Como um bilionário curte a Copa do Mundo?

Ricardo Geromel

Do UOL, no Rio de Janeiro

  • Arte UOL

    Saiba como um torcedor com muito dinheiro acompanha a Copa do Mundo

    Saiba como um torcedor com muito dinheiro acompanha a Copa do Mundo

De acordo com a última lista da revista Forbes, há 1.645 bilionários (em dólares) ao redor do planeta. Na cotação de hoje é preciso de mais de R$ 2,2 bilhões para entrar na seleta lista. Ao redor do planeta, mais de 50 bilionários são donos de equipes de futebol – o último a comprar um time foi Jackie Ma, o homem mais rico da China, que comprou 50% do Guanzhou Evergrande, time que pagou uma fortuna por Conca, agora no Fluminense, e onde atua Elkeson, ex-Botafogo. Estudo da consultoria BCG revela que no Brasil há mais de 70 mil milionários, mas na lista da Forbes constam apenas 66 bilionários brasileiros e nenhum é dono de um clube de futebol profissional. Flávio Augusto, que enriqueceu com a venda da escola de idiomas WiseUp, (ainda) não é bilionário em dólares, mas já é dono de um time de futebol nos Estados Unidos, o Orlando City, que fechou a compra do ex-melhor do mundo Kaká.

Se dinheiro não fosse um problema, como você curtiria a Copa do Mundo? Eu conversei com o herdeiro de um destes 66 bilionários que resolveu rodar o Brasil e assistir um jogo por dia. Ele - que não será identificado - assistirá apenas a jogos de grandes seleções. Portanto, não visitará Cuiabá, onde não há grandes jogos e a demanda por ingressos na capital mato-grossense era tão baixa que a Fan Fest local fez até concurso de caretas para distribuir bilhetes.

Dizem que dinheiro não compra felicidade, mas com certeza compra ingressos VIP de jogos da Copa do Mundo, também chamados de hospitality, que incluem poltronas privilegiadas para ver os craques confortavelmente, sentado ao lado de celebridades mundiais – algumas que te distraem do que acontece nas quatro linhas – e também proporcionam comes e bebes antes, durante e depois dos jogos. No jogo Argentina x Irã, o herdeiro sentou-se muito perto de Maradona e revelou: "Eu estava olhando para o Maradona e pensando em como ia tirar um sarro dele quando o estádio inteiro gritou. Messi havia marcado no finalzinho. Droga! Irã merecia ter ganhado e eu nem vi o gol do anão."

A Copa do Mundo é uma overdose de futebol com 64 partidas em 25 dias que começa no dia 12 de junho em São Paulo e termina com a grande final no dia 13 de julho, no Maracanã. Neste período, a bola não rolará em apenas 7 dias. O esperma sortudo – como eu me refiro a bilionários que herdaram sua fortuna – percorrerá mais de 20 mil quilômetros para assistir a 20 jogos ao vivo.

Quando ele me contou seu itinerário, eu logo desconfiei que o sucessor percorreria distância maior do que Phileas Fogg, protagonista do célebre romance "Volta ao Mundo em 80 Dias", de Jules Verne. Sem contar os trajetos aeroporto-hotel-estádio-hotel-aeroporto e as visitas aos melhores restaurantes de cada cidade e apenas calculando as distâncias dentro do avião, o bilionário vai viajar por ar o equivalente a meia volta ao mundo.

Alguns amigos jornalistas também estão percorrendo o Brasil e chegam a cobrir quase um jogo por dia. Contudo, estes jornalistas esportivos dormem menos de 5 horas por noite, voam de classe econômica, não escolhem suas companhias, não ficam hospedados nos melhores hotéis e nem comem em restaurantes badalados. Além disso, ainda trabalham constantemente, elaborando e entregando matérias quase na velocidade da luz.

O estilo de viagem do bilionário, como você pode imaginar, é um pouco diferente dos jornalistas, ele mesmo afirma: "Sou um sortudo, sou um bon vivant." Mas se recusa a contar em quais hotéis se hospeda e onde e o que come.

De qualquer forma, é um herdeiro estilo de vida "simples". Apesar de ser amigo dos donos de uma das mais importantes companhias aéreas ele usa voos comerciais e não aviões privados. Ele não dirige Ferrari nem Porsche, nem nenhum carro deste estilo, mas seus veículos são blindados.

Ele já morou em diversos países e viajou ao redor do mundo, sempre que possível preferindo se hospedar na casa de amigos. Durante esta Copa, já tinha reserva feita, e paga, em alguns hotéis 5 estrelas, mas acabou passando a noite na casa de amigos.

Sempre tem ingressos VIP extras para os melhores jogos da Copa. Mas nunca usa os ingressos como moeda de troca. Ele prefere convidar amigos e familiares ao invés de "business contacts."

Não toma álcool e nem se importa com roupas de grife. Se veste no estilo "californiano" - o mais importante é o conforto e não a ostentação. Ele é completamente avesso ao culto às celebridades.

Fluente em diversas línguas, apaixonado por tecnologia, dorme tarde, acorda tarde e é raro vê-lo  de mau humor. Mesmo tendo a personalidade extremamente calma, ultimamente tem perdido a paciência com as pisadas de bola do Fred.

Aprecia a alta culinária, mas nos mais balados restaurantes não se identifica com seu sobrenome e prefere ficar com a sua turma.

Enquanto saía da churrascaria Porcão, no Rio de Janeiro, em direção ao Maracanã para assistir ao Chile decretar o fim da "era de ouro" da Espanha, os últimos campeões mundiais, ele revelou: "Isso é sobre meu amor ao futebol. Não sobre meu lifestyle."

A jornada do herdeiro começou na abertura em São Paulo, onde ele assistiu a pessoas fantasiadas de árvore e ficou com saudades das Olimpíadas de Pequim, que ele havia presenciado seis anos atrás. O jovem de menos de 30 anos que prefere manter o anonimato revelou: "Fiquei deprimido. Achei que era o prelúdio de que a Copa seria de baixa qualidade técnica. Mas o Neymar marcou dois gols, e meu astral melhorou rapidinho."

Vinte e quatro horas depois de ver o juiz japonês presentear o Brasil na Arena Corinthians, o jovem dos bolsos profundos viajou 1450 km até Salvador para ver Van Persie e Robben destruírem a Espanha. Ele não bebe, mas acordou com a cabeça doendo de tanto que vaiou Diego Costa. "Ele seria titular no Brasil, mas preferiu jogar pela Espanha. Péssima escolha!"

Voou 980 km até Belo Horizonte, onde se misturou com as massas na invasão de colombianos na capital mineira. Antes do jogo conversou com colombianos que lamentavam a ausência do seu craque-mor Falcão. Depois, fez farra com hermanos graças à vitória folgada sobre a Grécia. Na segunda-feira, voltou ao seu estádio favorito, a Fonte Nova, em Salvador, para ver o massacre da poderosa Alemanha contra Portugal de Cristiano Ronaldo.

Não conheço ninguém que seja indiferente a CR7, todos têm uma opinião sobre o tão amado quanto odiado metrossexual. O bilionário revelou a sua: "admiro sua ambição, mas acho que o Messi é muito superior como jogador. CR7 é uma marca e sabe lucrar com sua imagem enquanto o Messi parece não ter habilidades sociais. Mas quando a bola rola, eu aposto sempre no anão argentino."

Depois de ver Pepe receber o segundo cartão vermelho mais rápido da história das copas, voou mais 1020 km até Fortaleza para se decepcionar com o jogo Brasil x México, "de longe, o pior jogo da copa que eu assisti. Apesar da torcida do México e do seu goleiro terem feito bonito. Se o Neymar se contundir, não sei o que será do Brasil."

Depois de mais de 1h30 no avião, ele já havia retornado para a ex-capital do Brasil para comemorar o final oficial da era de dominação hispânica após a contundente vitória da equipe de Alexis Sanchez, em um Maracanã lotado de chilenos. Festejou gritando "Chi Chi Chi, Le Le Le!" e vaiando Diego Costa novamente.

No dia seguinte, acordou atrasado e quase perdeu o voo.  No longo trajeto até o Itaquerão pensava em como tudo é passageiro – ele estava na África do Sul quando a Espanha foi campeã com gol de Iniesta e acompanhou jogos da Eurocopa que os Espanhóis faturaram dois anos atrás.

"Tudo acaba", disse o herdeiro, e eu fiquei pensando que se ele precisar de ajuda para acabar com a grana herdada, ele pode contar comigo. Naquela tarde de clima inglês, com tempo fechado e frio, ele viu o uruguaio Luis Suárez marcar dois gols na vitória sobre a Inglaterra. Depois do jogo, curtiu o camarote com uruguaios esperançosos e ingleses bêbados.

Perguntado sobre quem é seu favorito para ganhar a Copa ele afirma: "Torço para o Brasil e creio que essa taça não sairá da América Latrina (SIC) antes de 2018. A invasão de latinos nos estádios em todas as cidades que estive é, no mínimo, impressionante. Se torcida ganhasse jogo, seria impossível essa Copa não ser ganha por um time latino."

Resumindo os 7 primeiros dias de Copa: ele assistiu de camarote os dois gols de Neymar, o golaço de peixinho de Van Persie, o colombiano Armero dançando, o massacre alemão sobre a equipe de Cristiano Ronaldo, o vexame do Brasil contra o México e a eliminação da Espanha no Maracanã lotado, e os dois gols de Suárez contra a apática equipe inglesa.

Pense nos melhores momentos da Copa até aqui: o sufoco perante o Chile, que terminou com final feliz, UFA! A vergonha passada tantos pelos últimos campeões mundiais quanto por Cristiano Ronaldo, o coadjuvante mais badalado do planeta. Os gols genais de Messi e do furacão James da Colômbia... O herdeiro estava lá, vendo tudo de camarote, ao lado de celebridades mundiais.

Diz a máxima do show business que "quem sabe, faz ao vivo." A lógica capitalista do maior evento esportivo da história força uma adaptação, "quem pode pagar, assiste ao vivo." Que inveja! Gostaria eu de poder ir a todos estes épicos jogos. Talvez se eu me organizar e economizar, em 2018 consiga. Isso! Rússia 2018, me aguarde! Minha noiva, me desculpe! Casamento só depois da próxima Copa ou se os Estados Unidos chegarem à final da Copa e eu ganhar o bolão sozinho.

Quando não está assistindo a jogos de futebol, o bilionário dedica seu tempo a encontrar o próximo Steve Jobs. Ele investe em mais de 10 startups, empresas nascentes do setor de tecnologia. "Sou investidor, então tenho bastante tempo livre." Eu sugeri a ele investir em um time de futebol, assim todo este tempo assistindo jogos poderia ser definido como trabalho, market research (pesquisa de mercado).

Este novo bilionário ainda não é dono de um clube de futebol. Ele afirma que seu lugar favorito do mundo é o Havaí. Perguntei se havia um time profissional de futebol lá e ele respondeu "não, não tem. Ainda não." E você, o que faria com mais de R$ 2.2 bilhões na conta? Talvez ter um clube de futebol possa ser um brinquedinho divertido.

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