Contrato de São Paulo com Fifa desrespeita lei de licitações e beneficia patrocinadores da Copa

Rodrigo Mattos

Do UOL, em São Paulo

  • Divulgação/Odebrecht

    Futuro estádio do Corinthians e sede do jogo de abertura da Copa de 2014, o Itaquerão já tem 55% dos trabalhos concluídos (6/11/12)

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O contrato entre a cidade de São Paulo, a Fifa e o COL (Comitê Organizador Local) para a Copa-2014 desrespeita as regras de licitação ao dar preferência a patrocinadores do Mundial em contratações públicas. O documento refere-se a produtos e serviços para a montagem de um escritório para as entidades que será bancado com dinheiro público.

A Secretaria de Copa de São Paulo, a Fifa e o COL negaram que o objetivo do acordo seja burlar as leis de licitação, e disseram que serão feitas concorrências para essas contratações.

O acordo entre a capital paulista e os organizadores do Mundial foi tornado público após ação do Ministério Público Estadual. São 23 páginas, em sua versão em inglês, que estabelecem as obrigações da prefeitura para sediar a Copa. Foi assinado em 2011 pelo prefeito paulistano, Gilberto Kassab, pelo secretário geral da Fifa, Jérôme Valcke, e pelo ex-presidente do COL Ricardo Teixeira.

Seus termos são similares aos firmados pelas outras 11 cidades sede da Copa do Mundo. Tanto que a prefeitura paulistana confirmou que são contratados de adesão, sem modificações em cada sede. Ou seja, as outras cidades também terão de dar preferência a patrocinadores da Fifa em contratações públicas.

No contrato paulistano do Mundial, a cláusula 18 estabelece que o município providencie um escritório para o COL. Entre os produtos a serem fornecidos, estão linhas telefônicas, equipamento de escritório, conectividade de internet, alimentos e bebidas.

Na tradução em português, o item 18.2 diz: "Conforme o equipamento de escritório (incluindo equipamentos de distribuição de alimentos e bebidas) a ser fornecido pela cidade sede ao COL, sob a requisição da Fifa, cair dentro da categoria de produtos de qualquer das Afiliadas Comerciais [da Fifa], a cidade sede deverá usar de esforços razoáveis para adquirir todos esses produtos das Afiliadas Comerciais relevantes."

Isso significa que a prefeitura de São Paulo tem que dar preferência, por exemplo, a computadores da Sony, patrocinadora da Fifa, para a parte de tecnologia do escritório. A Coca-Cola deve ter vantagem na venda de suas bebidas à prefeitura.

O problema é que a Lei de Licitações, no seu artigo 3º, veta qualquer tipo de preferência em contratações públicas. A concorrência só pode ser dispensada em caso de valores até R$ 8 mil ou quando apenas uma empresa puder fornecer determinado produto ou serviço, o que não é o caso.

Dois advogados especialistas em direito administrativos ouvidos pelo UOL Esporte disseram que nenhuma legislação embasa a preferência em contratações nesses casos. 

"Pela lei de licitação, não pode", afirmou o advogado Luiz Eduardo Netto. "Agora, pode haver uma justificativa se a prefeitura disser que é a única forma de fazer valer o contrato e sediar a Copa."

O outro advogado, que não quis se identificar, afirmou não ver nenhuma brecha jurídica para a prefeitura paulistana contratar patrocinadores da Copa. Lembrou que nenhum deles tem produtos específicos que não possam ser fornecidos por concorrentes, o que levaria à dispensa de licitação.

Mas há ainda a possibilidade de a prefeitura ignorar os parceiros da Fifa, pois o contrato não estabelece uma obrigação, mas um esforço para contratá-los.

Não é a primeira vez que a Fifa tenta direcionar contratações públicas para favorecer seus patrocinadores. A "Folha de S. Paulo" revelou que a entidade fez lobby para que seus parceiros fossem favorecidos pelas cidades sede.

Pela cláusula 33 do contrato, a prefeitura de São Paulo ainda garante que não há restrições ou conflitos que impeçam a execução do acordo.

A Secretaria de Copa de São Paulo afirmou que ainda não fez contratações públicas para o escritório e promete seguir a lei de licitações. "A Prefeitura esclarece que o "Host City Agreement" é um contrato de adesão — um contrato-padrão — assinado pelas 12 cidades-sede da Copa do Mundo de 2014. Sua cláusula 18.2 não foi objeto de execução e, se o for, seguirá estritamente a Lei 8666/93 (Lei de Licitações)", explicou a assessoria da secretaria.

A Fifa e o COL também negaram que seu objetivo seja desrespeitar as leis de concorrências públicas brasileiras. E afirmaram que incentivam as sedes a fazerem concorrências públicas para as compras relacionadas ao Mundial.

"A Fifa e o COL respeitam as legislações locais e quando se trata de aquisição não vão interferir nos processos da cidade-sede. Como você mencionou, o termo [do contrato] simplesmente significa dar acesso justo onde possível aos produtos dos Afiliados Comerciais de acordo com a legislação local e preços competitivos", explicou a assessoria do COL e da Fifa.

Eles ainda acrescentaram que os patrocinadores vão fornecer valores extras com produtos como telas de televisão e carros para as equipes das sedes da Copa. 

 

 

 

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