Valcke vai de agente duplo a coadjuvante. Veja a semana da Fifa no Brasil

Aiuri Rebello, Tiago Dantas e Vinícius Konchinski

Do UOL, em Brasília, em São Paulo e no Rio de Janeiro

O secretário-geral da Fifa, Jérôme Valcke, chegou acompanhado da comitiva da Fifa na segunda-feira ao Brasil (20) para mais uma rodada de visitas e inspeções técnicas nos estádios da Copa de 2014. O roteiro do secretário-geral começou pelo Itaquerão, em São Paulo, palco da abertura com o jogo entre Brasil e Croácia. Passou por Cuiabá e, depois, seguiu para Curitiba, onde deu um ultimato para que a Arena da Baixada fique pronta ou será retirada da Copa. De lá, partiu para a capital do Rio Grande do Norte e encerrou a viagem na quinta-feira (23), no Rio de Janeiro. 

A reportagem o UOL Esporte acompanhou parte das visitas aos estádios e relata abaixo alguns bastidores e curiosidades. A visita da Fifa teve constrangimento com o "chute no traseiro", discursos repetidos em São Paulo e Cuiabá e até anúncios surpresa em Brasília. Muitas vezes, Valcke foi preterido pela imprensa em função da presença da presidente Dilma Rousseff, e o secretário-geral da Fifa chegou até a vazar informações na internet sobre o andamento das obras. 

Enquanto Valcke concentrou-se em visitar os estádios ainda em obras para cobrar mais celeridade no término dos trabalhos -- além de inaugurar a Arena das Dunas, em Natal, junto com a presidente Dilma Rousseff --, a equipe técnica da Fifa percorreu as seis arenas já inauguradas e usadas na Copa das Confederações para ver como está a conservação dos locais e elaborar os planos de ação para o Mundial em junho.

Chute no traseiro

Durante a coletiva de imprensa no Itaquerão, em São Paulo, Valcke ficou em uma situação constrangedora. O dirigente não conseguiu esconder o descontentamento ao ser perguntado se o Brasil ainda merecia um chute no traseiro. Ao ouvir a tradução simultânea, Valcke balançou a cabeça e olhou para o chão.

Na hora de responder a pergunta, nem tocou no assunto. Disse apenas que, como não tinha ido às outras sedes ainda, não poderia falar como estava a preparação em outras sedes. O repórter fez referência a uma declaração dada por Valcke em março de 2013. Na ocasião, o secretário-geral da Fifa disse durante um evento em Londres que o Brasil precisava de um chute no traseiro para apressar o andamento de algumas obras.

Agente duplo

Ao contrário do que aconteceu em outras arenas, a imprensa foi impedida de entrar com Valcke na Arena da Baixada, em Curitiba. Inusitadamente, e antes de ameaçar deixar a capital paranaense de fora da Copa, Valcke postou em sua conta no Twitter uma foto que ele produziu lá dentro, para "denunciar" o atraso nas obras. Ou seja, a blindagem contra a imprensa pretendida pelo governo foi vazada pela própria Fifa. "Plano com 3 medidas do governo e de Curitiba deve acelerar o processo para ter o estádio pronto para a Copa", escreveu na ocasião na rede social. "Agora a bola está com Curitiba e o governo para implementar essas medidas", completou.
 

Disco Arranhado

Os discursos que Valcke fez no Itaquerão, na segunda-feira de manhã, e na Arena Pantanal, em Cuiabá, na segunda-feira à tarde, foram praticamente os mesmos. Nas duas cidades, Valcke começou a conversa com a imprensa dizendo que o Brasil fora escolhido como sede da Copa em 2007 e que agora, passados sete anos, o ano da Copa chegou.

Nas duas cidades, o dirigente fez questão de lembrar que a Copa no Brasil bateu o recorde de procura de ingressos e de inscrições de jornalistas. "Mais de 10 milhões de pessoas pediram ingressos da Copa." O discurso só não foi repetido na Arena da Baixada, em Curitiba, porque a cidade levou um ultimato da Fifa por causa do atraso nas obras do estádio.

Coadjuvante

Se teve papel de personagem principal no Itaquerão, na Arena Pantanal e na Arena da Baixada, Valcke foi um mero coadjuvante na inauguração da Arena das Dunas, em Natal, nesta quarta-feira, 22. O dirigente não deu declarações à imprensa e não foi tão assediado pela imprensa, mais preocupada em fotografar a presidente Dilma Rousseff.

Na hora de cortar a fita de inauguração, Valcke teve dificuldade para achar um bom lugar perto da presidente e teve que disputar um posto com alguns dos inúmeros políticos que cercavam Dilma e a governadora do Rio Grande do Norte, Rosalba Ciarlini. Na hora do chute de Dilma, o francês se posicionou melhor. 

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Velhos amigos

O diretor-executivo do COL, Ricardo Trade, aproveitou a inauguração da Arena das Dunas para lembrar Dilma Rousseff que os dois já devem ter se encontrado na juventude. "Estudamos no mesmo colégio, presidente", disse Trade, enquanto Dilma caminhava pelo estádio antes da inauguração oficial.

Embaixador do otimismo

O ex-lateral direito pentacampeão do mundo com a seleção brasileira Cafu não possui cargo no COL, CBF, Fifa ou qualquer entidade do governo envolvida na organização da Copa. Apesar disso, conhecido por ser boa praça e simpático, Cafu participou junto com Valcke, a convite da Fifa, de todas as visitas que o cartola fez aos estádios do Mundial.

Nos bastidores, confirma-se que sua função foi estratégica: enquanto Valcke e os técnicos da Fifa faziam caras de maus, cobranças e ameaças, Cafu distribuía sorrisos e otimismo sobre os preparativos para o evento. "Vai dar tudo certo", repetiu à exaustão sempre que interpelado por jornalistas.

E nessa casa tem goteira?

  • Operários consertam goteiras na cobertura do estádio Mané Garrincha, em Brasília

Jérôme Valcke não participou da inspeção técnica da Fifa ao estádio Mané Garrincha, em Brasília, na quarta-feira (22), como é praxe neste tipo de visita. Escapou de passar por um constrangimento na coletiva de imprensa que acabou sobrando para o chefe do Departamento de Operações da entidade para a Copa de 2014, Cris Unger, escalado para falar com a imprensa em nome da entidade máxima do futebol. 

Questionado por jornalistas se as goteiras que apareceram na cobertura do estádio de Brasília, conforme revelou o UOL Esporte em dezembro, causavam apreensão na Fifa, o cartola fez uma careta de surpresa. "Eu não estou sabendo de goteira nenhuma", respondeu espontaneamente. Apesar de ter repercutido nos principais veículos de imprensa do país e na mídia internacional, o COL (Comitê Organizador Local) não comunicou a Fifa oficialmente do problema.

Diante da saia justa, Unger passou a palavra ao gerente de Operações do COL, Tiago Paes, e aguardou com atenção as explicações. ""Na verdade, não há preocupação nenhuma com o estádio nem com a cobertura", afirmou Paes, garantindo que a Secopa-DF (Secretaria Extraordinária para a Copa do Mundo do DF) e o COL tem tudo sob controle, e que o aparecimento de goteiras é normal.

"O que aconteceu aquele dia foi que a força do vento e a precipitação de chuva foram muito fortes em Brasília", emendou Cláudio Monteiro, titular da Secopa-DF, de forma ríspida e com cara de bravo. Não é verdade, como mostram dados do Inmet (Instituto Nacional de Meteorologia). Mais: o governo do DF sabe pelo menos desde setembro -- quando a arena recebeu show da cantora norte-americana Beyoncé debaixo de chuva e as goteiras apareceram pela primeira vez em um evento lá -- que a cobertura, de R$ 209 milhões, está com problemas, mas não fez nada e agora se mostra surpreso. Exposto o problema, diz que em 30 dias o conserto será efetuado.

Candangão vs. Copa

  • Gramado do Mané Garrincha é isolado para recuperação: laterais ainda muito machucadas

Ainda em Brasília, técnicos da comitiva da Fifa que realizou a vistoria no estádio Mané Garrincha ficaram chocados ao ouvir do pessoal da Secopa-DF que o local será palco de dois jogos pelas finais do Campeonato Candango de Futebol, nos dias 5 e 12 abril. Nos bastidores, o estado do gramado é considerado insatisfatório, fora do padrão Fifa até hoje, oito meses depois do estádio inaugurado.

"Ouvimos aqui hoje com preocupação que o gramado receberá mais dois jogos", disse o gerente de operações da entidade demonstrando contrariedade. "Realmente esperamos que seja respeitado um tempo de descanso o maior possível para que a grama pegue e se recupere", advertiu o representante da Fifa. "As expectativas das seleções que participam da Copa para estes estádios são enormes e temos que cumprí-las", diz o cartola da entidade máxima do futebol mundial. A ver.

Luz no fim do túnel

Durante a visita técnica na terça-feira (21) ao Maracanã, no Rio de Janeiro, a comitiva da Fifa ficou literalmente a espera de uma luz no fim do túnel. Enquanto a inspeção acontecia, jornalistas foram chamados ao campo para aguardar a chegada ali dos técnicos e então fazer as fotos e imagens para TV. Passados alguns minutos, percebeu-se que o grupo estava trancado dentro do túnel de acesso dos vestiários ao campo. Para piorar, haviam trocado o cadeado e não encontravam a chave. Passados pelo menos 15 minutos, a porta foi aberta por funcionários da arena, a visita continuou e as fotos foram feitas. Valcke não estava com os colegas nesta hora.

Queremos voar

No fim da rodada de viagens pelas cidades-sede da Copa e visitas aos estádios, técnicos da Fifa sentaram com representantes do Ministério do Esporte e outras esferas do governo federal para receber detalhes da malha área especial da Copa, que será implantada no Brasil durante o Mundial. A Fifa acompanha com grande interesse o assunto, e ouviu do governo que as medidas adotadas já baratearam o preço das passagens. São pelo menos 1.973 voos extras, além de uma alteração em cerca de 42% da malha área brasileira no período.

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