13/07/2010 - 07h00

Eleito por 'notáveis', logo da Copa 2014 gera polêmica entre leigos e especialistas

Flavia Perin
Em São Paulo

Assim como a escalação de Dunga, o logo da Copa de 2014, que será sediada no Brasil, já nasceu polêmico. Lançado oficialmente em evento realizado na África do Sul na última quinta-feira (8), o desenho tem levantado dúvidas em relação às suas referências e aos critérios de escolha, e virou piada instantânea no Twitter, onde se espalhou a comparação da marca com a silhueta do líder espírita Chico Xavier.

A MARCA EM QUESTÃO

  • Reprodução

    Logo oficial foi apresentado em evento realizado na África do Sul

  • Reprodução

    Internautas comparam o desenho ao retrato de Chico Xavier

Verde, amarelo e vermelho, o logo criado pela agência Africa foi apresentado como uma representação estilizada da taça da Copa do Mundo, encoberta por três mãos que se entrelaçam. A escolha coube a uma equipe de “notáveis”, formada por Ivete Sangalo, Gisele Bündchen, Paulo Coelho, Hans Donner e Oscar Niemeyer, além do presidente da CBF e do Comitê Organizador Local da Copa (COL), Ricardo Teixeira, e do secretário da Fifa, Jérome Valcke.

No vídeo exibido na cerimônia de lançamento, o presidente da CBF e do COL afirmou que o logo “prepara para o Mundial”. “Ao olhar para ele, ninguém vai imaginar outra coisa que não seja a Copa do Mundo no Brasil.”

Outras seis imagens fizeram parte da votação, todas sugeridas por agências de publicidade. A campeã comemora no Facebook: “A agência Africa está em festa. O logo da Copa do Mundo de 2014, q vai acontecer no Brasil, foi criada por nós. Demais. [sic]”.

Patrocinadora oficial do evento, a Adidas confeccionou mais de mil camisetas com a marca estampada, que serão colocadas à venda em sites e lojas.

Designers foram excluídos pela Fifa

A Associação dos Designers Gráficos (ADG), que a princípio faria parte da seleção, publicou em seu site nota em que declara ter sido excluída pela Fifa do processo – “ADG aguarda esclarecimentos da Fifa sobre a marca da Copa 2014”.

Professora do curso de Design da FAU-USP, Priscila Farias conta que quando viu o logo pela primeira vez achou que se tratava de uma brincadeira. Para ela, a ideia de utilizar formas que lembram mãos não é ruim. “Mas as formas estão terrivelmente mal resolvidas, e isso faz com que a figura, como um todo, pareça fraca, transmitindo a sensação de um desenho improvisado e pouco profissional, um tanto infantil e ingênuo, ao mesmo tempo sem a graça de um desenho de criança, ou a espontaneidade de algo genuinamente naif”, diz.

ESPECIALISTAS QUESTIONAM

  • Leo Crecenti

    Priscila Farias achou que se tratava de uma brincadeira

  • Divulgação

    Para o designer Muti Randolph, 'um gesto de tristeza e vergonha'

Em sua análise, ela revela: “Uma coisa que me incomoda especialmente é a absoluta falta de controle dos espaços brancos internos. Os números que compõem o ano ficam a meio caminho, entre um tratamento geométrico ou orgânico, e o 2 é tão mal resolvido que parece um Z. Na redução, o 4 fica muito similar ao A de ‘Brasil’, e, no lugar de 2014, lemos ‘ZOIA’.”

Priscila ainda destaca que as letras da palavra Brasil misturam caixas alta e baixa sem critério aparente, fugindo à norma culta (a letra A aparece em caixa alta no meio da palavra, e o L fica entre maiúscula e minúscula). “Mesmo assim, com uma rigidez que não é a das escritas populares – se é que a intenção era simular uma escrita popular ou vernacular –, sugerindo que o design foi resolvido por alguém que não entende muito de tipografia”, observa.

Taça e Jabulani: referências negativas?

Também controversa, a primeira impressão do designer Muti Randolph ao ver o desenho – compartilhada por outros artistas gráficos, como Alexandre Wollner – foi de uma mão levada ao rosto “num gesto de tristeza e vergonha”. “Por perder a Copa de novo em casa?”

Randolph diz, numa rápida reflexão, que o logo pode remeter à ideia de “todo mundo metendo a mão na Copa”. “Temo que tenham feito uma marca não muito bem desenhada, mas apropriada a esta interpretação: se tomarmos por medida a falta de transparência e o resultado deste processo, devemos temer por todos os outros desta Copa, da formação da comissão técnica à construção e reforma dos estádios”, considera.

O designer questiona, ainda, o uso da cor vermelha – “Seria influência africana?”. Sobre a fonte de inspiração da marca, Randolph denomina o atual troféu Fifa como “uma aberração grotesca dos anos 70 que substituiu a clássica e linda art déco Jules Rimet”.

Ele recorda que, conquistado definitivamente pelo Brasil em 1970, o troféu foi roubado e nunca mais encontrado (cogita-se que tenha sido derretido). “Se o Brasil ganhar o hexa, alguém bem poderia repetir o feito e transformar as figuras disformes (que já parecem derreter) em barras de ouro. Estariam fazendo um favor à estética”, alfineta.

Já o artista plástico Marcius Galan recorre à Jabulani para traçar seu raciocínio. “Acabamos de passar por uma Copa onde a bola, um objeto com função determinante para o bom andamento dos jogos, era ruim. Isso foi notado nos primeiros treinos e mesmo assim, como já haviam sido fechados os contratos, os jogadores tiveram que se calar.”

Para ele, este é apenas um exemplo “de como o que está em jogo não é o jogo”. “Então eu não esperaria o logo da Copa no Brasil nascendo de uma pesquisa séria. Se é melhor para a campanha que a Gisele eleja o melhor logo, esse será o melhor e ponto. O resto é uma questão de gosto”, constata Galan.

“E, falando de gosto, acho até bonitinho, meio ingênuo, meio retrô. Poderia ter sido muito pior.”
 

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