Na fábrica de sacanear o Brasil, perde-se o amigo, mas nunca a piada

Carolina Juliano

Do UOL, em Buenos Aires

O lugar de onde saem as maiores provocações contra o Brasil no mundo do esporte é um andar pequeno, num prédio velho no centro de Buenos Aires, na Argentina. Nas paredes, fotos de jogadores em posições duvidosas, de mulheres quase nuas e de grandes campeões de sempre refletem a irreverência do diário "Olé". E mais de 70 cabeças pensantes, fabricando a munição para o dia seguinte.

Uns amam e outros odeiam, mas o fato é que o jornal esportivo mais importante da Argentina não passa despercebido por ninguém. Todo fã de esporte, principalmente de futebol, admirador ou arqui-inimigo da seleção argentina sempre tem curiosidade para ver como o "Olé" deu a notícia. E na maioria das vezes é com humor e muito sarcasmo.

"Nunca temos a intenção de ofender ninguém. É tudo uma grande brincadeira, é para sacanear, isso é do esporte", diz o editor Hernán Clauss. Mas o Brasil parece ser a principal vítima do "Olé", não? "Bom, a verdade é que o Brasil é o nosso maior rival e adversário, acaba sendo também um alvo, mas sempre na brincadeira", completa Clauss.

Merde Amarela

Mas quem pode esquecer ou levar na brincadeira a manchete "Merde Amarela" com uma foto de Zidane rindo sarcasticamente de Ronaldo e Ronaldinho quando a França tirou o Brasil da Copa da Alemanha? Sim, alguns se ofenderam até porque a palavra é quase um palavrão no Brasil. "Sério? Eu não sabia. Bom, que nos desculpem os que se ofenderam, não era a ideia", diz o editor.

Ele explica que tudo é parte de uma rivalidade sadia, de um jogo e conta que há casos em que eles próprios se sacaneiam quando caem diante do Brasil. É o caso de uma capa de 2005, quando a Argentina levou uma surra - 4 a 1 -, na final da Copa das Confederações. Na edição sobre o jogo, o "Olé" editou uma capa que tinha apenas o aviso: "Por razões técnicas não pudemos imprimir essa capa. Até amanhã."

A última do diário contra um brasileiro nem sequer foi uma manchete ou uma reportagem publicada em suas páginas. Extrapolou. Foi um comercial que trouxe à tona uma piada que a maioria dos torcedores argentinos fazem sobre Pelé. Há muito tempo, os hermanos acreditam que o santista, quando adolescente, perdeu a virgindade com outro garoto. Pelé teria declarado isso em uma entrevista no Brasil.

O "Olé" retomou a piada para tirar sarro dos brasileiros e de Pelé em uma nova campanha publicitária para a Copa do Mundo que destaca a frase "debutó con un pibe" (estreou com um garoto). "Na Argentina já está institucionalizada a expressão. A frase foi imortalizada por Maradona, então todos repetem", disse Clauss. "O comercial não pretende ser homofóbico. Se é ofensiva? É, mas é um jeito de sacanear o adversário. De novo aqui não há a intenção de insultar Pelé e sua condição sexual, é parte de uma brincadeira. É parte de um folclore."

Todo brasileiro quer ler

O jornalista está no "Olé" desde a sua criação, há 18 anos. Ele conta que o diário levou para suas páginas uma rivalidade que existia entre as torcidas. "Encontramos um código de identificação com os torcedores expressando a rivalidade em nossas páginas quando ainda não se fazia isso na mídia argentina. E penso que conseguimos também esse código com os torcedores brasileiros que sempre querem saber o que vai sair no Olé, goste ou não do que vai ler", diz.

E para a Copa do Mundo no Brasil, o que o "Olé" tem reservado para nos sacanear? "Nada, não nos preparamos de maneira diferente porque a Copa é no Brasil. O fato de estarmos trabalhando no Brasil pode nos dar mais ideias, obviamente, mas vamos ter essas ideias com o passar dos dias", diz Clauss. "E vamos buscar coisas criativas e que não ofendam, ainda mais agora que me disse que a "Merde Amarela" ofendeu..."

Mas se não existe a manchete já criada para o Mundial, deve existir a manchete sonhada. "Ah, claro, a sonhada é 'Argentina ganha o Mundial no Brasil', óbvio! Não tenho como saber como seria exatamente o que escreveríamos porque nem sequer imagino como seria o país e como seriam todos, uma geração inteira nunca viu a Argentina campeã. Tudo ocorre mesmo no momento."

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