Após morte de cinegrafista, Estado tenta sufocar protesto contra Copa em SP

Tiago Dantas

Do UOL, em São Paulo

São Paulo e outras seis capitais vão assistir, neste sábado, 22, ao primeiro grande protesto contra a Copa do Mundo após a morte do cinegrafista da Band, Santiago Andrade, atingido por um rojão enquanto cobria uma manifestação contra o aumento da passagem de ônibus no Rio de Janeiro no último dia 6.

Adeptos das táticas black blocs prometem voltar às ruas e reagir a possíveis abusos da polícia. Com violência, se for preciso. O Estado, por sua vez, adotou estratégias para tentar esvaziar a marcha. A concentração está programada para as 17h na Praça da República, no centro. Até a noite desta sexta-feira, 13 mil pessoas haviam confirmado presença. Por volta das 21h30 desta sexta, alguns ativistas começaram a montar barracas no local.

Nas páginas de divulgação do evento nas redes sociais, as pessoas votaram, em uma enquete, a favor da presença dos black blocs no ato deste sábado. A maior parte dos comentários, porém, pedia para que não houvesse violência e que fosse permitido a todos expressar suas ideias. O grupo votou, em outra enquete, contra o veto a bandeiras de partidos políticos, por exemplo.

No primeiro protesto contra a Copa do ano, em 25 de janeiro, mais de 130 pessoas foram detidas, a PM invadiu um hotel para prender manifestantes, agências bancárias foram depredadas, um carro pegou fogo e dezenas de latas de lixo foram quebradas. Um jovem foi baleado e outros reclamaram da truculência da polícia.

Além de São Paulo, outras capitais devem receber protestos neste sábado: Brasília, Belo Horizonte, Cuiabá, Fortaleza, Manaus e Natal.

Nem todos que confirmaram presença ao evento paulista poderão ir, no entanto. Manifestantes que participaram de outros protestos e que, de alguma forma, foram identificados pela polícia foram chamados para prestar depoimento no Deic (Departamento Estadual de Investigações Criminais) às 16h. Como o procedimento deve demorar, é provável que não saiam a tempo de ir ao ato.

A tática é semelhante à adotada pela polícia inglesa para impedir que torcedores violentos fossem a jogos de futebol dos seus times. A diferença é que, desta vez, nem todos os convocados a prestar depoimento se identificam com o uso da violência. Em um dos casos, a mãe de um manifestante, que nunca foi a passeatas, também foi chamada.

"É uma coincidência muito grande que tenham marcado o depoimento para o horário da manifestação. Claramente querem esvaziar o movimento", afirma o estudante R., de 23 anos, que pediu para não ser identificado. R. diz ser contra o uso das táticas black blocs e afirma que nunca fora detido pela polícia durante os atos de 2013.

Procurado, o Deic informou que o inquérito que apura a possível conduta criminosa nos protestos corre em segredo de Justiça e que, por isso, não podia responder porque as pessoas foram chamadas à delegacia.

Em nota, a Secretaria de Segurança Pública confirmou que há "depoimentos agendados pelo Deic como parte das investigações que apuram práticas criminosas em manifestações. Parte dos depoimentos acontece neste sábado. Outros serão agendados nos próximos dias. Desde outubro, o DEIC já realizou mais de 80 depoimentos."

Especialistas em jiu-jitsu

As ações do Estado não param por aí. A PM pretende levar para as ruas policiais militares especialistas em jiu-jitsu. Os soldados são treinados para atuar sem o uso de armas em situações em que é preciso imobilizar alguém que esteja cometendo um crime. Como nos outros atos, a Tropa de Choque também estará a postos.

Questionada, a PM não informou o número de policiais que estarão nas ruas "por se tratar de informação estratégia". Com relação à Tropa de Choque, a corporação afirmou, em nota, que o pelotão "acompanhará o evento e será empregado caso haja grave comprometimento da ordem".

Outra ação que pode ser interpretada como uma forma de esvaziar o protesto foi a explosão de artefatos que supostamente foram encontrados com o estoquista Fabrício Chaves, de 22 anos, baleado durante o protesto de 25 de janeiro. A PM convocou a imprensa para o evento, na véspera da manifestação. Ativistas argumentam que é uma forma de tentar colocar a opinião pública contra eles.

O artefato explosivo estava dentro de latas de cerveja que foram encontradas na mochila de Chaves e de um amigo, segundo policiais que participaram da ocorrência. "Sozinho, o material pode causar lesões graves, como queimaduras. Porém, se jogado embaixo de um automóvel, potencializado com o combustível que estiver no tanque, pode causar uma grande explosão.", explicou o comandante do GATE (Grupo de Ações Táticas Especiais), capitão Ricardo Folkis, que coordenou o trabalho de explosão nesta sexta-feira.

A atitude da PM desagradou o defensor público Carlos Weiss, responsável pela defesa de Chaves. Segundo eles, os policiais cometeram um crime ao destruir uma prova do inquérito, já que o estoquista está sendo acusado pela posse de explosivos. Se o material foi destruído e a defesa não tiver direito de fazer um laudo paralelo, a acusação pode até ser retirada.

"Esse objeto não poderia ter sido destruído, já que esses objetos nunca chegaram a ser examinados pela Defensoria. A PM tem agido de uma forma prepotente ao acusar e julgar o Fabrício, como se estivessem em um queda de braço. E essa não é a função da PM. A função da PM é garantir a segurança pública. Se ele fez algo errado, será julgado por isso", afirmou Weiss.

Segundo a PM, porém, apenas uma parte da substância encontrada pelos jovens foi detonada na sexta-feira. Baleado no braço e nos testículos, Chaves chegou a ter alta em 5 de fevereiro, mas voltou a ser internado há uma semana com uma infecção.

Veja também



Shopping UOL

UOL Cursos Online

Todos os cursos