Fartura de técnicos argentinos pelo mundo contrasta com cenário brasileiro
Danilo Valentini
Do UOL, em São Paulo
Brasil e Argentina saíram da Copa do Mundo de 2014 carregados de incertezas. O fim do torneio foi bem diferente para os dois rivais, mas o cenário de incerteza para o próximo mundial é parecido, com incertezas sobre a força da geração atual de jogadores e caminhos a serem tomados na renovação do elenco. Para os argentinos, porém, uma questão não parece tão problemática: o técnico. A quantidade de profissionais com trabalhos consistentes dão à federação local opções caseiras bem melhores do que a CBF tem em mãos para a escolha de um novo comandante.
Mesmo saindo do Brasil como vice-campeã, após uma decisão parelha contra a Alemanha, a Argentina já sabe que será muito difícil dar continuidade ao trabalho bem feito executado desde 2011 por Alejandro Sabella. O técnico ainda faz mistério, dizendo que prefere tirar férias antes de definir seu futuro, mas até seu agente, Eugenio López, já fala abertamente aos veículos de comunicação argentinos que seu cliente encerrou seu trabalho pela seleção. Uma situação que já fez os rumores sobre um sucessor começar a ganhar força nesta terça-feira (15).
Gerardo Martino, técnico do Paraguai na Copa de 2010 e que, na última temporada, comandou o poderosíssimo Barcelona, foi até agora o nome citado de maneira mais contundente pela imprensa argentina para assumir a vaga de Sabella. O cardápio que a Associação de Futebol da Argentina (AFA) tem em mãos, porém, é variado. Quer alguém que tenha vencido na América do Sul? Tem. Técnico que provou ser capaz de fazer muito com pouco material humano, como na Ásia? Tem. E nomes comprovadamente vencedores no competitivo futebol da Europa? Tem, também.
Leque de opções que falta para a Confederação Brasileira de Futebol para estudar o melhor substituto para Luiz Felipe Scolari. Com isso, brasileiros já sondam estrangeiros para a posição. Um argentino, o próprio Alejandro Sabella, já apareceu como suposto candidato, Assim como o português José Mourinho e o chileno Manuel Pellegrini.
Momentos diferentes
Há, atualmente, pelo menos sete técnicos argentinos em posição de destaque no futebol internacional - sem contar um semifinalista de Libertadores por um clube local (San Lorenzo) e um profissional prestes a iniciar seu trabalho por uma equipe brasileira (Palmeiras).
Já os técnicos brasileiros mais importantes dos últimos não vivem o melhor momento de suas carreiras. Tite está afastado desde dezembro do ano passado, quando encerrou sua passagem pelo Corinthians com forte pressão por não repetir, em 2013, o extremo sucesso vivido um ano antes, quando fez da equipe campeã sul-americana e mundial. Muricy Ramalho emendou três títulos brasileiros seguidos entre 2006 e 2008 (pelo São Paulo), mas vive altos e baixos desde então, oscilando entre demissão do Palmeiras e o título brasileiro pelo Fluminense em 2010, a conquista da Libertadores pelo Santos e a desmoralizante derrota por 4 a 0 para o Barcelona, no final do Mundial de Clubes da Fifa, em 2011, e resultados pouco produtivos desde que voltou ao São Paulo.
Internacionalmente, o quadro é mais grave: Cuca é um dos poucos técnicos brasileiros a trabalhar no exterior atualmente (pelo desconhecido Shandong Luneng, da China), Zico, que já foi um nome de destaque lá fora, está desempregado desde sua demissão do Al-Gharafa, do Catar, Leonardo está fora do mercado desde que deixou o cargo de diretor esportivo do Paris Saint Germain. Ricardo Gomes, que teve destaque na França, está longe do futebol europeu há cinco anos, quando encerrou sua passagem como técnico de Bordeaux e Monaco – além disso, sua trajetória no banco de reservas foi interrompida em 2011, após sofrer um AVC durante um jogo do Vasco, clube no qual voltaria a trabalhar, até o início deste ano, como diretor técnico.
Enquanto isso, a Copa do Mundo revelou o alto nível do trabalho argentino. Jorge Sampaoli levou o Chile às oitavas de final após contribuir diretamente com a eliminação da então campeã Espanha. José Pekerman fez a Colômbia, pela primeira vez em sua história, se classificar para as quartas de final da competição. Sem falar na presença constante de técnicos da Argentina no mercado europeu.
Diego Simeone terminou a temporada com o gosto amargo de perder o título da Liga dos Campeões na prorrogação, para o Real Madrid, mas consagrado por ter dado ao Atlético de Madri um título espanhol que não vinha desde 1996 (quando o atual técnico ainda era jogador da equipe). Maurício Pochettino fez o modesto Southampton terminar o Campeonato Inglês na oitava posição, colocação bem melhor do que o 14º lugar da temporada 2012-13, quando ainda não havia chegado por lá. Um trabalho que serviu para sua transferência para uma equipe maior, o Tottenham, do volante brasileiro Paulinho.
Marcelo Bielsa, após um período sem trabalhar, vai dirigir o Olympique de Marselha-FRA a partir desta temporada, assim como Gabriel Calderón, que deixou o Oriente Médio (onde já dirigiu as seleções da Arábia Saudita, Omã e Bahrein) para tentar devolver o Betis para a primeira divisão do Campeonato Espanhol.
Além disso, aqui na América do Sul eles também estão fazendo sucesso. Edgardo Bauza tenta, na próxima semana, levar o San Lorenzo para a final da Libertadores, título que conquistou em 2008, dirigindo a LDU, do Equador. E, nesta quinta (17), Ricardo Gareca estreia pelo Palmeiras. Atraído por um salário maior do que o mercado argentino pode pagar (ele vai ganhar cerca de R$ 50 mil mensais a mais do que Alejandro Sabella ganhava para dirigir a seleção da Argentina, por exemplo), o ex-técnico do Vélez Sarsfield é um caso raro hoje em dia.
Em contrapartida, não há, nos últimos anos, registro de um técnico brasileiro dirigindo uma equipe argentina (Elba de Pádua Lima, o Tim, foi campeão invicto com o San Lorenzo, em 1968).