Existe um lugar em que a aflição sobre a campanha da seleção vale menos do que o pensamento sobre a transcendência do existir. Famoso destino místico no interior de Minas Gerais, São Tomé das Letras abriga de bruxas a hippies, de ufólogos a curandeiros, gente mais interessada em sua própria viagem existencialista do que propriamente contagiada pelas emoções da Copa da Fifa.  

Não importa o nicho de pensamento, hippies e místicos das mais variadas vertentes convivem em harmonia, cada um em seu devido espaço. Todos eles consideram a cidade no interior de Minas Gerais especial de alguma forma. E, no período em que o país está arrebatado emocionalmente pela Copa do Mundo, o pequeno paraíso de natureza está pouco interessado nas jogadas mirabolantes de Messi, Neymar e companhia.

"Eles estão vidrados em Copa do Mundo. É uma parada do dinheiro mesmo", diz Rodrigo da Silva, músico e artesão, que trocou São Paulo por uma vida 100% hippie em São Tomé há quatro anos.  Através do reggae o paulista diz que deseja espalhar por aí sua filosofia da "nova consciência", calcada principalmente na importância da vida em meio à natureza.  

Outros hippies locais também vêm a Copa com distância. "No nosso caso, não temos visto a Copa porque não temos energia elétrica em casa", relata Eduardo Carmona, que deixou São Bernardo do Campo com a família também à procura da vida hippie em São Tomé.

"Não sei se isso é real, se é uma fantasia, um grande teatro. Até pelo que aconteceu em 1998 com a seleção (...) não torço pelos interesses da Fifa. É tudo uma grande babilônia. Eu queria ser um pequenino machado para derrubar essa grande raíz", emenda, sobre seu sentimento a respeito do Mundial.

Uma das áreas mais interessantes de São Tomé pertence à pousada Cidade das Estrelas. Repleta de referências de bruxaria como caldeirão e estrela de cinco pontas no chão, o local recebe eventos do gênero ocasionalmente, com visitantes de todo o país. A proprietária é a psicóloga paulista Zelinda Orlandi Hypolito, que diz enxergar uma energia poderosa emanada das torcidas da Copa.

No entanto, dali de seu pequeno paraíso nas montanhas de São Tomé, Zelinda fala apaixonada sobre a capacidade de regeneração de espírito que sua propriedade oferece, principalmente para quem deseja "esquecer do mundo" por um tempo. Apesar de não se definir como uma bruxa, a paulista estuda com afinco a vertente mística e acredita no poder da terra da cidade mineira.  

"Tem uma coisa pitoresca. Pode ter certeza, só entra aqui quem a cidade quer. Está cheio de caso de gente que tem problemas no carro vindo para cá, ou acontece alguma outra coisa e não consegue chegar", afirma Zelinda, que diz ter vivido uma experiência transcendente em São Tomé no passado, com a visão de uma luz poderosa acima de uma montanha.

"Foi uma experiência incrível, testemunhada por um grupo de 13 pessoas. Aquilo mudou a vida de todo mundo. E não tinha nenhum doidão ou drogado. Pelo contrário, todo mundo careta. Tinha até um diretor de um banco suíço, gente séria", relata.

São Tomé foi edificada na borda de uma costa da serra da Mantiqueira. O local mais alto, conhecido como Cruzeiro, tem quase 1.500 metros de altitude. A cidade está situada sobre uma grande oferta de pedra quartzito. Por isso, apesar da conhecida vocação mística e do turismo ligado a ela, economicamente o munícipio tem a mineração como a principal atividade.

Também da natureza vem uma lenda a respeito da cidade. Há quem diga que uma das grutas de São Tomé guarda uma passagem subterrânea para Machu Picchu, famoso destino místico no Peru. Do campo dos fenômenos, o local também coleciona relatos de atividade ufológica. Assim, com tanto inspiração sobre a existência, sobre pouca cabeça para a bola da Fifa rolando.