T. Silva vai de ofensas a David Luiz a mimo a Hulk: "tenho o grupo na mão"

João Henrique Marques

Do UOL, em Paris (França)

Xingar David Luiz, passar a mão na cabeça de Hulk, dar ouvidos a Neymar. O capitão da seleção brasileira, Thiago Silva, avisa que sabe como tratar os 22 companheiros convocados por Felipão: "Me sinto um líder respeitado e tenho esse grupo na palma da mão".

O zagueiro de 29 anos atendeu a reportagem do UOL Esporte em Paris um dia após ser convocado e, também como capitão, ter conquistado o título de campeão francês com o Paris Saint-Germain. O líder do grupo que busca o hexacampeonato na Copa do Mundo no Brasil mostrou orgulho do respeito conquistado, capaz de fazer até os jogadores da seleção o esperarem sentar na mesa para comer e só saírem dela quando terminar. 

A conversa de aproximadamente 40 minutos só foi interrompida por um breve instante, quando Thiago Silva abusou da modernidade e atendeu a um chamado telefônico pelo relógio. A conversa era com parentes no Brasil que o parabenizavam pela convocação e o título francês.

Na entrevista, o zagueiro mostrou ter opinião para tudo. Falou já pensar nas oitavas de final, elegeu o Chile como um dos favoritos para ganhar a Copa, colocou como tragédia o Brasil não ser o campeão, e disse não acreditar que exista brasileiro torcendo contra a seleção. Veja a seguir a entrevista de Thiago Silva.  

UOL Esporte: Como você também é capitão do Paris Saint-Germain, qual foi o tratamento dado ao Lucas após saber que não foi convocado?

Thiago Silva: Você precisa saber tratar com o jogador. O Lucas andou cabisbaixo, sem falar com ninguém e não era o momento do capitão, nem ninguém, chegar nele e dizer para que não fique desse jeito. Ele queria estar na Copa tanto quanto eu. Preciso de alguns dias para conversar isso com ele. O que fiz foi ficar quieto na minha e nem direcionar a palavra a ele. Percebi que ele ligou o som do quarto e quis ficar sozinho na concentração antes do jogo. Eu e o Maxwell não fizemos nenhuma comemoração perto dele. Sabemos respeitar esse momento.

Quando sentiu que começou a virar capitão da seleção brasileira?

Lembro que a escolha do capitão foi uma coisa totalmente inesperada por mim. O Mano (Menezes) me chamou um dia e disse que tinha uma coisa muito séria a ser conversada. Ele perguntou se eu aceitava ser o capitão do Brasil. A explicação dada era a de que eu comandaria um grupo que estava sendo renovado, pois era um jogador frequentemente convocado e conhecia muito bem a personalidade de cada um do grupo. Isso é verdade. Sei como tratar pessoa a pessoa. O Felipão logo que chegou veio com o mesmo discurso de confiança em mim e isso ficou. Em nenhum momento falou que ia me tirar de capitão ou algo assim, nos damos muito bem. Eu não tenho queixa desse grupo convocado. Me sinto um líder respeitado. Tenho o grupo na palma da mão.

Então você não dá o mesmo tratamento para o Neymar e o Oscar, por exemplo?

Não. O Neymar não precisa mais de uma blindagem de quando era garoto, já é um pai de família e é o nosso cara para decidir jogos. Ele sabe ouvir, tem boas opiniões e sabe que não é um cara que eu tenha que passar a mão na cabeça. Aprendi a entender cada um. O David Luiz, por exemplo, funciona na base da energia. Eu e ele nos xingamos e assim nos entendemos. É meu melhor amigo. Já o Hulk é um cara que eu não posso xingar, pois ele sente. Fica acanhado. Ele precisa de um tratamento mais na base da conversa, passando carinho e confiança. Fui aprendendo isso com o convívio.

O Felipão citou que ele vê o respeito que o grupo tem por você até na hora das refeições...

É verdade isso. Passou a acontecer comigo na seleção de me esperarem para comer. Já fui adepto disso. Lembro que quando cheguei no Milan era todo mundo esperando o Ambrosini, o Gatuso comerem e saírem da mesa também. O Ronaldinho que não fazia isso e ouvia o Gatuso reclamar e gritar: 'cadê o respeito?' Ele fingia que nem ouvia e ia direto para o quarto dele. Eu enxergo sim isso como um sinal de respeito e fico feliz quando vejo que todos na seleção seguem esse comportamento.

Você é um capitão que já sabe o que falar ou fazer se levantar a taça?

Olha, ansioso realmente estou. Só que sempre fui um cara de momento e gosto de ser levado por essas emoções. Então não sou um cara que programo gestos ou discursos. Falo o que o grupo precisa ouvir no momento e aquilo que está dentro de mim. A reação em uma conquista vem através do sentimento vivido no momento.

A juventude desse grupo não te preocupa em nada?

Apesar de ser jovem é de qualidade técnica incrível. Você pode cobrar experiência e sabedoria para cada situação vivida, mas jogar como eles sabem são poucos que conseguem. O grupo tem seus líderes, pessoas a serem utilizadas como exemplos e outras com o atrevimento da juventude. A coisa em comum é o sangue nos olhos. Posso garantir que a idade baixa não é um problema. É o grupo que ganhou a Copa das Confederações jogando como veterano.

A convocação do Henrique foi a mais questionada. Qual a sua opinião sobre ela?

O que não faz sentido é haver questionamento técnico sobre o Henrique. Ele tem leitura de jogo, velocidade, joga bem com a bola nos pés e entra nesse espírito do grupo. Você pode manifestar algum problema físico, mas o Felipão sabe quem vai chegar em boas condições. O Henrique é do mesmo nível dos outros cotados. Já passou a ser fundamental no Napoli e gostei do nome dele no anúncio. A verdade é que a seleção deveria ter mais de 30 convocados. Tem muita gente que merece de fora. Vamos jogar por eles também.

Você chegou a dizer que sentia falta de respeito no PSG quando chegou por conta do mau momento da seleção. Isso já mudou?

Eu era novo no PSG e ouvia brincadeiras dos companheiros em cada jogo ruim da seleção. Era zoado mesmo. Não gostava das brincadeiras. Só que isso já mudou há algum tempo. Acho que foi o título da Copa das Confederações mesmo. Aquilo fez gerar um temor da seleção brasileira que é bom para nós. O Brasil precisa ser respeitado em uma Copa do Mundo

E quais seleções são favoritas, além do Brasil?

Aponto a Espanha também como favorita pela história dessa geração e bom nível de jogo sempre apresentado. Aí depois coloco a Alemanha pelos jogadores talentosos e Argentina por uma crescente significante nos últimos jogos. Depois disso penso que vem o Chile. É uma seleção muito forte e guerreira. Daí em diante que vem Itália pela camisa, Holanda e acho que já para por aí.

Então a fase de oitavas de final provavelmente contra Holanda, Espanha e Chile, já te preocupa?

Sim. Não temos como negar isso. São três seleções das mais fortes da Copa que estão do nosso lado da chave. Eu já penso em um desses jogos e como vamos fazer para nos impor, conseguimos a vitória. Claro que a estreia contra a Croácia, a busca pela classificação, tudo isso não é secundário. Só que estamos em uma competição curta e precisamos olhar ela como um todo. É saber que temos caminhos complicados e fazer por merecer o título. Sete jogos, e sete vitórias. Não tem jeito.

E não ganhar a Copa significaria tragédia?

Sem dúvida nenhuma é uma tragédia. O brasileiro não entra em competição para ser segundo, terceiro. Você nem ouve essa marca ser lembrada. Eu estou com o Felipão, que segue o discurso de que nós estamos na Copa para ganhar. Sabemos entender que existem outras seleções com o mesmo pensamento, mas não admitimos ficar sem a Copa do mundo jogando em casa.

Você acha que o Brasil se preparou bem para organizar a Copa do Mundo?

Nós brasileiros não temos jeito, deixamos tudo para o último momento. Li sobre atraso, problemas enfrentados, mas sempre tive a certeza de que vai sair. E estou seguro que em termos organizacionais daremos um espetáculo, com tudo corretamente funcionado. O brasileiro é um povo lutador e vai mostrar um grande trabalho ao mundo

E o que dizer dos brasileiros que vão torcer contra a seleção?

Eu não acredito que exista brasileiro que não vai gritar pela gente. A questão da corrupção é para ser manifestada mesmo e com muito protesto. O que eu não gosto é de ver gente aproveitando isso e sendo violento, saqueando, arranjando confusão. Isso me deixa revoltado. Agora tenha certeza que o brasileiro é apaixonado pela bola. Lembro que isso foi o primeiro presente que pedi à minha família. Na hora que ela rolar vai ser todo mundo do nosso lado.

Assim, você está esperando ouvir o hino sendo cantado forte pela torcida em todos os jogos, como foi na final da Copa das Confederações? 

Nós (jogadores) cantamos o hino abraçados e com força e é uma coisa que já pegou. E acho que a torcida participar disso e nos passar ainda mais força é outra coisa que já pegou também. Eu consigo sentir o desejo do torcedor brasileiro pela vitória. É por isso que falo que o brasileiro não vai deixar de torcer na hora que a bola rolar. Temos todo esse instinto de defender o que é nosso. Jogamos pela bandeira do país, o distintivo da camisa e isso é a nossa química com o torcedor. O que eu espero da arquibancada é esse apoio nos 90 minutos que não faltou na Copa das Confederações.

Você é supersticioso ou fez alguma promessa para o título? 

Tenho um costume antes dos jogos que é o de ajoelhar, fazer minha reza e ter meu momento com Deus. Fora isso, não tenho nenhuma outra coisa que realizo. Consigo olhar para a mania de cada um e ver o bem que faz para a pessoa. Mas particularmente não fiz nenhuma promessa em caso de título e não farei.

E como você se preparou para a Copa do Mundo? Há quanto tempo faz isso?

Eu posso te dizer que desde o final da Copa das Confederações eu já estou com a cabeça na Copa do Mundo. Sou um jogador que passei por lesões e preciso me cuidar. Tenho um fisioterapeuta de confiança (Marcelo Costa), que trabalhou comigo no Fluminense e consegui levar ao PSG, para me orientar e estou seguindo tudo à risca. Controlo também minha alimentação, não bebo mais refrigerante e como pouco chocolate. O que eu bebia de refrigerante era brincadeira, então é um vício que você deixa de lado por um propósito único. E isso passa a não ser tão sacrificante. Aqui na França sou muito cobrado quando dizem que estou com a cabeça na Copa e é isso mesmo. Faz um ano que só penso nela.

Você tem jogado de máscara (Sofreu uma fratura no osso da face). Vai ser assim na Copa do Mundo?

Eu tomei cotovelada e estou melhor. Já podia ter atuado sem a máscara, mas foi um conselho do Felipão. Ele me ligou na véspera da convocação e conversamos sobre questões físicas e disse para ele que já podia tirar. Ele disse: 'joga com a máscara'. A ideia é que eu vá realizando treinamentos sem ela até ganhar confiança. Então joguei com ela mais uma vez.

Você já sabia da convocação?

Não. Sempre fica um frio na barriga. Suei frio até o momento do anúncio. O Maxwell assistiu junto comigo no meu quarto. Marquinhos e o Lucas não estavam com a gente. Por mais que seja minha segunda convocação para a Copa, essa tem um sabor especial

E o que ficou de lição da Copa do Mundo passada?

Na questão comportamento o grupo também é um exemplo a ser seguido. Era unido, guerreiro e também merecia melhor sorte. Mas se tem uma coisa que fica como lição é dentro de campo. Não podemos achar que o jogo está ganho antes de acabar. Contra a Holanda entramos no vestiário no intervalo vencendo e nos deparamos com um segundo tempo em que eles pareciam outro time, estavam mais ligados e nós fomos acuados. Estava complicado tirar o time de trás. Esse é o tipo de lição que ficou para mim. Precisamos jogar todos os minutos como se estivéssemos perdendo.

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