TVs estrangeiras diminuem cobertura da Copa devido aos preços do Brasil

Carolina Juliano

Do UOL, em São Paulo

  • Carolina Juliano/UOL

    Emissoras de TV trabalham na cobertura de jogo da Copa das Confederações, no Mineirão, Belo Horizonte

    Emissoras de TV trabalham na cobertura de jogo da Copa das Confederações, no Mineirão, Belo Horizonte

Emissoras de TV estrangeiras estão tendo que rever seus planos de transmissão da Copa do Mundo de 2014 no Brasil devido aos valores exorbitantes que estão sendo orçados por produtoras brasileiras, hotéis e pelo mercado imobiliário na hora de alugar uma sala para montar o escritório. Algumas estão mesmo desistindo de se estabelecer no país durante o Mundial por considerarem os valores completamente inviáveis.

A reportagem do UOL Esporte ouviu alguns representantes de produtoras brasileiras, que preferiram não se identificar por questões estratégicas, e porque ainda não conseguiram fechar os seus contratos, mas que informam que, não só os estrangeiros estão sendo prejudicados com esse custo elevado, mas também as próprias produtoras brasileiras, porque os clientes não estão fechando contrato pelos valores pedidos.

"A verdade é que muita gente viu na Copa uma oportunidade única de ganhar dinheiro e até de se aposentar, e essas empresas resolveram inflacionar o mercado", diz a fonte de uma das maiores produtoras do Rio de Janeiro. "O Brasil já é mais caro que o resto do mundo por conta dos nossos impostos. Se resolvem cobrar muito acima do normal ainda, fica inviável mesmo".

O caso mais emblemático citado por essa fonte é o de um grande canal inglês, que foi um dos primeiros a fechar um pré-contrato para se estabelecer no Brasil, montar estúdio, trazer apresentadores e equipes para transmitir direto daqui. Há dias, o canal rescindiu contrato e diminuiu em 70% seu trabalho no Brasil. "Resolveram montar o estúdio na Inglaterra mesmo, pois só a montagem aqui custaria US$ 1 milhão. Pagaram a multa rescisória do contrato e agora vão apresentar de lá com alguns links (entrada ao vivo com jornalista) no Brasil, e ainda resolveram trazer equipamento e pessoal próprios", informa a fonte.

Outro caso citado por ela é de uma emissora australiana, que previa a montagem de estúdio de transmissão no Rio de Janeiro, com quatro apresentadores e mais convidados. Isso custaria para eles, na Europa, por exemplo, US$ 200 mil. No Brasil pediram este valor apenas pela locação do imóvel onde seria montado o estúdio. Os australianos também tiveram que mudar de planos.

Impostos e logística

Produtores nacionais informam que a transmissão da Copa no Brasil já teria os custos mais altos do que no resto do mundo porque a carga tributária é muito grande. Segundo fontes consultadas pelo UOL Esporte, o imposto que se paga por esse tipo de serviço chega a 30%. Além disso, a logística dessa Copa do Mundo é muito difícil pelas distâncias a serem percorridas. 

Outra fonte de uma grande produtora sediada em São Paulo cita o caso de um orçamento pedido por uma emissora do Japão. A seleção japonesa vai jogar em Natal e depois segue para Cuiabá num espaço de quatro dias. "Não é possível que a mesma unidade móvel que vai para Natal chegue a tempo e preparada para fazer o jogo de Cuiabá. Isso encarece muito o orçamento porque vamos precisar de dois carros", diz a fonte.

Para fazer um jogo em Manaus, a produtora de São Paulo estima que levaria sete dias para chegar lá com todos equipamentos e para prepará-los. O custo disso é muito alto e não vale a pena para realizar apenas um jogo. Tem seleção que vai viajar milhares de quilômetros entre um jogo e outro. "Os estrangeiros simplesmente não pagam. Eles estão sacrificando a participação deles na cobertura do mundial devido aos preços praticados no Brasil."

Aluguel de meio milhão

Uma das três maiores cadeias de televisão do Golfo Pérsico também não conseguiu ainda fechar contratos para as transmissões no Brasil. Ela solicitou um orçamento grande, para abrir escritório, montar estúdio e se mudar para o Rio de Janeiro no mês da Copa. "Fizemos a pesquisa de locais para eles se alojarem e os valores que estão sendo pedidos no Rio de Janeiro são surreais", diz a fonte da produtora contactada. "Por uma área de 200 m² pediram meio milhão de reais. Tem hotéis cobrando diária de R$ 1 mil. Está todo mundo louco no Brasil e desesperado lá fora."

Outra emissora dos Emirados Árabes contactou profissionais no Brasil para contratar repórter e cinegrafista para transmitir ao vivo o sorteio dos grupos da Copa, realizado em 6 de dezembro na Costa do Sauípe, na Bahia, com mais um link na cidade do Rio de Janeiro. Pediram alguns orçamentos 20 dias antes do evento e desistiram de fazer também por causa dos preços. "No Brasil cobra-se a mais, por exemplo, por um profissional que fala inglês, mas na Europa falar inglês é condição primeira para ser um profissional, não cobra-se por isso", diz um produtor que já trabalhou em cadeias televisivas na Europa e no Golfo Pérsico. "Tudo isso parece absurdo para quem vem de fora fazer televisão aqui."

Na ocasião do sorteio da Copa, as fontes informaram que operadores de câmera que geralmente cobram diária de R$ 150 chegaram a pedir R$ 600, e como no nordeste brasileiro tem menos profissionais do que no sul e sudeste, até emissoras brasileiras tiveram que pagar mais caro para terem o serviço.

Na Argentina é mais barato

Uma outra produtora brasileira com sede em São Paulo, que habitualmente realiza trabalhos para uma das cadeias televisivas mais emblemáticas do mundo na produção de documentários, foi contatada para realizar uma produção sobre a Copa das Confederações de 2013. O programa seria veiculado antes do evento, mas diante do orçamento, o canal desistiu da produção.

Depois disso, o mesmo canal solicitou novo orçamento para realizar um programa sobre a Copa do Mundo. Este seria gravado e transmitido em português e espanhol, para o Brasil e América Latina, sendo que ambos iam ser gravados e produzidos em São Paulo. A multinacional também considerou o valor pedido inviável, mas desta vez não desistiu, foi à Argentina e contratou uma equipe de lá para produzir tudo em Buenos Aires, pois ficava muito mais barato.

"Está caindo a ficha"

A 150 dias do início da Copa do Mundo do Brasil não há praticamente contratos fechados entre produtoras brasileiras e emissoras estrangeiras. Nos próximos dias, quando a Fifa definir e distribuir as credenciais para os profissionais de imprensa, as emissoras terão que definir suas estratégias. Há um ano que as produtoras estão fazendo orçamentos para a Copa e já se observa uma queda nos valores pedidos no mercado. "Acho que está caindo a ficha e as produtoras estão vendo que se não abrirem mão dos altos lucros irão ficar sem cliente", diz a fonte de uma das maiores produtoras do País.

E como Copa do Mundo não é um evento para o qual se possa simplesmente dar as costas, para conseguirem trabalhar no Brasil, os canais internacionais estão se organizando como podem. Uns diminuindo em até 70% os trabalhos em nosso território, outros se retirando mesmo do Brasil, optando por transmitir de seus países, e ainda há vários que estão se unindo, abrindo mão da exclusividade e aceitando dividir equipamentos e até escritórios para não saírem no prejuízo.

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