Conheça o carioca que será adversário do Brasil na estreia na Copa
Fernando Duarte
Do UOL, em Londres (Inglaterra)
As malas para a viagem ao Brasil ainda não estavam prontas quando Eduardo da Silva descobriu em 6 de dezembro do ano passado que carregaria peso extra no voo para o Rio de Janeiro. Se a possibilidade de participar de uma Copa do Mundo no Brasil como visitante já provocava sensações estranhas no coração carioca, o sorteio dos grupos se encarregou de despejar requintes de crueldade ao colocar a Croácia, o país adotado por Eduardo há 10 anos, na mesma chave da seleção brasileira. E ainda como primeiro adversário da equipe de Luiz Felipe Scolari, dia 12 de junho, no Itaquerão. Acreditar em algum tipo de predestinação era perfeitamente possível.
"Claro que a possibilidade matemática existia, mas eu sinceramente não acreditava que a Croácia ia cair junto com a seleção. Foi uma sensação muito estranha quando vi o sorteio. Fiquei sem acreditar que tinha acontecido, mas por outro lado isso parece fazer parte da minha história", admite o atacante, que vive na Ucrânia e defende o Shakhtar Donetsk, em entrevista exclusiva ao UOL Esporte, por telefone.
Parece mesmo sina. Nascido na Zona Oeste do Rio de Janeiro, Eduardo há mais de uma década vive no exterior e visita anualmente o Brasil, mas mesmo assim ele não consegue esconder um português com sotaque e às vezes algumas palavras lhe fogem da memória. Mas sua vida nova como jogador da Croácia, em 2005, começou justamente contra a seleção brasileira, quando ele participou do segundo tempo do empate em 1 a 1 num amistoso disputado em Split, em 2005. Tinha 22 anos e não hesitou em visitar o vestiário da equipe de Carlos Alberto Parreira após a partida para coletar autógrafos de Ronaldo, Roberto Carlos e companhia na camisa amarela que conseguira.
Se tivesse sido convocado para o Mundial da Alemanha, poderia ter enfrentado mais uma vez o Brasil, justamente o adversário de estreia dos croatas naquele torneio. E embora sua presença na equipe este ano não esteja garantida, o atual técnico da Croácia, Niko Kovac, encheu o ''croata carioca" de elogios quando esteve na Costa do Sauípe para o sorteio. "Dudu é um dos atacantes que tenho à disposição e também um dos jogadores mais experientes do elenco. Não vejo a situação dele como um problema. Tenho certeza de que ele sempre fará tudo para ajudar a Croácia", disse Kovac.
Mas Eduardo não esconde que a situação não é das mais confortáveis. Quando chegou à Croácia, em 1998, era apenas mais um jogador anônimo brasileiro buscando uma chance de fazer o pé de meia no futebol europeu. Tinha sido descoberto por um empresário depois de participar do Campeonato de Favelas da CBF, representando Vila Kennedy. Na ex-república da Iugoslávia, fez fama pelo Dínamo de Zagreb e se apaixonou por Andrea, com quem se casou e teve dois filhos. O casamento anos mais tarde abriu brecha para uma oferta de cidadania numa época em que a seleção croata se via em busca de centroavantes depois da aposentadoria de seu maior ídolo, Davor Suker.
"Todo mundo sabe que meu sangue é brasileiro. Saí muito cedo do país e tive a chance de conquistar meu espaço. Quando era mais jovem eu sonhava ser como o Romário e um dia jogar pelo Brasil, mas a concorrência era assustadora. A Croácia me recebeu de braços abertos, fiz minha vida lá. Espero que os torcedores brasileiros entendam. Quando estive no Brasil em dezembro ouvi muita brincadeira boa. O dono da mercearia perto da casa da minha mãe disse que vamos levar uma goleada mas eu vou fazer o gol de honra", conta o atacante, de 30 anos.
Eduardo retribuiu a confiança dos croatas à altura: com 29 gols em 61 partidas, ele é o segundo maior artilheiro da história do país. Nas eliminatórias, foi utilizado em sete partidas e marcou dois gols num grupo em que a Bélgica sobrou e que marcou uma irônica disputa particular pela vaga na repescagem entre Croácia e Sérvia, pivôs da guerra civil iugoslava do início da década de 90. "Temos um time que pode dar trabalho e surpreender qualquer seleção. O Brasil tem, como sempre, um belo time e é favorito. Mas a Croácia não vai querer fazer figuração. Vai ser estranho, mas que eu quero muito jogar a Copa", afirma.
Contratado em 2007 pelo Arsenal, da Inglaterra, como uma das opções de substituto para o ídolo Thierry Henry, Eduardo viu a chance de se firmar no futebol inglês destruída por uma fratura na perna decorrente de uma entrada desleal do zagueiro Martin Taylor, do Birmingham. A lesão foi grave e poderia ter encerrado a carreira do atacante. Ele disputaria apenas 41 partidas pelo Arsenal, marcando nove gols, antes de aceitar a proposta do Shakhtar. Lá, se juntou a uma legião de brasileiros.
"É uma turma muito legal. Há pouco tempo chegou o Bernard, que joga na seleção. A gente já brincou um pouco sobre a Copa do Mundo, mas sempre com o maior respeito. Tenho muito orgulho das minhas origens e muito carinho pelo Brasil. Às vezes até fico meio ressabiado de falar muito sobre esse jogo porque não quero que façam muita onda ou me interpretem mal", diz Eduardo.
O atacante justifica o cuidado ao citar o exemplo da polêmica envolvendo a naturalização de Diego Costa pela Espanha. Eduardo acredita que o atacante do Atlético de Madri poderia ter lidado melhor com a situação. "Ele é quem tem de saber o que é melhor para ele, mas ficou mal na história porque já tinha sido convocado pelo Brasil e depois recusou a chamada do Felipão. Tem milhões de jogadores brasileiros no mundo inteiro que sonham ser chamado uma vez só que seja para a seleção. Eu não sei se teria coragem de recusar uma convocação para o Brasil se estivesse no lugar do Diego".