Felipão e Parreira não admitem erros e se agarram à tese do apagão

Fernando Duarte

Do UOL, no Rio de Janeiro

A surreal entrevista coletiva concedida pela comissão técnica da seleção brasileira na tarde desta quarta-feira foi marcada principalmente pela insistência de Luiz Felipe Scolari e de Carlos Alberto Parreira em creditar a goleada de 7 a 1 sofrida diante da Alemanha a seis minutos de "apagão" em vez de possíveis erros cometidos na estratégia para a partida e durante um ano e meio de preparação. E para isso, tanto o treinador quanto o coordenador-técnico da equipe chegaram para o encontro munidos de retórica e muita "numeralha".

E seu primeiro uso foi para enfrentar questões sobre o excesso de confiança demonstrado tanto por Scolari quanto por Parreira nos meses que antecederam a competição. Enquanto Felipão em meados do ano passado já dizia "sentir" que a seleção seria campeã mundial, Parreira foi além ao ver a seleção "com uma mão na taça" em função de uma preparação e logísticas sem grandes incidentes.

"Trabalhamos com otimismo. A estatística mostra que tivemos oito vitórias dois empates e uma derrota em 11 jogos oficiais. Tínhamos que desenvolver a confiança dos jogadores e também fizemos isso através dos resultados. Não foi um trabalho ruim, embora ficará para a história que perdemos de sete. Tivemos seis minutos de pane", disse Felipão.

Para Parreira, que durante toda a coletiva manteve uma expressão soturna e sequer arriscou as piadas e tiradas usadas por Felipão para tentar quebrar a tensão, usou do bom e velho ufanismo para justificar o clima de confiança. "Um comandante nunca diz para as tropas que elas vão à guerra para perder. Por toda a história do futebol brasileiro era nosso dever acreditar nos jogadores e na nossa competência".

Felipão pontuou frequentemente suas respostas com referências estatísticas para tentar passar seu argumento de que houve pontos positivos na campanha brasileira – todas contidas em calhamaços de papel algumas vezes agitados pelo treinador. A mais óbvia foi o fato de que a ida às semifinais da Copa do Mundo de 2014 foi a primeira desde 2002, mas  treinador também trouxe referências mais detalhistas e até supostos relatórios dos fisiologistas a serviço da CBF, ainda que neste caso apenas oferecendo a oportunidade de consulta.

"Temos dados e podemos mostrar para quem quiser ver. Mas o problema é que tem gente aí que trabalha na TV e no jornal mas quer saber mais que um fisiologista", reclamou o treinador.

Tal frase veio numa das perguntas sobre a condução do regime de treinos da seleção. Na semana passada, o UOL Esporte publicou levantamento revelando que a seleção era a equipe que menos treinava entre as oito ainda disputando a competição. "Nós tivemos tudo programado em relação período de descanso, sessões de musculação e outros treinamentos. Não sofremos nenhuma lesão em treinamentos. De nossos 11 gols, seis foram de bola parada e acho que isso mostra que fizemos alguma coisa (nos treinamentos)", ironizou o treinador.

Felipão também precisou se explicar sobre a declaração, dada após o jogo contra a Alemanha, de que fez um treinamento "falso" na Granja Comary, usando Willian no time titular, para despistar a imprensa. Como se sabe, o escolhido para a vaga deixada pela lesão de Neymar foi Bernard, que iniciou pela primeira vez uma partida oficial pela seleção brasileira justamente numa semifinal de Mundial, e Scolari foi acusado de não ter dado tempo suficiente ao jogador nos treinos.

"Não me arrependo. Dos 28 jogos que fizemos, o Bernard jogou no mínimo em 12 ou 14. Estava conosco nuns 24. O Bernard sabia perfeitamente o que fazíamos e como jogamos", rebateu o treinador.

A defesa estatística serviu também como forma de Felipão "bancar" as críticas relacionadas não apenas ao problema de entrosamento do jogador do Shakhtar Donetsk, mas do desequilíbrio tático provocado por sua inclusão: com características mais de ponta, o jogador não atua com tanta eficiência na recomposição do meio de campo e o setor foi a grande "mina" para a Alemanha dominar a partida e planejar sua "blitz" no primeiro tempo.

Em quase 50 minutos de conversa, Felipão, que enfrentou um questionamento bem mais intenso que na sessão oficial da Fifa após a partida do Mineirão, usou também a defesa numérica ao afirmar que o primeiro gol dos alemães, marcado por Thomas Müller numa cobrança de escanteio, foi o primeiro sofrido pela seleção numa situação de bola parada nos 28 jogos da seleção sob seu comando.

Parreira interveio em diversas respostas do colega e também usou o número de partidas para defender a dupla com Felipão. Ele ressaltou que a goleada alemã marcou apenas a primeira vez sob o comando da dupla que a seleção levou mais de dois gols numa mesma partida. 

Felipão, por sua vez, voltou a apostar na tese de que a seleção vinha em ascensão até encontrar a Alemanha. Citou as estatísticas da Fifa mostrando que o Brasil foi a equipe que mais chutou a gol até agora no Mundial e lembrou que, na partida contra a Alemanha, a seleção teve 18 finalizações contra 14, ainda que tenha ressaltado o maior aproveitamento dos alemães (sete gols contra um) e não tenha levado em conta da redução de ritmo da Mannschaft após ir para os vestiários como uma vantagem de 5 a 0 ao final do primeiro tempo.

No fim, já com a dupla de comandantes da seleção chamando o resultado de "tsunami", Felipão voltou novamente a justificar o fim do sonho com a fração de tempo. "Se eu pudesse responder com consciência (sobre os motivos da derrota)  eu responderia, mas eu também não sei. Tivemos seis minutos de pesadelo".

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