Mulher de Edmilson conta que teve vontade de esganar Galvão na Copa de 2002

Felipe Pereira

Do UOL, em São Paulo

Simeia Moraes queria que o marido fosse como as meninas do vôlei e procurasse as câmeras para mandar beijos e declarações de amor à família após a estreia do Brasil na Copa do Mundo de 2002. Mas o destaque que Edmilson teve depois do jogo foi bem diferente. O volante foi o escolhido pelo narrador Galvão Bueno como o pior jogador da partida diante da Turquia. Como punição ele teve a sua camisa pendurada de cabeça para baixo no programa de pós-jogo da Rede Globo.

Franzindo a testa e fazendo expressão de contrariada ela conta que foi duro ouvir o narrador desancando Edmilson na transmissão. Teve até vontade de entrar na TV e esganar Galvão Bueno. "Foi muito triste ver a camisa pendurada de cabeça para baixo. Fiquei arrasada".

A família estava toda reunida para ver a partida de estreia do Brasil na Copa. E é claro que o melhor lugar do sofá ficou para Simeia, que estava grávida de sete meses na época do Mundial e por isso não viajou para ver as partidas. "O primeiro hino eu chorei". Ela explica que não tem como segurar a emoção de ver o marido defendendo a seleção porque isto é o ápice da carreira.

No período em que Edmilson estava na seleção, o telefone funcionou como nunca. O casal se falava até quatro vezes por dia e o roteiro das conversas não variava muito. Simeia conta que primeiro ele perguntava como estava a Tiffany, nome escolhido para a filha, e depois passavam para os assuntos de futebol. 

Ela diz que a saudade pareceu aumentar na mesma proporção que a distância quando a delegação embarcou para a Coreia do Sul. Também mudou a rotina porque o relógio do marido estava 12 horas adiantado. "Este tempo que ele passou na Ásia eu parecia um zumbi. Falávamos de madrugada e fiquei dois meses vivendo os dois fusos horários".

O cansaço não era maior que a falta que o marido fazia por isso Simeia não pregava o olho sem falar com Edmilson. "Ai dele se não ligasse. Eu não dormia até falar com ele. Ele ligava às 3 horas, 4 horas da manhã." Terminados os assuntos de família, a primeira pergunta que fazia era se o marido começaria jogando. 

Depois do episódio da camisa de cabeça para baixa no varal de Galvão Bueno, Edmilson foi para o banco de reservas. Naquela semana, os diálogos nas ligações foram diferentes, com ambos tentando esconder a tristeza para preservar o companheiro.

Tudo mudou no terceiro jogo do Brasil na Copa, contra a Costa Rica. Com a classificação para as oitavas de final encaminhada, Edmilson ganhou uma nova chance entre os titulares. E ele aproveitou como nunca a oportunidades. Bola alta na área e o zagueiro faz um movimento acrobático lembrando arte marcial, no aspecto da maior plasticidade que o esporte tem, e meio de bicicleta marca o terceiro da seleção. Simeia recorda que pulou do sofá. Ela projeta o quadril para frente come se fosse repetir o movimento e continua a história com um sorriso no rosto. Com a euforia, todo mundo começou a gritar e a agarrá-la.

Passada a comemoração, ela pensou "se a Tiffany não nasceu naquele dia, nasceria no prazo certo". Aquele momento também é orgulho para a menina que está com 11 anos. A mãe afina a voz para parecer a de uma criança e imita: "Mami eu tava na barriga este dia". A irmã mais nova tem um certo ciúme.

As madrugadas em claro se seguiram até que a seleção entrou em campo para jogar a final contra a Alemanha, num domingo de manhã. Simeia passou a noite em claro e quando a bola rolou os medos se dissiparam e o penta chegou. A ligação daquele dia foi mais longa e emotiva. Edmilson falou o que sentiu quando estava de joelhos no gramado. Chorando, contou que lembrou da primeira ida à roça para ajudar a família até a glória no esporte mais popular do mundo. Claro que a mulher acompanhou as lágrimas.

O grand finale foi com Edmilson sendo recebido no Palácio do Planalto e ganhando medalha do presidente da República, na época Fernando Henrique Cardoso. O país tratava os jogadores como heróis nacionais, mas para as mulheres deles existe um lado B. "O mundo inteiro vê e eu me senti bastante orgulhosa. Ao mesmo tempo não foi fácil. Eu estava grávida, minha filha nasceu em agosto e em junho ele viajou. Eu já estava com um barrigão", lembra. Simeia começa a frase com um sorriso, mas termina pensativa e coçando a perna.

Ela ressalta que a Copa está longe de ser um incômodo, mas diz que foi complicado ir à Granja Comary entregar o marido à Família Scolari para reencontrá-lo somente dois meses depois. E assim como as demais mulheres e namoradas dos pentacampeões, Simeia não teve nem o direito do primeiro abraço depois da volta ao Brasil. O carinho só aconteceu depois dos longos desfiles em carro de bombeiro. "Quando ele chegou foi só festa, todo mundo feliz. Claro que o primeiro abraço foi com muitas emoções e lágrimas."

Simeia decorou as imagens da festa e isto aparece no olhar que parece rever uma cena gravada na memória e descrever uma emoção tatuada na pele: "eu vi ele com a taça na mão". Era o último mês de gravidez quando o marido voltou para casa.Como julho foi o mês da final da Copa e do nascimento de Edmilson, a mulher preparou uma festa de aniversário e de boas vindas. Simeia fala como decorou o salão com o olhar de quem assiste imagens gravadas na memória. Ressalta que ela mesma fez o bolo que tinha a bandeira do Brasil desenhada na cobertura e a frase "Parabenizamos o pentacampeão Edmilson".

Familiares e amigos cantaram o Parabéns a você e Simeia ganhou o primeiro pedaço. "Tinha que ser, né?". Em seguida, o casal viajou para Taquaritinga, a cidade natal do zagueiro. Mais uma vez o penta  campeão subiu no caminhão dos bombeiros para desfile em carro aberto. Mas dessa vez não estava acompanhado pelos companheiros de time e sim pela mulher. Ele fez questão da presença dela que mesmo no último mês de gravidez teve a alegria de dividir este momento com o marido. "Muita emoção e fico imaginando o que ele não viveu. Fiquei pensando, nossa!" Depois de 60 dias longe, eles finalmente celebravam as alegrias da Copa juntos.

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