Jovens 'filhos da tragédia' em Terê usam futebol para superar traumas

Luiza Oliveira e Pedro Ivo Almeida

Do UOL, em Teresópolis (RJ)

Eles são adolescentes e, como tantos garotos da mesma idade, amam o futebol. Torcem para um time do coração, aproveitam seus fins de semana jogando bola e sonham em um dia jogar na seleção brasileira. Mas, diferentemente dos outro garotos de sua idade, o futebol não é só uma diversão. É uma maneira de superar traumas gravados para sempre na memória.

As crianças vítimas das chuvas que mataram centenas de pessoas em Teresópolis, em janeiro de 2011, cresceram e hoje são adolecentes. Após tantas perdas, entre pessoas queridas e bens materiais, eles encontram no futebol a alegria de viver.

No último sábado, cerca de 50 jovens promoveram um jogo de futebol no Campo do Posse, um dos bairros mais destruídos pelas enchentes, e fizeram uma homenagem com uma grande roda de oração às vítimas.

Matheus de Oliveira, hoje com 17 anos, joga como meia no futebol de campo. Mas gosta mesmo é de ser fixo no futsal. É flamenguista, mas 'trai' o rubronegro quando denuncia seu ídolo na seleção. "Fred. Queria ser igual e ele. Mas vi que não dava para jogar como centroavante", brinca.

Hoje, Matheus sorri. Mas viveu maus momentos. Tinha 13 anos no dia da tragédia em que perdeu 20 parentes. Emocionado, relembra a aventura, digna de um filme hollywoodiano, para sobreviver. Estava na casa dos avós quando viu o mundo desabar em forma de trombas d'água.

Ele estava dormindo em um colchão na sala para ver televisão quando a água começou a tomar conta da casa. Ao tentar sair, uma tromba d'água o 'empurrou' para dentro de casa. A salvação foi a explosão do fogão que abriu um buraco no teto. Ele, os avós, os pais e a irmã escaparam pelo telhado. A cicatriz no corpo, culpa de um vergalhão de aço que abriu a perna e quase provocou um amputamento, não é nada perto das marcas no coração.

"Aquela noite foi a pior de todas. Foi muita tristeza e dor. Até hoje quando chega o dia 12 eu não saio de casa. Fiquei meses sem sair. So melhorei quando entrei em um projeto social que tinha futebol".

A história de Matheus se assemelha a de seus colegas. Gabriel Vieira, de 14 anos, é fominha da bola no campo. Mas a imagem contrasta com a timidez desse torcedor do Fuminense para conversar. Aquela noite de janeiro também foi inesquecível para ele.

Ele dormia com o amigo Ramon e acordou de madrugada sem saber o que estava acontecendo. Ao sair do quarto se deparou com uma cena trágica. Sua casa foi uma das únicas a ficar intacta e virou um depósito de corpos.

"Quando eu acordei, tinham quase cem pessoas mortas na minha casa. Não lembro se eram 95 ou 98, umas em cimas das outras. Minha casa era grande, então cabia muita gente".

A cena que ele não gosta de contar não vai sair da memória, mas pode ser aliviada entre os pensamentos. "O futebol ajuda a descontrair. Quando a gente está jogando, a gente fica mais leve", afirmou.

O amigo, Ramon Andrade, também se assustou, mas compartilha do mesmo sentimento do amigo. "Nunca vou esquecer. Perdi 13 pessoas, tias, primos, muita gente. Só fico tranquilo quando jogo futebol", conta ele que é fã de Fred e de Neymar.

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