Figurinhas da Copa "valem ouro" e podem render R$ 30 mil/mês a jornaleiros
Carolina Juliano
Do UOL, em São Paulo
Se tivessem ações na Bolsa de Valores, as figurinhas da Copa do Mundo certamente seriam o melhor e mais rentável investimento a curto prazo do mercado no momento, com lucro garantido e risco zero. Os três meses, aproximadamente, em que os cromos autocolantes chegam às bancas rendem a jornaleiros e oportunistas, no bom sentido da palavra, um dinheiro extra e certo que pode chegar aos R$ 30 mil mensais, ou até mesmo passar disso.
O administrador de uma banca da Avenida Paulista, em São Paulo, revela que na Copa de 2010 chegou a pagar um boleto no valor de R$ 115 mil para a editora responsável pela publicação do álbum e dos cromos. "A distribuidora costuma cobrar a cada 15 dias e me lembro deste boleto em especial, porque foi realmente um valor bem alto", diz Edson Souza Dantas. "Destes, 30% (aproximadamente R$ 34.500) são limpos para o jornaleiro."
De olho no bom negócio, Dantas disse que sua banca já se adiantou e encomendou a primeira leva de álbuns e figurinhas, que deverá chegar em meados de abril. "Na primeira distribuição vamos receber 2 mil álbuns e 20 mil pacotes de cromo", diz. "Mas esperamos este ano ser abastecidos melhor porque em 2010 foi tanta procura que a editora não deu conta de atender."
O dono da Banca Ana Rosa, que fica na Vila Mariana, em São Paulo, não quer revelar quanto lucrou com os cromos na última Copa, mas afirma que tem demanda para vender até 5 mil pacotes de figurinhas por dia. "Se conseguirem me abastecer, garanto que vendo", diz o senhor que quis se identificar apenas como "Índio". "Na última Copa paguei boletos bem altos, mas não devolvi nenhum pacote de cromo quando eles passavam para acertar as contas e fazer a recolha, fui acumulando e no fim do período vendi tudo."
Até R$ 42 mil por mês
A Panini, editora responsável pela publicação, não divulgou ainda nenhum número de tiragem ou do valor que será cobrado o pacote de figurinhas, mas os jornaleiros estimam os valores porque, segundo eles, o preço de álbum é tabelado e não costuma fugir muito do preço de capa das outras publicações que já estão nas bancas. Se utilizarmos os números citados por eles e fizermos uma conta simples, concluímos que esses jogadores de papel valem mais que os de carne e osso.
Os jornaleiros estimam que o álbum chegue às bancas por valor entre R$ 4,90 e R$ 5,90, e os pacotinhos custem entre R$ 0,95 e R$ 1. Se o senhor Índio vender 5 mil pacotes por semana, ele ganhará entre R$ 4.750 e R$ 5 mil por semana. Pagando a editora, restarão para ele entre R$ 1.425 e R$ 1.500 por dia de venda. Ou seja, R$ 10.500 por semana, R$ 42 mil por mês, o suficiente para comprar a vista um carro zero completo. Claro que isso é uma conta livre levando em consideração que todos os dias ele vai vender os 5 mil pacotes.
Preocupado com o destino que esses jornaleiros vão dar à verba extra que entrará com a Copa, o Sindicato dos Vendedores de Jornais e Revistas de São Paulo (SINDJORSP) marcou uma reunião com o Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas) para pedir orientação sobre como auxiliar os jornaleiros a investirem o dinheiro. "Nas bancas de jornal o movimento, no mínimo, dobra só com esse produto. E o mais interessante é que nem só as grandes bancas são beneficiadas, qualquer uma vende tudo que recebe da distribuidora", diz José Antônio Mantovani, presidente do SINDJORSP.
Dois salários a mais no ano
Segundo ele, só o álbum da Copa do Mundo proporciona ao jornaleiro lucrar duas vezes mais o que ele lucra em um mês de vendas. "Em ano de Mundial, é como se o jornaleiro recebesse 13º e 14º salários", diz. "Mas em 2010 houve muito problema de distribuição desigual, houve muito assalto em bancas em busca dos cromos, roubo de carga, é uma loucura."
Neste ano, Mantovani diz que o sindicato abriu um canal de comunicação com a Panini e com as distribuidoras para pedir que as 3.500 bancas de jornal da cidade de São Paulo sejam contempladas de forma igual com a distribuição de cromos. "Não interessa onde é a banca, quando começa a faltar figurinha sai todo mundo para a rua procurando quem tem. E quem tem, vende."
Mantovani diz ainda que o mercado estima que neste ano possam ser distribuídos até 400 milhões de pacotes (2 bilhões de figurinhas) nos 3 ou 4 meses que o álbum estará nas bancas, sendo que 120 milhões só para a cidade de São Paulo. O diretor Comercial, Marketing e Publicações da Panini, Marcio Borges,não confirma a informação, diz que esse número ainda não existe e que "a distribuição inicial será muito inferior a isso". Borges diz que "o volume final dependerá da demanda de mercado. Com uma Copa ocorrendo no Brasil não é possível fazer uma estimativa mais precisa neste sentido".
O diretor da empresa também não confirma os valores estimados pelos jornaleiros para os preços dos pacotes de figurinha, ele diz que a editora ainda "está avaliando os preços de capa (álbum) e dos envelopes que ainda não estão definidos – pois envolvem custos industriais não fechados".
O certo é que as bancas de todo o país vão vender – e muita – figurinha e a preocupação das paulistas é poder tirar o maior proveito desse ingresso extra de dinheiro. "Incentivamos também a formação dos clubes de troca", diz Mantovani. "Na última Copa reuni até 200 pessoas aos sábados na minha banca, no bairro de Santana (Zona Norte de São Paulo). Muitos acham que incentivar a troca diminui a venda, mas não, as pessoas vão, trocam, confraternizam e ainda compram mais."
R$ 7 mil por um lote de cromos
Correndo por fora vem Denílson José Gomes, 42 anos, motorista de ônibus aposentado do Estado de Minas Gerais. Ele afastou-se do trabalho depois de sofrer um AVC e ficar com algumas funções comprometidas. Desde os 11 anos ele coleciona figurinhas, principalmente de futebol e das Copas do Mundo, mas foi após a aposentadoria forçada que ele viu nas coleções uma opção de bom negócio.
"Em 2006, um amigo me convidou para começar a vender e trocar figurinhas da Copa e como eu não pagava pelo transporte porque ainda era funcionário da empresa de ônibus, embora afastado, eu comecei a correr atrás disso", conta. Hoje, Gomes tem um box num shopping popular de Belo Horizonte e espera ansioso pela chegada do álbum da Copa 2014. "Nessa época faturo de R$ 300 a R$ 500 por dia e realmente vale a pena o negócio."
O comerciante diz que já não é colecionador e que tem que se preparar para esse período porque o trabalho aumenta muito. "Em época de Copa, compro caixas fechadas com 1 mil pacotes de cromos, levo para casa, separo de acordo com uns critérios que eu mesmo criei baseados em minha experiência, às vezes fico até 5h da madrugada nisso, às 7h já saio de casa porque levo 2 horas para chegar ao shopping, onde trabalho das 9h às 19h, de segunda a sábado."
O dinheiro para investir na compra dos cromos nem sempre ele tem. Mas afirma que os jornaleiros conhecidos vendem fiado ou no cartão de crédito porque sabem que o retorno é garantido. Atualmente ele estima ter 160 mil figurinhas estocadas. O valor cobrado pelas chamadas "normais" é de R$ 0,40 e as "especiais" (escudos de times, estádios ou aquelas em papel brilhante), ele vende por R$ 1.
No box 147 do Shopping Caetés há figurinhas de vários segmentos, mas a maioria é mesmo de futebol e de Copa do Mundo. Gomes conta que já chegou a vender um cromo com o escudo da Seleção Brasileira de 2006 por R$ 25 e alguns álbuns completos já saíram por R$ 400. O seu maior faturamento até hoje foi um lote de figurinhas de vários álbuns, de anos diferentes, que vendeu para um único colecionador por R$ 7 mil.
Trocas e leilão pela internet
Além de vender, ele também troca figurinhas em duas modalidades: 3 por 1 sem escolha (nesse caso, ele pega, por exemplo, 30 figurinhas sem escolher do cliente e dá 10 em troca), ou 2 por 1, mas com possibilidade de ele escolher quais vai querer. "Pela minha experiência, não convém essa troca para o cliente porque eu acabo sabendo quais são as mais difíceis e visadas e vou escolher essas."
Ele conta que as figurinhas da Copa são colecionadas por muita gente porque a editora distribui muitos álbuns encartados em jornais ou em outros eventos. "Quando se tem o álbum na mão, todo mundo vai atrás de completá-lo. Esperamos que essa Copa que é no Brasil desperte ainda mais interesse pelo álbum."
Em uma rápida pesquisa em portais de venda e leilão na internet, é possível ver que mais gente se interessa pelo negócio das figurinhas. Há centenas de álbuns sendo negociados por até R$ 2 mil, como é o caso de um vendedor da Paraíba que pede este valor pelo livro da Copa de 1970 completo e com as figurinhas soltas. Há também álbum usado com figurinhas que vinham em um chiclete sendo vendido a R$ 400. E na loucura em que se transforma essa coleção de cromos das Copas há até quem venda o verso das figurinhas da Copa de 2010, aquele papel manteiga que cobre o adesivo, por R$ 39,90.