Vice de Haddad vê aposta no 'quanto pior melhor' em protesto contra a Copa

Vagner Magalhães

Do UOL, em São Paulo

  • Vagner Magalhães/UOL

    Nádia Campeão mostra no mapa da capital o local onde está instalado o Itaquerão

    Nádia Campeão mostra no mapa da capital o local onde está instalado o Itaquerão

A vice-prefeita de São Paulo, Nádia Campeão (PCdoB), 56, recebeu, há pouco mais de um ano, a coordenação do SP Copa (Comitê Integrado de Gestão Governamental Especial para a Copa do Mundo). Coube a ela e à sua equipe a articulação das ações da administração municipal voltadas para a realização do torneio. Na sua opinião, com todos os problemas - principalmente relativos aos prazos de conclusão das obras -, São Paulo está pronta para deixar uma boa impressão no Mundial. Nádia diz que ninguém precisa abrir mão de nenhuma posição, de opiniões críticas, mas lembra que a esta altura do campeonato, ir às  ruas para dizer "Não vai ter Copa" é um erro.

"Isso não dialoga com a grande maioria da população. O que é que o cara ganha inviabilizando a Copa? Primeiro que é uma ação muito difícil de alcançar, mas ganharíamos o que mesmo? É o chamado quanto pior melhor? Então, se a gente perder tudo o que foi investido (...), é bom para quem", questiona.

A vice-prefeita recebeu o UOL Esporte em seu gabinete e disse que a construção de um estádio particular é uma vantagem que São Paulo tem sobre outras sedes. "Acabou a Copa, nós não estamos preocupados como eles (Corinthians) vão pagar a conta no dia seguinte. Eles vão pagar, vão fazer a gestão. É um clube de futebol, está acostumado com isso. Para São Paulo, chegamos muito perto de atingir tudo aquilo que foi desenhado".

Nádia lembra que a proximidade da eleição presidencial faz os ânimos ficarem mais acirrados, mas que aguarda ansiosamente o início do debate nacional. "Não vejo hora, porque significará que já passou a Copa. Estou  louca para chegar a eleição, para mudar de assunto. Aí a discussão é aberta". Leia os principais trechos da entrevista.

UOL Esporte: Como a senhora vê os atuais protestos contra a Copa do Mundo no Brasil?

Nádia Campeão: Acho que entramos em uma nova fase. Há uma mudança, um ponto de inflexão no debate. Não que se tenha colocado por terra as coisas que já foram analisadas, ou criticadas. Se fez o debate, mas é o seguinte: o evento está aí e seria muito bom que fosse o melhor possível. Está na hora de participar. Ele tem as suas vantagens. Ninguém precisa abrir mão de nenhuma posição, de nenhuma opinião crítica, mas vamos enfrentar juntos. Seria bom que a gente fizesse bem. 
 
UOL Esporte: Mas o "Não vai ter Copa" pegou ...
 
Nádia Campeão: Quando eles adotaram essa linha, em janeiro deste ano, eu disse que achava que eles (os manifestantes) estavam cometendo um erro, que era justamente o "Não vai ter Copa". Ficou a palavra de ordem. Eu falei: 'isso não vai levar a nada'. Isso não dialoga com a grande maioria da população, porque o que é que o cara ganha inviabilizando a Copa? Primeiro, é uma ação muito difícil de o cara alcançar, mas ganharíamos o que mesmo? É o chamado quanto pior melhor? Então, se a gente perder tudo o que foi investido, se a imagem do Brasil fosse lá para a barranqueira abaixo (...), é bom para quem? Eles pegaram uma certa encalacrada, que, depois, não tem como voltar atrás. Fica um beco sem saída. Aí muita gente sai disso porque não quer. Eu acho que tem uma mudança em curso e agora a população começa lentamente, ainda em grupos pequenos, a falar da Copa. Estamos realizando, de um jeito ou de outro. Vai ficar pronto em cima da hora? Podia ter ficado pronto antes? Os estádios estão aí. Vai funcionar.
 
UOL Esporte: De que maneira os protestos influenciaram na tomada de decisões para a Copa?
 
Nádia Campeão: Afetou muito mais o ritmo e a rotina inicial do governo como um todo, que passou a contar com um ingrediente de anseios e reivindicações, sobretudo na área do transporte, cujo nosso programa se desenvolveria num tempo. A gente tinha noção que o transporte público era um grande desafio e tinha um projeto de quatro anos. O impacto maior foi o congelamento da tarifa. Teve impacto no orçamento, nos projetos. E a ansiedade da população como um todo, para todas as áreas, mudou de patamar. Foi mais aí do que para a Copa. O que muda para a Copa? Reduziu bastante o aproveitamento das oportunidades que a Copa criaria se houvesse um outro clima. A minha avaliação é que o Brasil perdeu a oportunidade de realizar um monte de coisas interessantes que a Copa propiciava. No mercado como um todo, em qualificar o seus negócios, em desenvolver mais o turismo, em projetar mais a imagem do Brasil, das cidades sede fora do país, para ter um contingente maior de visitantes. Atrair mais negócios, mais eventos ligados à Copa. Em vez de captar essas coisas positivas, todos ficaram na defensiva. E saiu pouco. Eu vejo por São Paulo. Quantas oportunidades nós teríamos? Não tivemos condições de fazer isso.
 
UOL Esporte: As críticas foram levadas em conta, de alguma maneira?
 
Nádia Campeão: As críticas, as observações, os questionamentos feitos ao processo exigiram mais daqueles que estavam à frente das ações. A gente acabou ficando mais tensionado. Tivemos ações maiores de transparência e explicação para a opinião pública sobre o que estávamos fazendo. É um processo mais duro para quem está na administração, mas é mais interessante para a sociedade. Não se pode reclamar disso. Se eu tenho de explicar porque eu gastei "x" no estádio, se eu vou fazer a obra até o fim, o que vai ficar, é uma exigência legítima da sociedade, da opinião pública. É claro que elas tiveram impacto em toda a preparação da Copa.
 
UOL Esporte: E durante a Copa? A possibilidade de protestos duros está sendo levada em conta?
 
Nádia Campeão: Na reta final, elas (as manifestações) vão adquirir uma dimensão diferente do que foi até agora e do que foi no ano passado. Acho que o debate foi amplo, geral e irrestrito, mas não se deve subestimar o pensamento coletivo. Eu acho que depois desse ano intenso, tivemos perguntas e respostas. Teve um debate. Uma parte grande da sociedade começou a diferenciar um pouco as coisas. Podemos ter crítica, continuar cobrando, exigir respostas adequadas para saúde, educação, mas nós vamos realizar a Copa. Se falou poucos dos benefícios, mas todos sabem que têm. Na geração de emprego, no turismo, no futebol. As manifestações vão marcar posição, vão ocorrer, e quanto mais grupos adotarem atitudes de violência e de vandalismo, pior fica. Mais isolados ficam dessa opinião geral do debate, do mérito da Copa, do projeto nacional. A violência afasta de um debate positivo e saudável sobre Copa. Não tenho preocupação extraordinária. As áreas de segurança e de mobilidade estão levando em conta isso, até com naturalidade. De quem organiza, não sei como estão encarando. Vão ficar mais difíceis de serem aceitos e de prosperar (os atos de violência).
 
UOL Esporte: A maior crítica é quanto ao legado. São Paulo ganha com a Copa?
 
Nádia Campeão: No caso de São Paulo, eu acho que temos um alto índice de cumprimento de compromissos. São Paulo nunca exagerou naquilo que achava que podia fazer. Pôs de pé um estádio novo. Isso foi feito de uns 3 anos para cá. Nós gostaríamos que ele tivesse ficado completamente ativo no final de dezembro, que era o prazo inicial. Em função do acidente mais grave, aquele do guindaste, teve impacto grande de tempo. Estamos caminhando para o encerramento de tudo. Aquilo deu um corte, uma quebra, mas o estádio tá aí. É o estádio da abertura. Não era qualquer estádio, em qualquer situação. O estádio é um legado para o Corinthians, para a cidade, para o futebol de São Paulo. Todo mundo acha que nos próximos anos aquele estádio vai ser muito visitado, os jogos vão ser muito cheios. É um legado imaterial para São Paulo.
 
UOL Esporte: Mas não é pouco?
 
Nádia Campeão: O estádio vai ser um polo gerador de atividades, de renda, porque vai ter muita gente trabalhando lá permanentemente. Foi um compromisso, está feito. Depois preparamos todo o entorno para receber o polo institucional de Itaquera. Então, o que a gente fez lá já é preparando o pós. Fez o estádio? Fez o mínimo indispensável para o funcionamento do estádio. Fizemos um tratamento do entorno para receber esse fluxo maior que vai ter de desenvolvimento em Itaquera. Se você reparar o viário, é um viário sofisticado para uma região. Estamos ampliando o terminal urbano de ônibus em 40%. Vai ficar pronto até 31 de maio. Fizemos a praça com a fiação enterrada, o espaço para a ciclovia. O terreno já está nivelado, o que vier daqui para a frente já será muito mais rápido. Praticamente já demos as condições de infraestrutura para o condomínio empresarial que vai ser na antiga pedreira. Rapidamente eles já fizeram o nivelamento do terreno. Aquilo era um morro, uma pirambeira, você vai lá agora, já está aplainado, nivelado. Fatec e Etec já estão lá. Melhorou para quem já está lá e para quem vem depois. Fizemos a conexão dos dois lados da via.
 
UOL Esporte: Mas ao que parece, as expectativas da população eram maiores, principalmente na questão da mobilidade. Quando o Brasil ganhou o direito de realizar a Copa, em 2007, essa foi uma das principais promessas.
 
Nádia Campeão: Quando a Copa foi anunciada, se viu uma porção de coisas que seriam importantes de serem feitas, mais como uma vontade, uma declaração de intenções, do que um planejamento, com projeto, sede a sede. Quando a Copa foi anunciada, não se sabia nem ao certo quais cidades seriam as sedes. Tinha Florianópolis, Goiânia (...).. Ali já se perdeu um tempo. Então não foram sete anos. São Paulo ainda teve a questão de se ia ser no Morumbi ou não. São Paulo foi rápido porque não tínhamos limitadores que outras cidades sedes têm. Não temos problema do transporte público de massa para chegar ao estádio. Já tínhamos trem, metrô, a radial, corredor de ônibus chegando em Itaquera, e colocamos um estádio lá. 
 
UOL Esporte: Dá para dizer que o resultado foi satisfatório?
 
Nádia Campeão: (A Copa) Foi uma coisa boa para São Paulo. Deixar um legado para Itaquera foi o que se perseguiu. As outras coisas são incentivos quase que indiretos. Mostrar bem São Paulo para que continuemos consolidando o papel de receptivo turístico, de centro importante. De interiorizar o Estado. O Estado trouxe 15 seleções. Outra coisa que ajuda bastante é dar uma acelerada nos dois aeroportos, Viracopos e Cumbica. Nós já tínhamos uma pressão muito grande, uma demanda muito grande, aeroportos de uma outra fase, precisando modernizar. Precisava ampliar e isso foi feito. No caso dos dois, foram feitas concessões há dois anos atrás. Junto com o financiamento, eles tiveram um desempenho bom. Tem um limite. Se mirou na Copa. Se não tivesse a Copa poderia ter ficado para 2015, 2016. Uma parte ainda não está funcionando? Mas é irreversível.
 
UOL Esporte: Mas algumas obras ficaram para trás...
 
Nádia Campeão: Nós gostaríamos de ter avançado na implementação de outro trecho do parque linear do lado de Itaquera e conseguido beneficiar diretamente, definitivamente, as famílias da comunidade da Paz. Eu tinha essa expectativa no início do ano passado. São 300 famílias, a situação é precária. Seria bom se as famílias já estivessem na sua moradia definitiva e a gente já tivesse instalado o parque linear até aquele trecho. Desde o início fizemos um acordo de que não faríamos remoção para ir, por exemplo, para auxílio aluguel. E nem levar para outra região que não fosse Itaquera. Agora que está ficando bom, vou para cidade Tiradentes, vou para a zona sul? Com isso, a gente tinha duas condicionantes que dificultaram. O conjunto que a gente tinha levantado foi invadido. O conjunto São Sebastião. Com 70% pronto, o pessoal invadiu. Demorou uns quatro meses para a reintegração de posse. Eles ficaram, mas melhoramos as condições em que a comunidade está. Articulamos Sabesp, Eletropaulo, limpeza, até que possam ir para os conjuntos. 
 
UOL Esporte: E quanto às remoções?
 
Nádia Campeão: Remoções, foram oito famílias. Essas se enquadram no minha Casa Minha Vida. Mas estão junto da Comunidade da Paz. Houve outras 26 desapropriações judiciais, mas todos já receberam. Isso foi tudo.
 
UOL Esporte: Há uma pressão significativa por moradia em São Paulo...
 
Nádia Campeão: A pressão por moradia sempre foi grande em São Paulo. Nós chegamos em um ponto, que o chamado déficit habitacional, salvo engano, está em 250 mil moradias. Assumimos o compromisso de construir 55 mil. Você tem muitos movimentos organizados com informação sobre esse processo de construção de moradias.  Sabem que nos últimos tempos a produção foi muito escassa em São Paulo. Ficamos parados por muito tempo. E é claro que a gente não consegue tirar essa diferença num curto espaço de tempo. Então todos procuram alternativas de produção de mais moradia. Tem terreno que pode ser desapropriado? Tem dinheiro para desapropriação? São vários caminhos que estão sendo palmilhados. A cidade tem de se refazer, dentro dela mesmo. 
 
UOL Esporte: Recentemente, um terreno foi invadido próximo ao Itaquerão. A ocupação foi batizada como Copa do Povo...
 
Nádia Campeão: É um terreno privado. No plano diretor de hoje não é destinado a habitação. Existe uma mobilização, pelo movimento, de discutir com os vereadores e a relatoria se é o caso de fazer a mudança ou não. A tese de que a zona leste e a zona sul têm sido foco de moradia é óbvio. O que precisa é levar cultura, lazer, educação e trabalho, emprego, empreendimentos, para fazer o que precisa ser feito. O esforço é esse. Desde a década de 70 que a zona leste é ocupada para moradia. Eu acompanhei isso na minha trajetória política. Essa luta por moradia ainda tem fôlego, é uma necessidade ainda. Temos de procurar uma ocupação equilibrada para a cidade. É um problema mais complexo e passa ao largo da Copa. A Copa está valorizando muito os aluguéis lá? No entorno, tende a valorizar. Vai ter uma pressão maior. Mas é um fenômeno pontual e tem os benefícios. Para geração de emprego, cultura, esporte, estádio...
 
UOL Esporte: Essa pressão muda de alguma maneira os planos pra o setor?
 
Nádia Campeão: Moradia a gente vê com naturalidade no governo. Estamos na mesma trincheira. Quem quer ver pessoas morando precariamente, em áreas sujeitas a incêndio? Morando na beira de córrego? É uma coisa para ser superada. Mas nós temos os meios limitados para fazer isso. Mas é uma luta justa, não vemos problema nenhum nisso.
 
UOL Esporte: Como foi o relacionamento da Prefeitura com a Fifa?
 
Nádia Campeão: Nós nos relacionamos mais com o COL (Comitê Organizador Local). Foi um relacionamento equilibrado, pautado com uma atitude com diálogo e abertura. Nunca tivemos uma atitude de 'não vou discutir esse tema', 'não tenho nada a ver com o problema que vocês estão vendo', pelo contrário. Para quem está organizando um evento internacional desse tamanho, em 12 sedes, dizer, insistir: 'é bom que fique pronto três ou quatro meses antes', está no papel deles. Seria importante para qualquer coisa que a gente faça. Ter uma zona de conforto seria o ideal. Você testa, corrige. Tivemos dificuldades para cumprir algumas coisas...
 
UOL Esporte: E as cobranças mais fortes justamente ficaram em cima dos prazos...
Nádia Campeão: Essa era a tônica do tônica do secretário-geral da Fifa, o (Jérôme) Valcke. O tempo. Ele dizia: 'acho que vocês fazem, tem capacidade de fazer. São Paulo é uma grande cidade, mas o tempo, o tempo (...) A pergunta era sempre a mesma: 'mas quando fica pronto?' E a gente dizia que ia ficar pronto a tempo. Então surgiu essa brincadeira. Que o pronto deles nunca é o pronto do brasileiro. 'Acho que vocês não entendem o mesmo pronto que eu', ele dizia. Então, se tem alguma coisa que se pode destacar com a relação com a Fifa, foi 'quando vai ficar pronto?'.
 
UOL Esporte: Mas os prazos apertados aumentam o risco de que algo saia errado. Fica um terreno perigoso...
 
Nádia Campeão: Tomando consciência de que os prazos ficaram absolutamente sem margem nenhuma,  você, no percurso, tensiona mais tudo aquilo que você está entregando. E vai fazendo alguns experimentos e testes mais afiados do que faria se tivesse mais tempo. Como não teve isso, quase todos os procedimentos que fomos adotando, foram muito superiores. Prazo é uma coisa que a gente gostaria de ter tido mais folga, mas não implica nenhuma situação de risco.
 
UOL Esporte: E como foi a relação com o o governo do Estado no projeto como um todo?
 
Nádia Campeão: O prefeito e o governador tem um bom diálogo. Ambos têm absoluta noção que são projetos diferentes, sobretudo no plano nacional, ao nível do governo, onde tem essa disputa, mas que para atender essa situação que o povo está reclamando, não dá para fazer sozinho. A população querendo resolver o problema dela, na rua, clamando por qualidade, botando toda a política em xeque. E você não vai se juntar? Eu entro com o terreno, você entra com a moradia. A gente faz. Seria uma demonstração de descaso com o que é público. Essa noção o prefeito tem muito forte aqui. Eleição a gente disputa na eleição.
 

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