De olho no cofre

Todo mundo tem algo a perder se Curitiba sair da Copa. Saiba por quê

Tiago Dantas

Do UOL, em São Paulo

Todo mundo tem um pouco a perder com a eliminação de Curitiba da Copa do Mundo. Se o andamento das obras na Arena da Baixada não for considerado satisfatório pela Fifa durante a vistoria marcada para a manhã desta terça-feira, 18, consequências devem aparecer na política, na economia e na vida de milhares de turistas.

A Fifa terá que reorganizar a tabela e lidar com torcedores descontentes com mudanças de passagens de avião e reservas de hotéis, por exemplo. O governo federal terá que lidar com uma crise na imagem do país no exterior bem no ano em que a presidente Dilma Rousseff (PT) tentará a reeleição.

Em Curitiba, donos de bares, restaurantes e comércio estimam que podem perder até R$ 400 milhões sem o Mundial. Isso sem contar que os voos e a hospedagem de até 508 mil pessoas terão que ser remanejados para outras cidades, o que, em um efeito cascata, interfere em praticamente todas as sedes.

Como se não bastasse, até a atual campeã mundial Espanha pode ser prejudicada. A seleção escolheu o CT do Caju, do Atlético-PR, para ser sua casa durante a primeira fase. Como disputa partidas em Curitiba, Rio de Janeiro e Salvador, o maior deslocamento do time seria para a Bahia.

A resposta para o destino de Curitiba começa a ser dada às 11h desta terça, quando o consultor especial da FIFA para estádios, Charles Botta, é esperado para uma vistoria técnica na Arena da Baixada. Botta já sabe o que deve encontrar, pois tem recebido relatórios constantes sobre o andamento da obra.

O governo do Paraná está confiante de que vai conseguir manter o Mundial no município. Segundo o coordenador-geral de Copa no Paraná, Mario Celso Cunha, a expectativa é que a Arena da Baixada fique pronta em abril, a exemplo do que deve acontecer com o Itaquerão, em São Paulo.

O secretário-geral da entidade, Jérôme Valcke, que deu um ultimato à cidade em 21 de janeiro, deve anunciar se Curitiba fica ou não na Copa do Mundo na tarde desta terça. O UOL Esporte ouviu políticos, advogados e técnicos ligados à organização da Copa do Mundo para listar 10 pontos que podem influenciar a decisão da Fifa.

1 – Exigências da Fifa foram cumpridas

Os responsáveis pela Copa em Curitiba pretendem convencer a Fifa de que a obra da Arena da Baixada avançou em uma velocidade mais alta do que a esperada pela entidade. Ao deixar a cidade, em 21 de janeiro, Jérôme Valcke disse a interlocutores que pretendia ver melhorias em gramado, assentos, vestiários, cobertura e iluminação.

O gramado foi plantado dez dias depois. Até esta segunda-feira, 15 mil assentos haviam sido instalados (35% do total de 43 mil lugares). Os vestiários estão em fase de acabamento, segundo pessoas ligadas a obra. A cobertura foi concluída, e a iluminação começará a ser instalada até o fim da semana.

"O Valcke foi claro: não queria ver o estádio pronto, mas com avanços significativos", afirmou o coordenador-geral de Copa no Paraná, Mario Celso Cunha. Segundo ele, trabalham atualmente na obra 1.250 operários. O número deve subir a 1.500 em março. "Fizemos o trabalho de dois meses em 15 dias."

2 – Dinheiro para terminar obra está quase garantido

Quando foi anunciada, a reforma da Arena da Baixada custaria R$ 185 milhões. O valor atual é 81% maior que o original: R$ 330 milhões, segundo a última previsão divulgada pelo Atlético-PR. Para fechar a conta, ainda faltam R$ 65 milhões.

O dinheiro que o clube tem em conta paga os trabalhos no estádio até o Carnaval. Depois disso, o Atlético-PR conta com um financiamento que o governo do Estado está pleiteando junto ao BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).

O Estado pediu R$ 250 milhões ao BNDES por meio de uma linha de empréstimo que financia obras públicas. O pedido está sendo analisado, e não há previsão de quando o dinheiro será liberado, embora haja uma pressão política forte para que isso aconteça logo.

Se a liberação demorar, o Estado pode fazer um empréstimo-ponte, ou seja, envia recursos próprios para o Atlético-PR e os cobre com o dinheiro que vier do BNDES, segundo políticos paranaenses ouvidos pelo UOL Esporte. A tática já foi usada duas vezes durante a obra para acelerar a liberação de dinheiro.

3 – Governo federal não quer passar recibo de incompetência

Desde que oficializou a candidatura à Copa do Mundo, em 2007, o governo federal aposta que o evento é uma oportunidade de melhorar a imagem do Brasil no exterior e mostrar ao mundo que o Brasil é capaz de cumprir compromissos.

Em 3 dezembro de 2010, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse, em uma coletiva a correspondentes internacionais: "Vamos fazer uma Copa do Mundo exemplar. Espero que muita gente venha ao Brasil ver do que somos capazes."

Para a presidente Dilma Rousseff seria uma derrota política começar um ano eleitoral ouvindo da Fifa que uma das 12 cidades-sedes será eliminada da Copa do Mundo porque não cumpriu o cronograma de obras.

"Seria um atestado de falta de competência na gestão das obras. Por mais que o estádio seja privado, o governo se comprometeu a acompanhar a sua execução e está financiando a obra", disse um senador ouvido pelo UOL Esporte.

4 – Ex-ministra é candidata ao governo do Paraná

  • Pedro Ladeira/Folhapress

Quando ainda era ministra-chefe da Casa Civil, no início de fevereiro, a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) teria ajudado a costurar a aprovação do financiamento de R$ 250 milhões que o governo do Paraná fez ao BNDES. A informação foi divulgada nesta segunda, 17, pelo blog do Menon.

Gleisi deixou o cargo mais importante do ministério da presidente Dilma Rousseff para se candidatar ao cargo de governadora do Paraná, fazendo oposição ao atual governador Beto Richa (PSDB), que deverá tentar a reeleição.

A "ajuda" na liberação do dinheiro que pode garantir Curitiba na Copa se tornaria um importante trunfo eleitoral, segundo políticos paranaenses.

5 – Investimento de R$ 880 milhões não teriam retorno rápido

O investimento feito pelo poder público e pela iniciativa privada em Curitiba com obras relacionadas à Copa do Mundo chega a R$ 882 milhões, segundo o Portal da Transparência.

Por mais que a maior parte deste montante seja destinada a obras de infraestrutura e mobilidade, o chamado legado, os governos não conseguiriam ter um retorno rápido desse gasto se Curitiba sair da Copa, já que a economia não seria movimentada com o turismo.

6 – Bares e comércio calculam ganhar R$ 400 milhões com Copa

A movimentação de turistas em Curitiba para assistir aos quatro jogos da Copa do Mundo que devem acontecer na cidade devem injetar quase R$ 400 milhões nos setores da economia ligados a serviços.

A Abrasel (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes) calcula que os torcedores devem gastar cerca de R$ 240 milhões. Já a ACP (Associação Comercial do Paraná) estima que a eliminação da cidade pode tirar de circulação R$ 150 milhões.

7 – Malha aérea do país inteiro teria que ser remodelada

Em 16 de janeiro, a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) aprovou a mudança da malha aérea do Brasil para o período da Copa do Mundo, alterando 42% dos voos para reforçar destinos onde ocorrerão jogos.

Embora Curitiba não seja um dos destinos com mais voos, a retirada da cidade da Copa do Mundo implicaria em modificar boa parte da malha aérea do país, uma vez que os jogos seriam espalhados por outras sedes.

8 – Remanejamento de hotéis será difícil

Ao tirar Curitiba da Copa do Mundo, a Fifa não precisa se preocupar apenas em trocar o lugar onde serão realizados quatro jogos da primeira fase do torneio. A logística de 508 mil pessoas precisa ser recalculada. Esse é o número de turistas esperados pela cidade, segundo pesquisa da FGV (Fundação Getúlio Vargas) utilizada pelo Ministério do Turismo.

Dependendo do destino dos quatro jogos da Arena da Baixada, haverá dificuldade de alocar os torcedores nos hotéis de outras sedes. Em 2010, a Fifa reservou 13 mil apartamentos de hotéis curitibanos por meio da agência Match para os chamados pacotes de hospitalidade, comercializados para empresas, imprensa e patrocinadores.

9 – Fifa poderia se tonar alvo de centenas de processos

Caso a Fifa decida mesmo tirar a Arena da Baixada do Mundial, pode ter que responder a inúmeros processos dos torcedores que compraram ingressos para ver jogos em Curitiba, mas terão que ir a outras cidades, segundo advogados ouvidos pelo UOL Esporte.

Se o processo de venda de ingressos já estivesse concluído, cerca de 160 mil ingressos teriam que ser renegociados.

10 – Blatter teria que admitir fracasso

  • Thomas Hodel/Reuters

O presidente da Fifa, Joseph Blatter, não poupa puxões de orelha ao governo brasileiro. Em janeiro, chegou a declarar que as obras da Copa de 2014 são as mais atrasadas da história. Com relação à Arena da Baixada, porém, o dirigente deu duas amostras recentes de que confia na permanência de Curitiba como sede.

Em entrevista à Folha de S.Paulo, em 13 de fevereiro, Blatter disse que "não há preocupações. O Ministro do Esporte, Aldo Rebelo, garantiu que o estádio em Curitiba estará pronto a tempo."

Dez dias antes, em sua coluna na revista The Fifa Weekly, o suíço afirmou que está tranquilo sobre o cumprimento dos prazos e que, na prática, houve atrasos na "preparação de todas as Copas do Mundo e Jogos Olímpicos."

"Estamos falando de uma questão fundamental e sobre confiança: se nós dizemos que vamos jogar em 12 estádios, devemos jogar em 12 estádios. Qualquer outra coisa seria admissão de fracasso - para o Brasil, mas também para a Fifa", escreveu Blatter.

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