De olho no cofre

Duas empresas deixam construção do estádio de Cuiabá, e obra corre risco de não ficar pronta

Aiuri Rebello e Vinícius Segalla

Do UOL, em Cuiabá

  • Aiuri Rebello/UOL

    Uma das empresas da Arena Pantanal abandonou a obra acusando o consórcio responsável de calote

    Uma das empresas da Arena Pantanal abandonou a obra acusando o consórcio responsável de calote

As obras da Arena Pantanal, em Cuiabá, correm risco de não ficar prontas a tempo da Copa do Mundo de 2014 após duas construtoras que tocavam o projeto abandonarem a empreitada, na semana passada. Agora, a empreiteira responsável que sobrou terá que triplicar sozinha o ritmo em que segue atualmente a construção para conseguir entregar o estádio dentro do prazo, em outubro deste ano.

Beirando a falência, a construtora Santa Bárbara Engenharia SA, líder do consórcio Santa Bárbara-Mendes Júnior, responsável pelo projeto, está deixando os trabalhos para serem tocados apenas pela construtora Mendes Júnior e suas subempreiteiras contratadas. Uma delas, a responsável pela montagem das estruturas metálicas do estádio, deixou a obra após ter ficado oito meses sem receber por seus trabalhos.

A saída da construtora líder do consórcio ainda não foi anunciada. Tanto as empreiteiras envolvidas quanto o governo do Estado de Mato Grosso (que banca a obra) não negam nem confirmam o abandono, dizem apenas que a saída da Santa Bárbara não muda a situação do contrato entre o poder público e o consórcio. A informação, porém, foi confirmada ao UOL Esporte por membros da Rede de Controle (grupo formado por promotores, procuradores e membros de tribunais de contas que acompanha as obras da Copa), funcionários da obra e empreiteiros que preferiram manter anonimato.

A conclusão da Arena Pantanal, a um custo de R$ 519 milhões e prevista para outubro desde ano, não será tarefa fácil. Desde que começou, em maio de 2010, até o final de fevereiro deste ano, a obra atingiu 62% de conclusão. Ou seja, o avanço em 34 meses se deu ao ritmo de 1,82% ao mês, em média. Assim, para a empreitada ser levada a cabo dentro do prazo, o ritmo dos trabalhos terá que ser triplicado, e a construção deverá andar a 5,48% ao mês em média.

A Arena Pantanal começou a ser construída em maio de 2010 - a primeira entre todas as 12 que serão usadas na Copa do Mundo. A previsão inicial era que ela estivesse concluída em dezembro de 2012. Não ocorreu. Em julho de 2012, o estádio tinha 46% de suas obras concluídas. Naquele mês, o governo de Mato Grosso assinou um aditivo ao contrato e estendeu o prazo de entrega até outubro deste ano.

O custo inicial previsto pelo governo de Mato Grosso era de R$ 342 milhões. Atualmente, está em R$ 519 milhões (aumento de 51%). A assessoria de comunicação do consórcio construtor, porém, informou ao UOL Esporte que, em breve, um terceiro turno de trabalho terá que ser criado para que a obra possa ser entregue a tempo, o que significa uma nova repactuação contratual, com mais um aumento de custo.

Hoje, de acordo com o consórcio, cerca de 800 operários se revezam em dois turnos no canteiro de construção do estádio. Apesar disso, o UOL Esporte presenciou o momento do encerramento de um turno de trabalho no final da tarde do último sábado (9) e não havia mais que 50 operários deixando a construção. Além disso, operários disseram à reportagem que os funcionários da Santa Bárbara não trabalham mais no local.


Beirando a falência

Com problemas na Justiça e uma dívida de R$ 543 milhões, conforme relevou o UOL Esporte, a Santa Bárbara está em processo de recuperação judicial e beira a falência. Além disso, parte do dinheiro que entra no caixa da empreiteira, depositado pelo governo estadual de Mato Grosso para ser utilizado na Arena Pantanal, segue outro caminho: o pagamento de dívidas da Santa Bárbara com outros credores.

Pesa sobre a Santa Bárbara uma série de bloqueios de valores autorizados judicialmente: a uma empresa chamada BK Transportes e Serviços, a empreiteira deve R$ 272 mil. Já à Topázio Inspeções tem R$ 908 mil a receber, enquanto outros R$ 5,24 milhões devem ser pagos à Mills Estruturas de Serviços e Engenharia.

Dessa forma, recursos da Secopa-MT (Secretaria Extraordinária para a Copa de Mato Grosso) transferidos ao Consórcio Santa Bárbara Mendes Júnior para pagar o estádio são sequestrados pela Justiça desde o ano passado, conforme também revelou o UOL Esporte, em agosto do ano passado. De acordo com empresários do setor de construção civil em Cuiabá, a saída da construtora da empreitada é uma manobra para que o dinheiro do governo de Mato Grosso volte a ficar na obra e não vá para cobrir dívidas anteriores da Santa Bárbara.

O Consórcio Santa Bárbara-Mendes Júnior não se pronuncia sobre a situação. A reportagem do UOL Esporte não foi autorizada a entrar no canteiro de obras da Arena Pantanal, mas o atraso é visível mesmo do lado de fora. Em alguns locais do entorno do estádio, o terreno ainda não foi sequer aplainado. A superestrutura das arquibancadas é a única parte pronta. A estrutura metálica que envolverá todo o estádio não está na metade e, na semana passada, causou a paralisação das obras e virou caso de polícia.

  • Aiuri Rebello/UOL

    As placas informativas da obra Arena Pantanal trazem protestos da população e ainda informam a Santa Bárbara como uma das empreiteiras participantes


Caso de polícia

A Loyman Assessoria e Montagem Industrial Ltda, contratada pelo consórcio para montar a estrutura metálica do estádio, retirou no início da semana passada os seis guindastes e os funcionários que mantinha no canteiro de obras da Arena Pantanal. À imprensa cuiabana, o dono da empresa, Ibê Loyola Júnior, chegou a dizer que não aguentava mais, pois estava havia mais de oito meses sem receber pelo serviço prestado.

Esgotado financeira e emocionalmente, o empresário decidiu tirar seus equipamentos do canteiro, mas foi barrado pelos seguranças da Santa Bárbara e da Mendes Júnior. A polícia foi chamada e um boletim de ocorrência foi lavrado. Os guindastes lá permaneceram até que um distrato entre a Loyman e o consórcio fosse assinado. O caso mexeu com a saúde de Ibê Loyola Junior, que deixou Cuiabá para um período de descanso no interior do Rio Grande do Sul.

A Santa Bárbara e a Mendes Júnior negaram que vinham atrasando pagamentos e ainda colocaram toda a culpa na empresa que abandonou a obra. "O Consórcio Santa Bárbara/Mendes Júnior afirma que as acusações de inadimplência feitas em desfavor deste Consórcio pela empresa Loyman - Assessoria e Assistência Técnica Ltda não procedem e que, inclusive, a referida empresa abandonou, de maneira injustificada, o canteiro de obras, motivo pelo qual todas as medidas legais cabíveis serão rigorosamente adotadas por este Consórcio˜, disse, em nota, o consórcio.

"O Consórcio esclarece ainda que a situação gerada pela Loyman - Assessoria e Assistência Técnica Ltda já foi contornada, sendo que um novo fornecedor dará regular continuidade à execução dos trabalhos˜. Apesar disso, até domingo (10) a montagem da estrutura metálica não havia sido retomada.

Já com a ameaça de processo posta na mesa, a Loyman enviou ao UOL Esporte uma nota tentando amenizar a gravidade do problema e sem informar qual o tamanho da dívida do consórcio com a empresa. "Ocorreu desacordo comercial, motivado pelo não cumprimento contratual do contratante (Consórcio Santa Bárbara Mendes Júnior). (…) Esclarecemos ainda que a decisão da saída do canteiro da obra foi tomada de comum acordo entre as partes envolvidas˜, diz o comunicado da Loyman.

Obras na Arena Pantanal
Obras na Arena Pantanal


Sem resposta

O UOL Esporte solicitou entrevista com responsáveis pelo consórcio da Arena Pantanal, com dirigentes da  Santa Bárbara Engenharia SA e com o secretário Maurício Guimarães, titular da Secopa-MT, mas os pedidos não foram atendidos. O promotor do núcleo de defesa do patrimônio público do Ministério Público de Mato Grosso, Clóvis de Almeida Júnior, informou à reportagem que o próprio Maurício Guimarães informou-lhe da saída da Santa Bárbara da empreitada. Já o consórcio não quis se manifestar sobre o assunto.

Questionada sobre o motivo da Santa Bárbara deixar o consórcio, qual a parte que cabia à construtora na obra, se haveria atraso na entrega ou aumento de custo, a Secopa-MT, através de sua assessoria de imprensa, foi lacônica. "Informamos que não há nenhuma alteração do contrato entre o consórcio construtor da Arena Pantanal e a Secopa".

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