"Devolveria minha medalha de campeão", diz Ardiles sobre conspiração de 78

Fernando Duarte

Do UOL, em Londres

  • Mark Kolbe/Getty Images

    Osvaldo Ardiles é comentarista atualmente

    Osvaldo Ardiles é comentarista atualmente

Campeão mundial com a Argentina em 1978, Osvaldo Ardiles é hoje comentarista e palestrante requisitado na Europa. É calejado o suficiente para saber que perguntas sobre o primeiro título de seu país são inevitáveis. Não foi diferente na noite de segunda-feira, em Dublin, quando mais uma vez Ardiles afirmou duvidar de que a Junta Militar que governava a Argentina naquela Copa tenha "comprado" o resultado - mais especificamente convencido o Peru a facilitar a partida em que os donos da casa fizeram gols o suficiente para ir à final e eliminar o Brasil.

"Na minha opinião, seria uma operação impossível. O governo de um país teria que falar com o outro, e as ordens teriam que ir descendo até chegar aos jogadores, que teriam de ser convencidos. Se algum dia qualquer coisa ficasse provada, devolveria minha medalha de campeão mundial", afirmou o argentino de 61 anos.

Ardiles, porém, não nega que a ditadura argentina tinha forte interesse no sucesso de sua seleção na Copa de 1978, como parte de um imenso esforço promocional em meio às críticas internacionais pelas violações dos direitos humanos. Em termos esportivos, havia ainda o problema do orgulho ferido: depois de nem se classificar para a Copa de 70, a participação argentina no torneio seguinte tinha sido melancólica e incluiu uma goleada de 4 a 0 diante da Holanda de Cruyff e cia.

"Estávamos já sob muita pressão por jogar em casa e diante da nossa torcida, e claro que sabíamos de como a junta esperava uma vitória. Nem quero pensar o que teria acontecido se não tivéssemos sido campeões", explica Ardiles.

Vivendo em Londres, cidade que o acolheu como um dos primeiros estrangeiros a atuar no futebol do país, em 1978, o que terminou por render uma participação no filme "Fuga para a Vitória", ao lado de Pelé, Bobby Moore e Sylvester Stallone, Ardiles também é constantemente procurado para falar sobre tempos mais atuais. E vê no Mundial do Brasil uma grande chance para a Argentina chegar ao terceiro mundial, o primeiro desde 1986. Mas acredita que a missão poderá ser dificultada pela exclusão do atacante Carlos Tevez. "Sou amigo de Alessandro Sabella (o treinador da seleção argentina), mas não concordei com a decisão de deixar Tevez fora do time. Ele é melhor que quase todos os outros jogadores. Tevez é também um lutador, um daqueles jogadores que não se dá por vencido. Eu o teria levado para a Copa sem pensar duas vezes, mesmo se fosse para deixar no banco. Se um atacante se machucar, Tevez vai fazer muita falta à Argentina".

Ardiles, porém, concorda com Sabella no que diz respeito ao plano de organizar o time ao redor de Lionel Messi. "Quando se tem um jogador da qualidade de Messi, é o que se deve fazer. Messi é extraordinário e mesmo numa temporada tão frustrante para ele e o Barcelona como a que passou, ele fez praticamente um gol a cada jogo. Isso já deveria ter sido feito na Copa passada, mas Diego (Maradona, que treinou a Argentina no torneio, em que o time foi eliminado pela Alemanha nas quartas-de-final com uma goleada) pensou diferente", lamenta o ex-jogador.

Apesar dos elogios a Messi, Ardiles não hesita em dizer que o jogador do Barcelona precisa do título mundial para conquistar seus compatriotas. "Na Argentina, Maradona ainda é o grande ídolo.  Messi terá de ser campeão mundial para chegar perto". O campeão mundial de 78 não vê a missão facilitada por um grupo relativamente fácil e uma chave que tirou do caminho imediato da Argentina no mata-mata rivais como Brasil, Espanha e Holanda. "Será uma competição difícil para todo mundo. Portugal, por exemplo, é um time que pode ir longe nesse mundial, ainda que na minha opinião o título deverá ficar com alguma das equipes mais convencionais. O mais importante para a Argentina é passar em primeiro no grupo. Isso já garante, por exemplo, que só encontraremos o Brasil na final", brinca Ardiles.

Fã do futebol brasileiro a ponto de quase falar como torcedor das seleções de 1970 e 1982, Ardiles vê a equipe de Luiz Felipe Scolari como uma das favoritas ao título. "Eu não compro essa história de que o Brasil caiu numa chave difícil. Numa Copa do Mundo não há facilidades. O Brasil é um dos favoritos, ainda mais por estar jogando em casa", diz. O fato de Neymar não ter feito uma primeira temporada europeia brilhante não faz o argentino mudar de ideia. "Na seleção é outra história, a começar pelo fato de que ele não vai estar cercado por outros jogadores com o renome de Messi, Xavi e Iniesta", acredita.

Convidado para o jogo de abertura do Mundial (Brasil x Croácia, em 12 de junho), Ardiles ainda não decidiu se fará a viagem de mais de 10 horas entre Londres e São Paulo. Até porque seu interesse maior está na partida que fecha o Mundial, um mês depois, no Maracanã. Ele não esconde que sonha com uma final reunindo os donos da casa e a Argentina. E sequer pestaneja ao falar do desfecho ideal.

"Tenho grande admiração pelo futebol brasileiro e Garrincha foi um dos meus ídolos desde cedo. Mas claro que espero que a Argentina seja campeã. E torço para que seja contra o Brasil. Seria um grande jogo para o futebol".

Ardiles não crê que os problemas na organização do irão afetar a Copa de forma significativa, e evita críticas diretas ao Brasil. Seu alvo preferencial é a FIFA, pelo que classifica como comercialização excessiva do futebol. "Não dá para pensarmos apenas em dinheiro e interesses comerciais. O esporte tem que ser prioridade", finaliza. 

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