada da seleção a Goiânia, o governador Marconi Perillo e o presidente da CBF, José Maria Marin, falaram em hospitalidade, apoio e uma relação amistosa que poderia render à cidade até uma nova visita do time antes da Copa do Mundo de 2014. Parecia o cenário ideal para uma equipe vaiada em seus últimos compromissos e que em entrevistas pedia carinho do público. Oito dias depois, o cenário é bem diferente daquele que se planejou. Isolada, criticada por políticos, jornalistas e torcedores, a equipe verde-amarela movimentou a cidade de forma negativa para si e para os aliados da CBF (Confederação Brasileira de Futebol) enquanto preparou-se para a Copa das Confederações.

O pontapé inicial para o problema foi logo no encontro entre Marin e Perillo, na última segunda, quando a dupla inaugurou a recém-reformada Serrinha, sede social do Goiás. Como revelou o UOL Esporte, o Governo do Estado modificou uma lei local para poder destinar R$ 2,5 milhões ao clube pela obra.

O problema é que a CBF praticamente ignorou o esforço. Em seus seis primeiros dias de Goiânia, a seleção só foi à Serrinha uma única vez (nesta quarta, o último trabalho será novamente no local). A decisão da comissão técnica de treinar no CT do Goiás, em um bairro afastado do centro, criou de cara uma pressão por conta do investimento feito.

A cobrança pela ausência de um treino aberto veio logo em seguida. A comissão técnica, que foi contra a preparação em Goiânia, conseguiu vetar um treinamento no estádio Serra Dourada, previsto pelo governo local. Felipão e Parreira não queriam que a atual seleção passasse uma imagem semelhante à do time que fracassou na Copa de 2006, após preparação festiva com muito contato com o público na Suíça.  

Ao ainda barrar torcedores na Serrinha e no CT, a entidade tentou jogar para a polícia a decisão sobre a abertura dos portões. A corporação expôs a contradição e disse que, se fosse solicitada, conseguiria coordenar com segurança um treino aberto. A repetição do tema chegou a irritar a CBF, que tentou tratar com naturalidade o desejo de privacidade da comissão técnica.

Apesar de toda a pressão, a entidade bateu o pé e manteve o time blindado. Vitória de Felipão, mas a posição, obviamente, não foi bem aceita por todos.

A cobertura dos jornais locais sobre a passagem da seleção tratou o isolamento de forma bastante crítica. Policiais que acompanharam a equipe estranharam, entre outras coisas, as mudanças bruscas de planos. Torcedores que fizeram plantão no hotel ou na porta do CT também se queixaram do pouco contato.

"É absurdo o que aconteceu em Goiânia. Paga-se para a seleção estar aqui e o público não tem acesso a nenhum dos jogadores, nem aos reservas. Não custa eles virem dar autógrafos, tirar fotos. Para eles não é nada, para os fãs é algo importante. Depois que são vaiados, reclamam", Márcio Fontes, vendedor de 38 anos que estava na porta do CT do Goiás.

O isolamento deixou a seleção solitária. Segundo o jornal O "Estado de S. Paulo", a CBF pagou cerca de R$ 385 mil para manter seu hotel completamente vazio durante a estada na cidade. Os vereadores de Goiânia passaram a chiar.

"Pelo tamanho do investimento, a colheita foi pequena. O lado positivo é que a cidade apareceu muito na mídia, mas a seleção foi muito fria com o cidadão de Goiânia. Ela não deu a atenção que a cidade merecia", disse o vereador Edson Automóveis (PMN).

Ele é um dos que assinaram requerimento, encabeçado pelo vereador Dr. Gian (PSDB), para que o time nacional fizesse um jogo beneficente com portões abertos no estádio Serra Dourada. A entrada seria um quilo de alimento não perecível. O documento foi enviado para a Federação Goiana que ficou de repassar o pedido para a CBF.

"Essa medida se faz necessária tendo em vista o investimento realizado pelo nosso Estado para dar conforto e estrutura na estadia dos nossos jogadores", diz trecho do requerimento, protocolado na quinta passada.

Os vereadores cogitaram fazer uma homenagem à seleção brasileira, mas desistiram porque acreditaram que a CBF não enviaria representantes. "Acho que eles não teriam interesse em liberar alguém para participar da sessão solene. Sentimos que a seleção está muito blindada num momento em que precisa de carinho. Faltou sensibilidade para a CBF, que deveria ter feito um jogo-treino aqui", afirmou o vereador Zander (PSL).

A gota d'água da confusão aconteceu no fim de tarde da última terça. Em atrito com o governo estadual e cientes da presença da imprensa nacional na cidade, estudantes e sindicalistas fizeram um protesto na porta do hotel da seleção. Pediram investimento na educação e o fim da novela de um reajuste salarial previsto em lei que está atrasado desde maio.

"Quando o governador gasta com seleção e deixa a universidade em condições precárias, ele mostra que só está preocupado com o espetáculo. A presença da seleção é uma contradição na cidade", afirmou Bernardo Cunha, professor da UEG (Universidade Estadual de Goiás) que participou do protesto. 

Apesar de todo o cenário criado, o Governo do Estado faz um balanço positivo da passagem. "O balanço é extremamente positivo para Goiás. O nome do estado está na televisão, na mídia nacional. A avaliação é de um retorno ótimo em todos os sentidos", disse Cardoso Batista, assessor imediato do governador Marconi Perillo.

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