Pernambuco paga R$ 14 milhões extras por estádio para recuperar atraso que autorizou
Vinícius Segalla
Em Sâo Paulo
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Divulgação/Portal da Copa
A Arena Pernambuco terá mais 2.000 trabalhadores em seu canteiro até novembro deste ano
Em janeiro de 2010, quando o governo de Pernambuco assinou a Matriz de Responsabilidades da Copa do Mundo de 2014, comprometeu-se a entregar a Arena Pernambuco, estádio que será utilizado no Mundial, em dezembro de 2012.
Já na última sexta-feira, assumindo que a obra, do jeito que está indo, não ficará pronta antes de julho de 2013, o secretário estadual da Copa, Ricardo Leitão, anunciou que vai haver a contratação de mais 2.000 funcionários, para que o estádio seja entregue em fevereiro de 2013, a tempo de ser utilizado na Copa das Confederações, em junho do mesmo ano.
A CAMPEÃ EM GREVES
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A empreiteira Odebrecht, que está construindo quatro dos 12 estádios da Copa, é a campeã de reclamações. Suas obras já pararam por 45 dias, no Maracanã, na Arena Pernambuco e na Arena Fonte Nova. LEIA MAIS
O secretário só não informou o custo extra pelo atraso. Nem ele, nem ninguém. Um fato, porém, é inconteste: quem vai pagar é o povo de Pernambuco. É o que admite o secretário executivo de relações institucionais de Pernambuco, Gilberto Pimentel. Segundo ele, o custo extra será incluído no cálculo da contraprestação que o governo pagará à empreiteira Odebrecht por, no mínimo, 30 anos após a conclusão da obra.
Atualmente, este valor tem um teto de R$ 3,99 milhões por ano. Pelo contrato entre Governo de Pernambuco e empreiteira, o Estado vai pagar R$ 389 milhões à Odebrecht assim que a obra acabar (e não R$ 382 milhões, conforme estava escrito, até a publicação desta reportagem, na página oficial da empresa). Depois, seriam mais R$ 119 milhões ao longo dos 30 anos. Agora, será mais. Quanto mais? "Isso ainda está estudo, terão que ser feitos cálculos", diz o secretário.
Mas o governo não imagina sequer uma ordem de grandeza deste valor? "Ah, sim, mas seria leviano eu revelar isso agora", completa Pimentel, como se leviano não fosse anunciar um plano de aceleração de uma obra que está atrasada sem dizer quanto isso vai custar ao contribuinte.
É possível estimar este custo, porém. São 2.000 novos trabalhadores a se somar até o fim de novembro aos 3.000 já existentes. O menor salário pago pela Odebrecht aos operários da obra é de R$ 876. Segundo o engenheiro Márcio Soares da Costa, fundador do Instituto de Auditoria de Engenharia do Ceará, em média, os encargos trabalhistas pagos por empresas de construção civil correspondem a 100% do valor do salário. Assim, cada novo funcionário da Arena Pernambuco deverá custar cerca de R$ 1.752 por mês.
De novembro deste ano a fevereiro de 2013, nova promessa de data de entrega da obra, são quatro meses. Ou seja, os 2.000 operários gerarão um gasto extra de R$ 14 milhões, isso sem considerar as contratações escalonadas que serão feitas até novembro, em um ritmo não informado pela Odebrecht nem pelo Estado de Pernambuco.
E por que a obra está atrasada? Para começar, o contrato entre governo e empreiteira para a execução da obra, assinado em 15 de junho de 2010, já prevê que a construtora tem que entregar o estádio em até três anos após esta data. Ou seja, cinco meses após assinar a Matriz de Responsabilidades da Copa, Pernambuco já desistia de fazer valer a sua assinatura. A Odebrecht, por sua vez, ficou apenas com a obrigação contratual de entregar o equipamento até o início do segundo semestre de 2013
ENQUANTO ISSO, PARA ALDO REBELO...
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O ministro do Esporte, Aldo Rebelo, e o governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), asseguraram, no mês passado, que as obras da Arena Pernambuco estão no prazo e que o Estado tem condições de sediar a Copa das Confederações. LEIA MAIS
Mas, qualquer forma, a própria empreiteira estipulou o prazo de abril de 2013 para entregar a arena, para que a arena pudesse ser utilizada na Copa das Confederações, propondo-se, atrás deste objetivo, a trabalhar mais rápido do que exigia o contrato. E por que atrasou em relação a esta data, perguntou o UOL Esporte à Odebrecht. A assessoria de imprensa da Odebrecht, a quem a reportagem solicitou uma entrevista com algum executivo da empreiteira, negou o pedido, afirmando que a construtora não iria responder, e que a pergunta deveria ser feita ao governo de Pernambuco, que, por sua vez, também não respondeu.
Um dos motivos pode muito bem ter sido as quatro greves por que já passou a obra, conforme admite Marcos Lessa, presidente da empresa montada pela Odebrecht para tocar a empreitada. "A greve afeta bastante o cronograma. Nós temos um prazo apertadíssimo. Isso realmente pode prejudicar o andamento para a Copa das Confederações", disse o executivo, em janeiro deste ano, quando a obra passava por sua última paralização.
Na greve anterior, no início de novembro do ano passado, o motivo fora a forma como a Odebrecht lidou com as reivindicações dos trabalhadores. A empreiteira demitiu dois funcionários da arena que eram membros da Cipa (Comissão Interna de Prevenção de Acidentes) porque eles teriam incitado os trabalhadores a fazer greve. A demissão dos operários, junto com denúncias de assédio moral supostamente praticados pelo responsável pela segurança do canteiro, levou os funcionários a decretar greve.
À época, a empresa explicou ao UOL Esporte: "Os dois empregados membros da Cipa foram demitidos por justa causa, por cometimento de flagrante ato de indisciplina, quando, no último dia 31 de outubro, instigaram os colegas a paralisarem a obra da Arena da Copa, sem nenhuma razão plausível".
A demissão por justa causa seria a única via possível para a demissão, já que membros da Cipa gozam de estabilidade no emprego. Mas, para Ana Amélia Mascarenhas Camargos, professora de Direito do Trabalho da PUC-SP e sócia do Mascarenhas Camargos Advogados, as demissões, da forma como foram descritas pela empreiteira, foram ilegais. "A Lei de Greve (Lei nº 7889 de 1989) garante, em seu artigo 6º, o direito ao grevista de empregar meios pacíficos para convencer seus colegas a aderir à greve", explica a professora. A Odebrecht já desligou 303 operários da obra do estádio pernambucano desde novembro do ano passado.
Na última segunda-feira, o UOL Esporte perguntou à Odebrecht se haveria aditivo no contrato da obra para aumentar o valor devido pelo Estado à construtora em virtude das novas contratações, necessárias também em virtude dos atrasos gerados pelas greves de seus trabalhadores. A reportagem foi informada que, por tratar-se de uma PPP (parceria público-privada), o contrato não poderia ser aditado no valor a ser pago à empreiteira.
Obras da Copa
Informação, no mínimo, imprecisa, a julgar pelo que revelou o secretário Gilmar Pimentel e pelos dois aditivos por que já passou o contrato. O primeiro deles, de 21 de dezembro de 2010, permite, inclusive, que o valor de R$ 3,99 milhões da contraprestação que receberá a empreiteira por 30 anos possa ser recalculado para cima.
É que o governo de Pernambuco, quando assinou o documento, comprometeu-se a garantir que os três principais clubes de Recife (Santa Cruz, Náutico e Sport) jogariam suas 60 principais partidas por ano na Arena Pernambuco, pagando aluguel à empreiteira. Ocorre que os três times possuem estádios próprios, e, até agora, só o Náutico se dispôs a mandar seus jogos na nova arena.
Então, o governo, como tem que cumprir o que assinou com a Odebrecht, ao contrário do que ocorre com a Matriz de Responsabilidades, foi obrigado a admitir, em aditivo contratual: "O Estado de Pernambuco reconhece a existência de risco razoável de os três principais clubes de futebol pernambucanos não formalizarem, de imediato, o comprimisso firme de utilizarem a Arena Pernambuco em suas 60 melhores partidas por ano, frustrando a condição de eficácia prevista na cláusula 71.1, item II, do contrato".
Assim, caso o lucro da Odebrecht não seja o esperado nas próximas três décadas, quem vai pagar a conta é o povo pernambucano.
GOVERNO ADMITE INCAPACIDADE, PERNAMBUCANO PAGA A CONTA
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Parte do aditivo contratutal da Arena Pernambuco em que o Governo do Estado admite que não conseguirá honrar compromissos assumidos