Há 50 anos, Garrincha virava Pelé e dava ao Brasil o bi na Copa do Mundo
Roberto Pereira de Souza
Do UOL, em São Paulo
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Acervo UH/Folhapress
Mané Garrincha corre para abraçar Amarildo após gol durante a Copa de 1962, no Chile.
O ex-jogador Zito estará no Chile neste domingo em companhia do presidente da CBF (Confederação Brasileira de Futebol), José Maria Marin, para participar da festa pelo 50º aniversário do título da Copa do Mundo de 1962, que valeu o bicampeonato mundial ao Brasil. Foi o Mundial em que Garrincha jogou por ele e por Pelé para salvar a honra da seleção. Pelé se machucou no segundo jogo e não entrou mais em campo naquele Mundial.
Foi também o Mundial em que Garrincha foi expulso na semifinal e não cumpriu suspensão automática porque a súmula e o juiz peruano Arturo Yamazaki desapareceram de Santiago, junto com o bandeirinha Esteban Marino.
Fora os problemas, a expectativa para o Mundial de 62 começou a ser alimentada quatro antes, na Copa da Suécia.
Em 1958, um adolescente com a camisa 10 chamou a atenção do mundo por sua habilidade e ousadia com a bolas nos pés, driblando em velocidade, parando ou aplicando lençóis dentro da área inimiga: era a primeiro capítulo da fama do Rei Pelé, que seria eleito o Atleta do Século 20.
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O Maracanã completou 62 anos no último sábado em meio a um processo de transformação. Em obras para a Copa de 2014, o estádio está ganhando uma nova arquibancada, cobertura e seu entorno será revitalizado. Essa modernização, porém, é um problema para um grupo de moradores que há seis anos habita um terreno colado ao estádio.
Os prejudicados são cerca de 20 índios da Aldeia Maracanã, que terão de deixar suas casas por causa da reforma do estádio. Eles vivem na área onde, anos atrás, funcionou o Museu do Índio, que também deve ser demolido por causa das obras.
Quem ouviu falar do Mundial de 58, sabia que o Brasil era o candidato natural ao título de 62.
E, a julgar pelo volume de jogo demonstrado durante um treino em Viña del Mar contra o Everton, da primeira divisão chilena, o Brasil era mesmo o franco favorito ao título no terceiro mundial realizado na América do Sul (após Uruguai-1930 e Brasil-1950). Os críticos viam Pelé como a grande arma brasileira no ataque e tinham motivos para isso.
O jogo-treino contra o Everton, três dias antes da estreia contra o México, passou um recado completo aos adversários. O estádio Sausalito estava lotado com 15 mil torcedores que tiveram dificuldade para contar e somar todos os dez gols marcados, na goleada de 9 a 1: Pelé, Vavá, Amarildo e Zagalo marcaram dois gols cada um e Jair fechou o massacre de maneira impiedosa.
Animado, o técnico Aimoré Moreira fez a lista dos homens que entrariam em campo contra o México: Gilmar, Djalma Santos, Mauro, Zózimo e Nilton Santos; Zito e Didi; Garrincha, Pelé, Vavá e Zagalo.
A estreia foi dura contra um grupo de mexicanos dispostos a tudo para impedir as jogadas de estilo do time de Aimoré Moreira. Mas o talento venceu a força: Pelé marcou o dele e Zagalo, de peixinho, fez o segundo gol na vitória por 2 a 0. O México poderia ter saído na frente no primeiro tempo, mas desperdiçou quatro oportunidades.
Pelé serviu Zagalo com um cruzamento para área. Depois, Pelé fez o que faria muitas vezes em sua carreira: destruiu a marcação de três mexicanos, entrou na área e fez valer a fama de matador.
Mas o pior estava por vir. Foram os últimos lances bonitos de Pelé na Copa de 62: no segundo jogo, ele sofreria uma contusão muscular no primeiro tempo contra a então Tchecoslováquia e não jogaria mais até o final da competição. Abatido com a lesão de Pelé, o Brasil empatou sem gols.
Mas o melhor estava por vir. Mergulhado em dúvidas, o técnico Aimoré Moreira não poderia afirmar como o time se comportaria na Copa sem sua maior estrela, tendo que escalar Amarildo no lugar de Pelé. Mas se o assunto era brilho de estrela, Garrincha costumava se encarregar do tema. E foi o que aconteceu: Garrincha virou Pelé quando a seleção mais precisava dessa metamorfose.
A prova de malabarismo para Garrincha estava marcada: 11 de junho, contra a Inglaterra. Ao final, os cerca de 17 mil torcedores presentes ao estádio ficaram perplexos com as diabruras do ponta direita, pulverizando e humilhando a marcação inglesa, com dribles de corpo, cortes para a esquerda e alto aproveitamento na área.
O goleiro Ron Springet deve ter tido pesadelos com Garrincha nas semanas seguintes à eliminação da Inglaterra, nas quartas de final. Ele tinha motivos para delirar com o brasileiro de pernas tortas, que marcou um gol de cabeça, chutou uma falta com muita violência e o rebote caiu nos pés de Vavá para fazer o segundo. Para finalizar, o endiabrado Garrincha ainda chutou em curva para marcar o terceiro na vitória de 3 a 1, na despedida de Viña del Mar.
Expulso na semi, Garrincha jogou a final
A emoção se misturou à confusão na semifinal contra o Chile. Garrincha mais uma vez foi o homem do jogo, mas desta vez como herói e como vilão: marcou dois gols na goleada por 4 a 2, mas acabou expulso no final da partida. Os outros dois gols foram marcados por Vavá e Amarildo.
O bizarro tomou conta da Copa do Mundo porque o brasileiro deveria ter sido suspenso da final contra a Tchecoslováquia. Mas a súmula do jogo desapareceu. Pior que isso: o árbritro peruano Arturo Yamazaki foi colocado em um voo fretado às pressas e deixou Santiago às escondidas.
Por trás dessa operação para salvar o Brasil na final estavam dois cartolas "experientes". O presidente da CBD (antecessora da CBF), João Havelange e o fiel secretário Mozart Giorgio, que passou 30 anos como chefe administrativo do futebol no País.
Antes de morrer, no final dos anos 1990, Mozart confessou o que havia feito: "Fretei um avião e mandei o bandeirinha Esteban Marino para o Paraguai e a súmula desapareceu junto com o juiz Yamazaki. Fim da história". O fato nunca foi confirmado pela CBD nem pela CBF. Mas Garrincha não foi suspenso.
Veio a final contra a Tchecoslováquia e o Brasil tinha Garrincha, aparentemente perturbado com a polêmica sobre sua expulsão. O Brasil venceu por 3 a 1 com gols de Zito, Amarildo e Vavá. Até momentos antes da partida, falava-se que Pelé jogaria para garantir a vitória. Não houve necessidade para tanto sacrifício: os outros craques se encarregaram do trabalho.
Os 50 anos do bicampeonato serão comemorados em São Paulo, a partir do dia 25 de junho, no Memorial da América Latina (zona Oeste de São Paulo). O evento, que terá exposição de fotos e exibição de filmes, é organizado pelo Ministério do Esporte junto com a Confederação Brasileira de Futebol.
Marcelo Neves, filho do goleiro bicampeão,Gilmar, vai celebrar também outra conquista: a aposentadoria dos jogadores das seleções de futebol que ganharam os títulos mundiais em 58, 62 e 70. A Lei Geral da Copa fixou uma pensão pelo teto do INSS a todos participantes (incluindo familiares dos mortos). A lei fixou ainda um prêmio de R$ 100 mil.
"Pode ser bonito juntar todos os campeões no mesmo evento. Vamos tentar", disse Marcelo Neves, que é presidente da Associação dos campeões de futebol no Brasil, em entrevista em Brasília.
Para Pepe, "o canhão da Vila", bicampeão em 58 e 62, a pensão é merecida. "Afinal de contas, fizemos um trabalho bonito em nome do país. O prêmio dá tranquilidade para nossa "parte final", pois estamos todos próximos dos 80 anos. O dinheiro ajuda, principalmente, os colegas que estão doentes", disse o ex-jogador santista.