Quadrilha vendia até mil ingressos ilegais por jogo da Copa

Luis Kawaguti

Da BBC Brasil, em São Paulo

  • Divulgação/Polícia Civil

Uma quadrilha internacional desbaratada nesta semana no Rio de Janeiro chegava a vender ilegalmente mil ingressos por partida de Copas do Mundo, disse à BBC Brasil o promotor Marcos Kac, que participa das investigações do caso.

As autoridades apuram se parte dessas entradas vinha das cotas de jogadores de futebol.

O grupo criminoso teria atuado nos últimas quatro torneios e seria formado por cambistas e figuras ligadas ao futebol - que teriam acesso a membros da Fifa e até da delegação brasileira.

A Polícia Civil do Rio estima que o esquema movimentasse até R$ 200 milhões por mundial.

A quadrilha foi desmantelada na terça-feira com a prisão de 11 pessoas no Rio e em São Paulo - entre elas o argelino naturalizado francês Mohamadou Lamine Fofana, apontado pela polícia como um dos chefes do bando.

Na operação batizada de "Jules Rimet", cerca de cem ingressos, dinheiro e computadores foram apreendidos.

A Fifa afirmou por meio de nota que está colaborando com as autoridades para rastrear a origem das entradas encontradas em poder dos suspeitos.

Origem e destino

De acordo com autoridades envolvidas na investigação, parte dos ingressos apreendidos com o bando seria destinada à comissão técnica da seleção brasileira, outras delegações e organizações não governamentais.

Kac disse também ser possível que parte das entradas que foram parar nas mãos de cambistas tenha vindo da cota pessoal de jogadores.

"Existe essa possibilidade. Cada jogador recebe 50 ingressos por jogo", afirmou.

Segundo ele, esses ingressos podem ter sido doados por jogadores a pessoas do meio do futebol, tendo depois ido parar nas mãos dos cambistas. Mas não é possível saber se os jogadores sabiam ou não do destino que seria dado a essas entradas de cortesia.

Ele afirmou que um parente de um jogador que já atuou na seleção e ex-membros do time brasileiro podem ser convidados a prestar depoimento na investigação.

De acordo com o promotor, que investiga cambistas no Rio há anos, a polícia e o Ministério Público querem ajuda da Fifa para rastrear o número de série dos ingressos apreendidos.

Até ontem, a entidade organizadora do mundial não teria entrado em contato com o Ministério Público.

A Fifa divulgou uma nota assinada por seu diretor de Marketing, Thierry Weil, afirmando que espera por "informações detalhadas" das autoridades locais para identificar a origem dos ingressos apreendidos e, "em conjunto com as autoridades locais", "tomar as medidas adequadas".

Dinheiro sujo

De acordo com o promotor, escutas telefônica autorizadas pela Justiça e indícios levantados durante a investigação mostram que a quadrilha comercializava ingressos para o próximo jogo do Brasil, em Fortaleza, na próxima sexta-feira, por um valor aproximado de R$ 5 mil.

Ele disse também que o valor cobrado por cambistas para a final do mundial variaria de R$ 24 mil a R$ 35 mil. Porém, segundo ele, após as prisões desta semana esse comércio ilegal deve ser seriamente afetado.

O promotor também afirmou que o perfil de quem compra as entradas varia muito de acordo com o jogo em questão, mas muitas das compras estariam sendo feitas com dinheiro sujo.

Ou seja, o preço das entradas estaria inflacionado no mercado negro pois muitos compradores estariam usando recursos de origem não comprovada – como caixa dois de empresas – para adquiri-los.

Fifa

Kac afirmou que há uma forte suspeita sobre o envolvimento de pessoal da Fifa no esquema ilegal de venda de ingressos por meio de cambistas. "(O envolvimento de alguém) da Fifa é quase certo", afirmou.

As investigações revelaram que ingressos privilegiados – como de categoria 1 ou de "hospitality centres" – eram repassados de delegações e ONGs ligadas ao mundial para cambistas que usavam três agências de turismo de fachada que operavam em Copacabana, no Rio de Janeiro.

Essas empresas entrariam em contato com outras agências que trazem turistas estrangeiros ao Brasil para vender as entradas por preços elevados, gerando margens de lucro de 200% a 1.000% superiores a qualquer atividade lícita do setor.

"O maior prejudicado com isso tudo é o público em geral, que não pode pagar esses preços para ir ao estádio. Esse sistema está todo viciado", disse Kac.

De acordo com ele, ao menos sete suspeitos de envolvimento no caso estão foragidos. Os 11 detidos devem responder por crimes de lavagem de dinheiro e evasão de divisas.

Ele afirmou que Fofana tinha papel chave na organização criminosa, mas o cabeça do esquema ainda não foi pego.

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