Saiba como a seleção reage quando fica cara a cara com os jornalistas

Gustavo Franceschini

Do UOL, em Brasília

Em meio a um momento de pressão, Júlio César, Marcelo e Daniel Alves, por motivos e com intensidades diferentes, rebateram a imprensa. A ironia ou a resposta atravessada não são as únicas armas da seleção que, uma vez confrontada pelos jornalistas, reage de diferentes maneiras, alternando entre a simplicidade e o conteúdo de um Thiago Silva ao confronto aberto de um Oscar.

As reações são individuais, mas se repetem entrevista após entrevista, sejam elas coletivas de imprensa ou em contatos mais "corpo-a-corpo" como as zonas mistas após os jogos. Em cada um desses encontros, os jogadores mimetizam expressões e padrões de respostas anteriores, ainda que sejam diferentes.

As duas dinâmicas são, hoje, a única forma de contato do atleta com a mídia. Na entrevista coletiva, o jogador responde a tudo como o centro as atenções, diante de dezenas de jornalistas. Quando termina, ocasionalmente fala fora das câmeras com os repórteres, o que não é regra.

As zonas mistas são as áreas pelas quais, após as partidas, todos os jogadores devem passar. Trata-se de um corredor repleto de jornalistas de todos os países que se acotovelam por uma declaração.

Veja abaixo qual é a reação de cada um nesses contatos diretos com a mídia:

Júlio César
Uma das maiores transformações do grupo da seleção, o goleiro admitiu, em sua primeira entrevista este ano, que exagerou na autoconfiança há quatro temporadas, quando falhou na eliminação para a Holanda. Em 2014, ele baixou a guarda, embora não tenha esquecido os críticos.

Depois de um ciclo delicado, em que chegou a passar seis meses em atuar, Júlio sempre que pode ressalta que espera mais conhecimento da imprensa. "Eu acho que a crítica, quando ela vem, você tem de fazer igual laranja. Tem de separar o que é de ruim e o que é construtivo. É isso que falo quando escuto alguns jornalistas criticando", disse Júlio César, que se incomoda especialmente com quem ataca a qualidade do futebol no Canadá, onde ele atua. 

Nas zonas mistas, quando o contato com o jornalista é mais próximo, ele tem sido sucinto. Um dos primeiros titulares a deixar o vestiário, o goleiro está sempre com pressa e não costuma responder mais de uma pergunta a cada vez que para em um bate-papo.

Daniel Alves
Como o goleiro, o lateral não tem uma relação amigável com a imprensa, especialmente quando está na mira dos repórteres, como é o caso agora. Tímido, o lateral costuma falar em tom sereno e olhando para baixo. Quando ouve uma pergunta que lhe desagrada, quase sempre sorri ao responder, paradoxalmente.

Na Europa desde 2002, ele sempre evoca experiências do Velho Continente ao ser questionado. No ano passado, chegou a dizer que queria que a imprensa brasileira fosse como a espanhola, que torce abertamente pela seleção. Recentemente, desconversou quando questionado sobre a disputa com Maicon alegando que, como em seu clube, não há titulares e reservas.

A curiosidade do discurso de Daniel Alves é a barreira da língua. Acostumado com o espanhol, ele apela às expressões que fala diariamente ao conversar sobre os problemas da seleção. Uma das palavras preferidas do jogador, por exemplo, é o verbo "desfrutar", uma adaptação do idioma falado no Barcelona, onde ele atua desde 2008.

Thiago Silva
O mais completo jogador da seleção em entrevistas. Autoridade em campo como capitão, o zagueiro se sentiu à vontade para, por exemplo, dizer ao UOL Esporte qual é o tipo de tratamento que dá a David Luiz, Hulk e Neymar. No dia-a-dia do Brasil na Copa, a postura é a mesma.

Thiago é a pessoa ideal para responder sobre os temas espinhosos. Em 2013, foi ele quem revelou detalhes da negociação da premiação que os jogadores receberiam. Só não espere do zagueiro nenhuma declaração que desagrade ao grupo.

Cioso da relação que os jogadores mantêm entre si, Thiago serve de porta-voz do conjunto. Coube a ele, por exemplo, transmitir ao público o pedido dos jogadores antes do jogo contra o México. "Queria que todo mundo cantasse o hino agarradinho", disse o zagueiro, um dia antes do 0 a 0.

David Luiz
Carismático, eloquente e engraçado, David Luiz é um dos mais requisitados pela imprensa em qualquer ocasião. Como faz com os torcedores que o abordam, o zagueiro é atencioso e paciente, quase sempre um dos últimos a deixar a zona mista após os jogos.

Só que nem sempre é fácil arrancar uma declaração de David Luiz. Dependendo da questão, o jogador engata um discurso recheado de palavras rebuscadas e de significado forte. Nessas horas, muda a entonação, cria uma espécie de ritmo para a fala e geralmente olha para outra direção.

Esse modo mais "automático" de responder é utilizado em alguns temas específicos. O mais constante deles é a relação com a seleção e com a pátria. "Quem não tem ambição não chega a lugar nenhum. Nós sonhamos com momento como esse", disse ele, por exemplo, na entrevista coletiva que concedeu na última sexta.

Marcelo
O lateral-esquerdo é um dos mais arredios da seleção. Não por acaso, é um dos poucos do elenco que sequer possui um assessor de imprensa. Mesmo calejado na relação, Marcelo não esconde quando se incomoda com uma pergunta.

Foi assim nas duas entrevistas que deu desde que a seleção se apresentou. Olhadas para o lado, sorrisos amarelos e ironias são as armas preferidas do lateral, que por vezes é até mais direto.

Na zona mista, Marcelo nem sempre é dos mais atenciosos. Como outros colegas, se incomoda com a constante postura crítica da imprensa. Também por isso, atende com mais facilidade jornalistas que o abordam em espanhol.

Luiz Gustavo
O xerife de Scolari é sempre um dos primeiros titulares a deixar o vestiário após os jogos. Com um meião preto levantado até quase os joelhos e mala embaixo do braço, Luiz Gustavo para em todos os microfones, gravadores e bloquinhos com cara de mau.

A voz de radialista chama a atenção e o volante é paciente, mas o conteúdo não chega a impressionar. Como ele mesmo gosta de dizer, Luiz Gustavo é de se contentar com papéis mais simples.

"Não faço a mínima questão de ser conhecido ou de aparecer mais que os outros", resumiu o jogador, na única entrevista coletiva que deu até agora.

Paulinho
Embora seja peça fundamental nos times em que passa, também não é dos personagens com mais desenvoltura no trato com a imprensa. Paulinho e fluente, mas não foge quase nunca do discurso e é avesso a polêmicas. 

Recentemente, ele tem evitado um pouco a imprensa. Pressionado pelas más atuações, sempre que pode o volante passa por trás dos companheiros na zona mista para não ser abordado e ter de responder questões que não o agradam.

Contra a Croácia, por exemplo, ele quase cortou caminho rumo ao ônibus da delegação passando por trás de uma pilastra. Um jornalista, incomodado com a atitude, disparou: "Que falta de respeito". Paulinho ouviu, voltou e aí sim atendeu os repórteres por alguns minutos, negando qualquer menosprezo.

Oscar
O meia do Chelsea é quem mais dá respostas atravessadas à imprensa. Oscar fala bem, mas está sempre na defensiva no contato com os jornalistas, ainda mais quando está sendo questionado.

"Acho que não senti o ritmo de jogo", "Ele [Willian] não joga na minha vaga" e "Não é um amistoso que vai me tirar da equipe" foram algumas das frases mais fortes usadas pelo meia quando todos reclamavam das suas más atuações em treinos em amistosos.

Foi dele também a resposta mais ríspida após o 0 a 0 contra o México, quando a imprensa se perguntava o porquê da má atuação do Brasil. "Para mim a gente jogou muito bem hoje. Se a gente faz o gol vocês iam estar fazendo outras perguntas", disse ele.

Hulk
Tímido, o atacante está sempre sorridente e é um dos que mais falam com os jornalistas. Hulk é também dos mais sinceros da seleção, e não consegue muito dissimular o que está sentindo quando é questionado.

Em um desses arroubos de sinceridade, em 2013, Hulk disse que apoiava as manifestações que tomavam o país. Depois do jogo contra a Croácia, ele revelou a estratégia de Felipão ao contar que assumiu um papel mais defensivo do lado oposto do campo ao que costuma ficar.

Ele só assumiu um tom mais sério depois do 0 a 0 contra o México, quando foi barrado. Felipão disse que ele tinha condições de entrar em campo, mas deu a entender que o jogador sentia dores. Hulk, por sua vez, disse que estava bem e pronto para jogar, sem esconder seu incômodo com a situação.

Neymar
Disparado o mais requisitado da seleção, o camisa 10 fala baixo, sorri com facilidade e está acostumado aos flashes e perguntas. Em entrevistas coletivas, fica mais à vontade e não raro dispara frases mais ensaiadas, que ilustram o discurso do momento. Foi assim, por exemplo, quando ele disse, um dia antes da estreia, que não queria ser protagonista.

Na gestão de Felipão, Neymar tem sido blindado contra a superexposição. Isso significa que ele, entre outras coisas, fala menos vezes com a imprensa. Até agora, ele só concedeu uma entrevista na preparação para a Copa, justamente essa no dia anterior à abertura.

Na zona mista, o camisa 10 é concorrido. Repórteres de TV pedem ajuda dos assessores da CBF para garantir uma palavrinha do craque e jornalistas de outros veículos se acumulam em pontos estratégicos para que Neymar possa falar uma vez apenas com todos. Nem sempre dá.

Fred
Um dos melhores entrevistados da seleção brasileira, Fred assume posições, tem eloquência e é carismático. O problema é que ele evita os microfones quando não está tão bem.

Depois do jogo da Croácia, ele nem teve de explicar o pênalti sofrido em campo porque estava no antidoping. O 0 a 0 contra o México, porém, o forçou a passar a contragosto pela zona mista. Fred ignorou praticamente todos os repórteres, evitando falar sobre a sua má fase.

Quando decide falar, como foi em 2013, Fred consegue impressionar. Na Copa das Confederações, por exemplo, ele fez promessa de gols, brincou com o número de familiares que levaria para o estádio e falou sobre assuntos internos da seleção com propriedade.

Reservas
Dos 12 jogadores que normalmente ficam no bando de Felipão, ninguém é mais requisitado que Hernanes. O ex-são-paulino é um dos jogadores mais simpáticos da seleção e tem desenvoltura. Depois do 0 a 0 contra o México, por exemplo, ele estava apressado pelo voo marcado para curtir a folga, e mesmo assim perdeu cerca de 20 minutos respondendo questões dos repórteres.

Fora ele, poucos ganham tanta atenção. Bernard, igualmente solícito, e Ramires e Willian, pelo flerte constante com o time titular, também são abordados. Entre os demais, pedidos de entrevistas apenas para reportagens especiais ou entrevistas que atendam um público específico, como quando Victor para para falar com uma rádio mineira por ser goleiro do Atlético-MG. 

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