Essa Copa é da Argentina. Pelo menos é o que os hermanos dizem...
Carolina Juliano
Do UOL, em Buenos Aires
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Stanley Chou/Getty Images
27.06.10 - Torcida argentina no jogo contra o México pela Copa de 2010
O técnico da seleção brasileira, Luiz Felipe Scolari, disse a um jornalista argentino que acompanha o Brasil no Rio de Janeiro que prevê uma final da Copa entre Brasil e Argentina, e mais, que torce para que isso ocorra. E na Argentina então, só se fala nisso. E se fala mais. Os argentinos estão tão eufóricos com essa Copa do Mundo que até parece que são os donos da casa. Ou melhor, os donos da Copa.
Além da proximidade física, sem nenhum oceano que separe os argentinos de sua seleção, tem um algo a mais na Copa no Brasil que talvez possa jogar contra a seleção alviceleste: uma sensação de obrigação de ganhar em solo brasileiro. "Temos que conter a euforia das pessoas. Tudo bem que sonhem, mas há de se saber que um Mundial não é fácil e, além disso, vamos à terra inimiga", disse o meia argentino Javier Mascherano depois de vencer o amistoso contra trinidad e Tobago, na última quarta-feira (4).
O técnico Alejandro Sabella já disse em entrevista ao UOL Esporte que jogar a Copa no Brasil é a maior motivação de sua seleção, mas tem contido essa euforia e vem resguardando seus jogadores do contato direto com a torcida ensandecida para que o que poderia ser um incentivo não se converta em pressão e acabe, assim, atrapalhando.
Torcida pode pressionar
"Os jogadores argentinos já têm sobre eles a pressão de chegar entre os finalistas porque não chegamos há muito tempo", diz Diego Bianchini, professor de futebol. "Nós torcedores sonhamos com uma final contra o Brasil no Maracanã e esse sentimento, com o caminhar do mundial, pode se converter, sim, em uma pressão sobre os jogadores, mas isso poderia ser positivo."
Positivo como? Coisa de argentino. "Em uma hipotética e sonhada final entre as duas seleções, os brasileiros que são os donos da casa e da festa teriam a pressão maior, e os argentinos se aproveitariam disso", explica Bianchini.
"Para o argentino essa é "a" Copa. Estar no Brasil, jogar no Brasil, contra o Brasil, é a oportunidade de derrotar o grande adversário em sua casa, é o sonho perfeito", define Estéban Edul, jornalista do canal TyC Sports. "Esse mundial tem um gosto diferente, e o argentino acredita tanto que a Copa já é sua que está fazendo loucuras para chegar ao Brasil para viver isso de perto."
Sonho ou pesadelo?
Para Gustavo Pérez, produtor do mesmo canal, a euforia dos argentinos com a Copa é nítida e o sentimento é mesmo o de obrigação de ganhar porque seria a forma perfeita de arrasar por completo o rival eterno. Mas ele consegue ver o outro lado da situação. "Seria lindo, sim, ter uma final contra o Brasil no Maracanã, mas e se a Argentina perde? Seria muito pior, o sonho viraria pesadelo e seria ainda mais arrasador para nós, não teríamos como suportar uma derrota para o Brasil lá no Brasil. Melhor que seja contra a Alemanha."
Apesar disso, Pérez não acredita que os jogadores sentem isso como obrigação. "Muitos jogam há muito tempo na Europa e devem ter perdido um pouco do sentimento de rivalidade, creio que eles irão ao Brasil como foram à África do Sul", diz. "Agora, se ganharem, aí sim tudo muda, eles com certeza irão sentir o título com muito mais gosto e vontade por ter sido conquistado no Brasil."
"Mais do que uma obrigação de ganhar o Mundial, o sentimento que existe é que essa é a grande oportunidade de sairmos campeões, por várias razões: a principal, por Messi, que aos seus 25 anos está no auge da sua carreira, e logo se estabelece uma comparação com Diego [Maradona] ganhando em 86 também com 25 anos", diz Mariano Echegoyen, da ESPN Argentina. "A segunda razão é a proximidade do Brasil e a sensação de "locais" que vamos ter ali, com grande quantidade de torcedoras nos estádios."
Echegoyen fala ainda que os torcedores confiam muito nos "4 fantásticos" do ataque argentino e faz outro paralelo com a seleção campeã em 86. "Depois da experiência de Maradona como técnico, voltamos a ter um técnico de estratégias, um homem muito capaz que é o melhor que poderíamos ter neste momento. Outro analogia com 86: Maradona/Messi e Bilardo/Sabella."
Grupo "low profile"
De fato, o grupo liderado por Alejandro Sabella tem se mostrado equilibrado e comedido, e nos amistosos internacionais que já jogou no comando da seleção, o técnico nem de longe lembra aquela explosão de emoção que vinha do banco quando nele se sentava Diego Maradona, na última Copa do Mundo.
"Essa seleção é muito 'low profile', equilibrada, não creio que sinta esse tipo de pressão", diz Hernán Clauss, editor do diário "Olé". "Torcedor é outra coisa. O argentino vem sonhando com esse mundial do Brasil desde que se definiu que seria ali."
"Eu nem acredito muito que essa seleção chegue a ganhar o Mundial porque não gosto da lista de convocados", diz o comerciante Juan Caamaño. "Mas somos argentinos, torcemos pela Argentina e a Copa vai ser jogada no Brasil. Isso muda tudo, a vontade de ganhar na casa do adversário me fez hastear bandeiras azul e brancas por todos os lados."