Regras do edital devem entregar novo Maracanã a grupo estrangeiro

Rodrigo Mattos e Vinicius Konchinski

Do UOL, em São Paulo e no Rio de Janeiro

  • Ricardo Moraes/Reuters

    Cobertura do Maracanã é colocada em uma das etapas finais da obra

    Cobertura do Maracanã é colocada em uma das etapas finais da obra

O mais famoso estádio do Brasil deverá ser administrado por uma companhia estrangeira após ter sido reformado para a Copa do Mundo de 2014, em uma obra de R$ 1 bilhão. Lançado pelo governo do Estado do Rio de Janeiro na semana passada, o edital de concessão tem regras que dificilmente permitirão que uma empresa nacional vença a concorrência sozinha, sem se associar a outras do exterior.

O documento também permite que um consórcio liderado por estrangeiros dispute o controle do estádio. Na minuta do edital, apresentada em outubro do ano passado, estava vedada a transferência da administração do Maracanã para uma empresa ou consórcio controlado fora do Brasil. O que foi mantido na versão final do edital, porém, são exigências que praticamente acabaram com qualquer chance do estádio ter um controle 100% nacional.

Explica-se: para participar da concorrência que definirá a concessionária do Maracanã, as empresa interessadas precisam ter uma experiência de, no mínimo, dois anos na administração de um estádio com 20 mil lugares. Quem tiver gerido uma arena para 40 mil pessoas ou mais leva vantagem.

Outro item que conta na concorrência é ter sob o seu controle uma arena multiuso de pelo menos 5.000 lugares. Nesse contexto, também ganha mais pontos quem já é dono ou tem concessão de um complexo de entretenimento com quatro equipamentos, incluindo estacionamento de 2.000 vagas e museu com 2.000 metros quadrados.

Mais do que isso, também há vantagem para quem vendeu R$ 500 milhões em áreas VIPs de arenas nos últimos 10 anos. Aquele que atingiu a marca de R$ 1 bilhão obtém o dobro dos pontos.

Por fim, a avaliação técnica terá maior peso do que a oferta de dinheiro pelo controle do estádio. Serão 60% para a nota técnica e o restante para o maior desembolso feito ao Estado. 

Acontece que, no Brasil, o negócio "administração de estádio" é novo. Quase todos os locais para jogos existentes no país pertencem a clubes de futebol ou ao poder público. Há pouco tempo, empresas como a BWA e a empreiteira OAS assumiram estádios recém-construídos no país. Dificilmente, portanto, uma empresa nacional conseguirá comprovar a experiência exigida. No exterior, em compensação, há varias companhias que já fazem gestão desse tipo de complexo.

"O edital exige que o consórcio tenha entre seus parceiros uma empresa com experiência absolutamente comprovada na gestão de arenas, tanto indoor (ginásios) como estádios multiuso", afirma o presidente da Abrarenas (Associação Brasileiras dos Operadores e Fornecedores de Arenas Multiuso), João Gilberto Vaz. "Acho muito difícil uma empresa nacional concorrer sozinha."

"É impossível [uma empresa brasileira vencer a concorrência]", diz Bruno Balsimelli, executivo da BWA, que entende que companhias brasileiras teriam condições de gerir o estádio, não fossem as regras do edital. "Não acho justo. Eles (o Governo do Rio de Janeiro) deveriam dar prioridade às empresas brasileiras, como fazem nas concorrências lá fora. Mas estão querendo estimular outras culturas, de outros países", opina.

Das companhias brasileiras que deverão entrar na disputa pelo Maracanã, nem a IMX, de Eike Batista, nem a Odebrecht nem a BWA cumprem os requisitos do edital. A IMX, hoje, não administra nenhum estádio. Já a Odebrecht participa de várias obras de arenas para Copa e já tem contrato para controlar a Fonte Nova, em Salvador, e a Arena Pernambuco, em Recife. Ambos os estádios, porém, ainda nem foram inaugurados.

Para tentar garantir espaço na disputa, ambas as companhias deverão se aliar a empresas estrangeiras. A IMX, por exemplo, já é parceira da IMG Worldwide, que administra o estádio de Wembley, na Inglaterra, entre outras arenas ao redor do mundo. A companhia de Eike informou, entretanto, que ainda estuda a melhor forma entrar no processo licitatório.

O UOL Esporte apurou que a Odebrecht também está de olho no Maracanã. Procurada pela reportagem, a empresa não informou quais deverão ser suas parceiras na concorrência.

Um consórcio já estruturado para disputar a concessão do estádio é formado pela Stadia Brasil e a multinacional Global Spectrum. A Stadia é uma empresa recém-formada pela brasileira Traffic e a portuguesa Lusoarenas. Essas duas companhias vão se unir ainda à norte-americana Global Spectrum para concorrer pelo Maracanã e por outros estádios do Brasil. Caso o consórcio vença a concorrência, o Maracanã terá controle brasileiro, português e dos EUA. A BWA também promete concorrer com um parceiro estrangeiro.

Até por isso, o governo do Estado agora formalizou regras que permitem a adesão de estrangeiros a consórcios candidatos a administrar o estádio. Esses terão, por exemplo, de apresentar garantias de cumprimento das legislações trabalhistas e tributárias de seus países. A comprovação de capital para os disputantes também pode ser feito com balanços de empresas estrangeiras, desde que convertidos ao real. É necessário ter um capital de no mínimo R$ 59,4 milhões.

Ao mesmo tempo em que abre a possibilidade de o Maracanã ser controlado integralmente por empresas estrangeiras, o governo fluminense exige que a concessionária feche contrato com pelo menos dois dos principais clubes cariocas, para garantir a utilização do estádio pelas agremiações.

A regra está prevista no contrato que a vencedora da licitação assinará com o governo fluminense após o fim da licitação. De acordo com o documento, caso a concessionária não firme um acordo com os clubes em 90 dias após assinar o contrato com o governo, ela poderá perder a concessão do Maracanã.

Esse mesmo contrato, entretanto, proíbe que a concessionária faça qualquer caracterização do Maracanã para privilegiar algum clube. Dessa forma, mesmo aqueles times que usarem o estádio, não poderão ter seus emblemas ou cores expostos.

PRIVATIZAÇÃO VAI DEVOLVER 15% DO INVESTIDO PELO GOVERNO EM REFORMA

  • Ricardo Moraes/Reuters

    O governo Rio de Janeiro publicou o edital de concessão do complexo esportivo do Maracanã. De acordo com o documento, a empresa vencedora terá que repassar, no mínimo, R$ 4,5 milhões por ano ao governo estadual em troca do direito de explorar economicamente o estádio de futebol e as instalações esportivas do complexo. A concessão será de 35 anos, sendo que por 34 anos a empresa vencedora terá que realizar o repasse de R$ 4,5 milhões. Assim, findo este prazo, o Estado do Rio de Janeiro terá recebido R$ 153 milhões, ou por volta de 15% do montante que o poder público está gastando na reforma do Maracanã, atualmente orçada em cerca de R$ 1 bilhão.

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