Rua símbolo da Copa em SP é projeto de morador com ambições políticas

Vanessa Ruiz

Do UOL, em São Paulo

Chão de rua pintado é tradição no Brasil em época de Copa do Mundo. Mas os moradores de uma rua em especial, na zona Norte de São Paulo, resolveram usar a arte não só para impressionar os olhos ávidos por verde e amarelo, mas também para marcar posição em outra seara: a das manifestações por melhorias que tomam conta do país há um ano.

A decoração da rua Geraldo Alves de Carvalho, na divisa entre Freguesia do Ó e Pirituba, foi feita alternando bandeiras, figuras como Felipão, Neymar e o mascote Fuleco, e frases ou palavras que remetem a áreas em que o Brasil precisa melhorar, na visão dos moradores. Dentre elas, educação, moradia, saneamento básico, redução da violência. Algumas referências também foram feitas nos murais pintados em portões e muros. Há um em que Pelé aparece ao lado da frase: "30 bilhões? Só rindo, entende", parodiando a forma característica do "rei do futebol" falar.

O coordenador do projeto de pintura da rua, Valdir Pereira, revela que a ideia era colocar ainda mais referências políticas e sociais, mas ele acabou cedendo aos pedidos do tatuador Alessandro Franklin da Silva, 28 anos, vizinho e artista responsável pela execução dos desenhos, que não queria pender para o radicalismo ou agressividade.

"Nós resolvemos fazer desta forma porque aquilo que os manifestantes têm feito é um vandalismo que não atinge o rico. Só atinge a nós, pobres, quando queimam ônibus, fecham estação de trem", explica Alessandro, e Valdir emenda: "É a arte dele [Alessandro] que será divulgada através deste trabalho, então chegamos em um consenso e este é o resultado".

Em poucos minutos de conversa, fica claro que o grande motor de Valdir são as causas sociais, mais especificamente da região onde vive. Ele mora ali há mais de 20 anos e concorreu a vereador nas últimas eleições municipais pelo PRTB, "o partido do aerotrem", explica. "Não tive nenhum espaço na TV, mas foi bom para ver como as coisas funcionam. Em 2016, vou concorrer de novo, talvez pelo PMDB".

Participar da campanha em 2012 ensinou que é preciso dar passos menores primeiro. Por isso, ele está buscando o apoio da prefeitura de São Paulo para fundar uma associação dos moradores da Freguesia do Ó, com este nome ou outro. "A ideia já está amadurecida, mas preciso de um jeito de viabilizar isso oficialmente", explica.


Valdir, que tem 39 anos, pretende começar lutando pela revitalização de praças e quadras do bairro: "Temos duas quadras pequenas desativadas e algumas praças sem iluminação que só servem para ponto de droga", diz Valdir, esclarecendo em seguida que o objetivo é "arrumar ocupação para as crianças, tirando-as do caminho das drogas".

O trabalho coordenado por ele na rua Geraldo Alves de Carvalho, que fica a aproximadamente 15 quilômetros do centro de São Paulo, fez com que o local virasse ponto turístico e tema de um sem fim de reportagens no Brasil e em outros países, motivo de orgulho para ele, Alessandro e os moradores que colaboraram com mão-de-obra ou doando dinheiro e material: "Devia ter um concurso nacional para nós podermos ganhar!", graceja Alessandro.

Neste ano, boa parte do custo foi bancado por uma doação de material do projeto Google Ruas Pintadas, num valor estimado por Alessandro em R$ 3 mil, além dos cerca de R$ 1 mil gastos pelos moradores. Além deste prêmio de partida, a rua também foi escolhida a mais bem decorada por um concurso da subprefeitura Freguesia/Brasilândia, o que vai render um kit-churrasco a ser desfrutado no dia da final, em 13 de julho.

E se o Brasil não chegar até a última fase do Mundial? "Não tem problema, a gente vai fazer mesmo jeito. Se bobear, até monto umas barraquinhas de churrasco para vender a quem não for morador da rua e vier de fora. Aí, a gente já junta um dinheiro para a associação", diz Valdir, de olho no legado da sua Copa.

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