Mulher de Bebeto conta como surgiu a famosa comemoração na Copa de 1994
Felipe Pereira
Do UOL, em São Paulo
Passar o Dia dos Namorados de 1994 longe de Bebeto foi o menor dos problemas para Denise Gama de Oliveira. Naquele dia, quando estava na 34ª semana de gravidez, a mulher do jogador foi assaltada no Rio de Janeiro e jogada de barriga no chão. Depois de conferir que o bebê estava bem, tudo o que Denise mais queria era avisar o marido, que estava a oito dias de estrear na Copa do Mundo dos Estados Unidos.
A urgência se explicava por medo de apenas parte da história ser veiculada na imprensa e o atacante ficar alarmado. Beira o surrealismo tamanho desprendimento numa hora dessas, mas mulher de jogador de futebol é perita em se sacrificar para manter a paz do marido. O esforço pessoal foi recompensado. Dois dias após o nascimento de Matheus, em 7 de julho, Bebeto fez um gol contra a Holanda nas quartas de final da Copa do Mundo.
Na comemoração, o atacante balançou os braços como se estivesse ninando o bebê, um gesto copiado até hoje por inúmeros outros jogadores, sejam eles profissionais ou peladeiros de final de semana. "Foi em pleno Mundial, emoção a flor da pele. Marcou não só o jogador. Na Espanha (onde moravam), em férias, e em todos os lugares as pessoas queriam saber do filho. Vi jogador de outro país repetir a comemoração", lembra Denise.
Em uma época em que a telefonia celular e o uso de Internet quase não existiam no Brasil, Denise contou com a ajuda de Mônica, então mulher de Romário, para poder falar rapidamente com Bebeto. A amiga forneceu o contato de um segurança da delegação da seleção brasileira, que chamou o atacante. Os dois então conversaram sobre o assalto.
Pelo susto e todas as circunstâncias que cercaram o final da gravidez, Denise diz Matheus foi uma criança bastante agitada, diferente dos irmãos mais velhos. Além do assalto e da Copa em si, um outro fato deixou o último trimestre da gravidez conturbado. Em maio daquele ano o La Coruña, clube defendido por Bebeto, perdeu o título do Campeonato Espanhol na última rodada. E o jogador foi apontado como um dos culpados pela derrota, por não ter batido um pênalti decisivo no final da partida contra o Valência.
Com tantos acontecimentos, o menino nasceu três semanas antes do prazo. "O Matheus foi uma criança hiper agitada. Tudo se refletiu no menino". Também foi o primeiro parto sem o marido no hospital. Mesmo desaconselhada pelos médicos, ela decidiu ir para casa assistir à partida contra Holanda dois dias depois de ter dado à luz. Antes do apito inicial, falou com Bebeto, um costume que o casal cultivou durante toda a Copa. Na conversa o atacante afirmou que faria um gol e dedicaria a Matheus.
Denise nem deveria estar na sala de casa vendo a partida e prometeu não se mexer muito. Nem gritar ela podia. Mas quem obedece as recomendações médicas quando o marido dribla o goleiro e empurra a bola para o gol naquele que é considerado o melhor jogo do Mundial de 94? "Na hora não se controla. Fiz tudo que não podia".
Se ela não seguiu o que se comprometeu, Bebeto cumpriu a promessa. Na ligação depois do jogo explicou para a mulher como surgiu aquela comemoração. "Ele contou que não sabia como faria e na hora veio aquilo". Diferente do que muitos imaginam, não foi uma coreografia ensaiada.
Bebeto sentiria o bebê nos braços somente na segunda semana de vida do filho. Denise não estranhou estar sem a companhia atacante na fase final de gravidez. "Vida de mulher de jogador é assim. Fica mais tempo sozinha do que com o marido." Ela diz ainda que sempre procurou resolver as coisas porque nunca gostou de passar problemas para Bebeto. Mas isso não significa que sentiu saudades.
Logo, não via a hora do reencontro. O combinado era esperar em São Conrado, no Rio de Janeiro, e a mulher foi para lá no horário marcado. Só que ele não chegava nunca. "A volta foi um martírio. Foi para Recife, Brasília e atrasou. A família ligou avisando que o Matheus estava chorando de fome e voltei para casa. Para resolver a situação a bombinha entrou em cena". Ela encheu uma mamadeira e teve o tempo necessário para esperar a delegação.
Na Copa de 98 Denise não estava grávida, mas nem assim pôde seguir o marido pelos estádios da França. A CBF não queria as mulheres dos jogadores acompanhando o time, por isso ela ficou hospedada na EuroDisney, em, Paris, com as crianças. "Evitava para não criar problemas e só nos vimos nas folgas".
Quis o destino que o Matheus virasse jogador de futebol e Denise não acharia nada ruim sentir o nervosismo e a ansiedade de novo torcendo pelo filho em uma Copa do Mundo. Seria legal imaginar qual comemoração ele faria em caso de gol.