Humoristas de MT fazem piada sobre Copa e criticam "concorrência" das obras
Guilherme Costa
Do UOL, em Cuiabá (MT)
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Divulgação
Nico e Lau são humoristas tradicionais em Cuiabá, uma das sedes da Copa de 2014
A Copa do Mundo é motivo de piada. Por causa de atrasos e erros nas obras, o evento entrou na pauta de humoristas regionais de Cuiabá. Os problemas da cidade só criaram um desafio para eles: vencer a concorrência involuntária das notícias.
"O viaduto da Fernando Correia tinha diferença de altura. Quem descobriu foi um aluno de engenharia da UFMT, que tirou foto e mandou. Um pilar era mais baixo que o outro, e o viaduto ficava penso. O pessoal está querendo tomar meu trabalho", disse Romeu Benedicto, o Totó Bodega.
Criado há 13 anos, Bodega é baseado em Dito Baixo, tipo com quem Benedicto conviveu na infância. O personagem surgiu para uma peça, mas ganhou corpo e se transformou em referência no humor cuiabano.
"O Totó Bodega é um trabalhador informal, vítima do êxodo rural, que veio para Cuiabá em busca de algo melhor e vive de bicos. Ele se intitula especialista: conserta rádio, arruma televisão, apara pelo de cachorro… faz de tudo", contou Benedicto. Ator desde a época em que estava em idade escolar, o criador do personagem chegou a obter graduação em educação física e direito antes de definir o humor como meio de vida.
Antes da Copa do Mundo, Totó Bodega foi convidado pelo Ministério do Esporte para gravar um vídeo institucional sobre Cuiabá. A peça é focada na hospitalidade do povo local e nos principais pontos turísticos da cidade. "O Totó Bodega é um personagem alegre, irreverente, carismático, e isso reflete a personalidade do cuiabano, que é uma pessoa simples, que gosta de receber convidados e gosta de festa", ponderou Benedicto.
Por ser institucional, o vídeo não pôde fazer graça com as mazelas de Cuiabá. Por isso, Benedicto prepara uma série de vídeos para a internet. As peças serão focadas na Copa e nos erros da preparação.
"O Totó vai ser um especialista e vai dar dicas para os turistas. Ele vai ter um 'achados e perdidos', por exemplo. Totó vai achar dentadura, prótese de perna e uma caixinha com vergonha na cara. Quem será que perdeu a vergonha na cara? Quem vai procurar a vergonha na cara? Vou jogar isso para o público", explicou o humorista.
Se depender de Benedicto, uma dica que Totó pode dar é não ir ao estádio durante a Copa: "Não estou disposto a pagar R$ 240 ou R$ 300 num jogo aqui, não. Esse preço também é uma piada. São quatro jogos. Nós estamos pagando tudo isso por quatro jogos. Ô joguinho caro".
Outra dica que o "especialista" Totó pode dar é que nem todas as obras feitas para a Copa vão resolver a vida dos cuiabanos. "Tem muito erro nessas coisas. É só andar que você vê. Aquela parte do aeroporto, se chover vira um rio. Acho que eles têm um VLT submarino", finalizou o humorista.
O último espetáculo da dupla "Nico e Lau" tem uma esquete que brinca com erro similar. Um dos personagens fala sobre uma ponte construída em Cuiabá para a Copa do Mundo, e o outro interrompe para dizer que é um viaduto. "Então espera chover para você ver o tanto de água que fica ali embaixo", responde o primeiro.
Nico e Lau foram criados em 1995 pelos atores Lioniê Vitório e J. Astrevo. Egressos do teatro, eles montaram um texto de "causos" para falar sobre o aniversário de Cuiabá em um programa de TV.
A participação da dupla foi um sucesso. Os atores voltaram três vezes para contar histórias, e então decidiram desenvolver esse formato. Nico e Lau surgiram depois do conteúdo, e já nasceram com um programa semanal na TV local.
Da TV, a dupla voltou ao teatro. Os personagens também deram margem a um mix de produtos temáticos – CD, DVD, livro, revista em quadrinhos e bonés, por exemplo. Nico e Lau atualmente apresentam programetes que misturam humor e serviços nos intervalos da afiliada da Globo em Cuiabá.
A dupla fará esquetes na TV para dar boas-vindas a turistas estrangeiros. Assim como aconteceu com o vídeo de Totó Bodega para o Ministério do Esporte, as peças têm um tom menos crítico.
Os dois prometem, porém, que isso não se repetirá na Fifa Fan Fest. Nico e Lau estão na programação desta quinta-feira, abertura do aparato em Cuiabá, e farão outras três apresentações no espaço.
"Vamos focar na questão cultural de Cuiabá. Imaginamos que haverá muitos turistas por lá. Então, vamos mostrar música, linguajar e dança e vamos marcar presença nesse sentido. Agora, algumas piadas vão tocar num assunto ou outro. De alguma maneira vão", ponderou J. Astrevo, que interpreta o Lau.
Nico e Lau também são inspirados em conhecidos dos atores. O primeiro representa a população ribeirinha, e o segundo faz um tipo cuiabano. Muito do humor aparece no choque entre as duas culturas.
O último show da dupla, chamado "Mingana que eu gosto", foi dividido em três partes. A primeira fala sobre um relacionamento amoroso de Nico, e a segunda é sobre o programa "Mais médicos", criado pelo governo federal. O terceiro trecho é exclusivamente focado na Copa.
"É um quadro que discute todos os temas, centralizando na questão das obras, da derrubada do Verdão e à construção da arena. Trabalhamos com essa coisa do 'será que vai ficar pronto?'. Aí o Lau diz que 'está quase. Falta quase tudo'", contou Lau. "É mais ou menos o que a sociedade perguntava. A gente resumiu isso", completou Lioniê Vitório, o Nico.
Os dois reforçam o tom crítico às obras da Copa do Mundo em Cuiabá: "A piada já está pronta. Na verdade, é isso mesmo", afirmou Lau.
No show, os pontos negativos da capital mato-grossense precedem uma apresentação de rasqueado, música típica da região. "Nesse aspecto, a Copa vai acontecer muito tranquilamente. O cuiabano é um povo festeiro, pacífico até demais, que gosta muito de futebol", avaliou Lau. "O mato-grossense sabe receber muito bem", completou Nico.
Com os atrasos e problemas nas obras para a Copa, o mato-grossense só tem encontrado dificuldade para fazer piada.