Decolar e Booking.com fecham hotel para Copa e elevam diária em 4.000%

Aiuri Rebello e Vinicius Konchinski*

Do UOL, em Brasília e no Rio de Janeiro

Um contrato fechado entre dois sites de turismo e um hotel de Cuiabá elevou em 4.000% o preço de diárias durante a Copa do Mundo do 2014. O acordo, firmado entre a Decolar.com, a Booking.com e o Roari Hotel, bloqueou reservas feitas diretamente na hospedaria para dias de jogos do Mundial na capital de Mato Grosso. Turistas foram obrigados a recorrer às páginas da internet para hospedarem-se na cidade. Pelos sites, o custo das diárias passou de R$ 130 para até R$ 6.000.

O esquema foi descoberto pelo Procon de Mato Grosso por meio de uma denúncia encaminhada ao órgão por um jornalista japonês. Dias após o sorteio dos grupos da Copa do Mundo, o jornalista, que pretende acompanhar a seleção de seu país no Brasil, tentou fazer uma reserva online e acabou chocado com o custo da hospedagem em Cuiabá no dia 24 de junho. Neste dia, o Japão enfrentará a Colômbia na Arena Pantanal.

No Decolar.com e no Booking.com, o jornalista do Japão encontrou quartos disponíveis no Roari Hotel, um estabelecimento três estrelas. O preço de cada noite na hospedaria custava de R$ 4.200 a R$ 6.000, dependendo da capacidade do quarto e do nível de conforto.

O cidadão japonês reclamou com um amigo brasileiro, também jornalista, que registrou a queixa no Procon-MT. O órgão resolveu investigar o caso e constatou a diferença. "São quase 4.000% de aumento. Isso não existe", afirmou Gisela Simona, superintendente do Procon-MT, em entrevista ao UOL Esporte. "Não tem nenhum cabimento um turista passar duas noites em Cuiabá e gastar mais de R$ 8.000 só de hotel".

O Procon-MT fez uma pesquisa e constatou que, fora do período da Copa, as diárias no Roari Hotel variam de R$ 130 (quarto simples para uma pessoa) a R$ 350 (quarto para casal com banheira de hidromassagem). Por causa da diferença de preços, o Procon cobrou explicações do hotel.

A administração do Roari Hotel disse que assinou um contrato com a Decolar.com e com a Booking.com para reservar, a preços acordados entre as partes, todos os quartos do hotel no período da Copa do Mundo. Assim, as diárias cobradas seriam responsabilidade da Decolar.com e da Booking.com.

O Procon notificou o hotel e os dois sites. Para evitar a aplicação de uma multa, o Roari Hotel informou ao Procon que desfez o acordo comercial com os portais e as ofertas foram retiradas do ar. Os dois sites de turismo ainda não se manifestaram. 

Segundo Simona, o suposto contrato fechado entre os sites e o hotel é ilegal. De acordo o Artigo 39 do Código de Defesa do Consumidor, o aumento de preços dessa natureza é uma prática abusiva. "Não existe nenhuma justificativa plausível. Um aumento acentuado nos preços em função de uma grande demanda é normal, mas não desse nível". De acordo com o Procon, neste tipo de caso, cabe multa e até a proibição das vendas.

Simona também é presidente da Associação dos Procons. Ela mesmo alertou para todos os órgão de defesa do consumidor das 12 cidades-sede da Copa do Mundo de 2014 para que averiguem se a contratos deste tipo não foram fechados em suas jurisdições. De acordo com Simona, os resultados serão apresentados até o fim do mês em uma reunião. Dentre os menos de 100 hotéis de Cuiabá, apenas no Roari foi constatada a cobrança abusiva na Copa.

Reclamações em redes sociais

Durante o período em que o acordo entre os sites e o Roari Hotel esteve em vigor, turistas que procuravam o hotel para fazer reservas durante o Mundial foram encaminhados para os dois portais. No início da semana passada, inclusive, o assunto foi tema de um post no blog Teoria dos Jogos, de Vinicius Paiva.

Em seu perfil no Twitter, Paiva ainda informou. "Tenho um amigo que foi a Cuiabá este fim de semana, prestar concurso. Hospedou-se no Roari Hotel, e pagou R$ 130 na diária", publicou ele. "Liguei para o hotel, que disse que a @Decolar e a @bookingcom haviam comprado todos os quartos. Reservas pra Copa, só com eles."

"Pois bem, fui ao site da @Decolar e da @bookingcom. Consultei a diária no Roari Hotel, em Cuiabá. Preparem-se para o que vocês vão ler. Tanto @Decolar quanto @bookingcom estão cobrando cinco mil e trezentos reais numa diária que, fim de semana passado, saiu por R$ 130", complementou Paiva.

Na quarta-feira o UOL Esporte realizou uma busca nos dois portais de vendas. Para este sábado, nos dois portais, as diárias no Roari ficavam entre R$ 130 e R$ 180. Para qualquer um dos quatro dias que a Cuiabá receberá jogos da primeira fase da Copa, em junho, no Decolar.com as "ofertas" haviam sido retiradas do ar. Já no Booking.com, o valor oferecido era realmente de R$ 4.200 a R$ 6.000. Em uma nova busca no dia seguinte, as ofertas já não estavam mais no ar.

Procurada pelo UOL Esporte, a Decolar.com negou ter fechado qualquer tipo de acordo com o Roari Hotel para a Copa do Mundo. Apesar de o Procon-MT ter notificado o Roari justamente por causa da reserva de vagas, a empresa negou a prática e informou que "apenas repassa ao consumidor as informações das próprias redes hoteleiras". Por causa disso, segundo a Decolar.com, o preço das reservas oferecidas em seu site "exatamente o informado e determinado pelo hotel".

"Por fim, vale destacar que a empresa tem atuado junto aos representes de hotéis no Brasil a fim de promover uma maior oferta de hospedagem em sua plataforma de Hotéis Decolar.com, contudo sem se valer de reservas antecipadas", complementou a empresa, em nota enviada à reportagem na quinta-feira.

A Booking.com.br também foi procurada. A empresa não respondeu.

Já o Roari Hotel, inicialmente, informou à reportagem que não havia fechado qualquer tipo de acordo com os sites de turismo para a Copa. Depois que o Procon-MT divulgou a notificação contra o hotel, contudo, ele informou que já deu todos os esclarecimentos necessários às autoridades e que não tinha interesse em se pronunciar sobre o assunto.

Atualmente, o Roari Hotel não aceita reservas para seus 65 quartos para a Copa do Mundo. Segundo a recepção do hotel, a tabela de preços de diárias é válida até o final de fevereiro. Como não há uma previsão sobre quanto custará o poso em um quarto durante o Mundial, o Roari prefere não se comprometer com clientes por ora.

Controle do governo

A Senacom (Secretaria Nacional do Consumidor), do Ministério da Justiça, também foi procurada. Informou que realiza, em parceira com o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), uma pesquisa mensal de acompanhamento dos preços das tarifas dos hotéis nas 12 cidades-sede da Copa.

De acordo com a secretaria, por meio de sua assessoria de imprensa, se for constata uma evolução de preços abusiva nas diárias cobradas nas sedes do Mundial no período da competição, o governo irá agir com multas, processos no Cade por formação de cartel e até a proibição da venda dos serviços. Segundo o órgão, essa denúncia de abuso em Cuiabá ainda não chegou ao Senacom, mas será investigada.

Questinado sobre a atuação do comitê interministerial criado em outubro para acompanhar eventuais abusos de preço durante a Copa, o Ministério da Justiça disse que "em novembro a Senacon notificou as principais associações e redes hoteleiras para prestarem esclarecimentos sobre os valores dos hotéis para a Copa. A secretaria ainda solicitou os preços médios das diárias que serão cobradas nas cidades-sede durante outros eventos". Não há resultado disso.

Sobre as passagens aéreas, a Senacom reafirma que em uma reunião do comitê com as companhias aéreas em novembro ficou definido que até janeiro seria definida uma grade especial de vôos durante a Copa, o que ajudaria a evitar abusos.

*Atualizada às 9h55

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