Após o anúncio dos convocados para a Copa, Dunga falou sobre ditadura e escravidão em coletiva
As declarações do técnico da seleção brasileira, Dunga, sobre a ditadura militar e a escravidão foram relevadas por acadêmicos ouvidos pela Folha de S.Paulo.
Na entrevista dada na terça-feira no Rio, após o anúncio dos jogadores convocados para a Copa da África do Sul, o treinador disse que não poderia dar sua opinião sobre a ditadura e a escravidão porque não viveu os dois períodos históricos.
"Quem esteve lá, quem sofreu, esse sim pode dar opinião. Eu não posso dizer que a ditadura era boa, era ruim, [se] eu quero que volte. Só quem viveu é que pode nos dar a resposta", disse o comandante do time.
O economista Marcelo Paixão, professor da UFRJ e autor de estudos sobre racismo, classifica a fala do técnico como lamentável, mas atribui a declaração ao "calor do momento".
"O Dunga não é uma pessoa muito retórica. Ao contrário, é uma pessoa meio bronca. É uma frase tão lamentável que não vou nem levar a sério".
Antes da fala sobre escravidão e ditadura, Dunga havia dito ter realizado um dos maiores sonhos da sua vida ao visitar Nelson Mandela, no início do ano, na África do Sul. "Disseram que ‘o Dunga quer voltar com o apartheid’. Olha só que coisa feia, que coisa suja. Como é que alguém pode falar isso?", contou o treinador.
Para o cientista político Fábio Wanderley Reis, as declarações sobre ditadura militar e escravidão revelam "pobreza de espírito" do técnico da seleção. "É lamentável que um sujeito que vá dirigir a seleção na África tenha uma postura dessas, infantil, tosca", disse Reis.
Frade franciscano e ativista do movimento negro, Frei David diz que Dunga foi vítima de seu próprio desconhecimento e deve procurar cursos para conhecer a história do povo negro. "É uma omissão que não pode acontecer com alguém que está no cargo dele. Ele não tem o direito de ficar indiferente à história de seu povo. Ele pode não ser negro, mas nasceu em um país no qual a maior parte da população é negra".
Para o historiador Manolo Florentino, professor de história na Universidade Federal do Rio, o treinador foi mais cuidadoso que muito professor. "Há precedentes na academia para essas besteiras. Já vi professor na televisão falando que não viveu determinada época e dava sua opinião", declarou Florentino, organizador de "Tráfico, Cativeiro e Liberdade".
O escritor e historiador Joel Rufino dos Santos afirmou que as declarações de Dunga refletem "ignorância e não reacionarismo, maldade".
"Sem querer, em sua ignorância, ele [Dunga] tem alguma razão, porque a gente não estuda história para julgar o passado, dizer se foi bom ou mau, mas para compreender como a sociedade funciona. Ele não compreendeu o que foi a ditadura, o apartheid, a escravidão, ele não compreendeu nada".
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