Bicampeonato com a mesma base é missão quase impossível na Copa
Do UOL, em São Paulo
Para os mais atentos à história do futebol, não foi uma surpresa ver a envelhecida Espanha, atual campeã do mundo, ser eliminada da Copa do Mundo nesta quarta-feira ao ser derrotada por 2 a 0 para o Chile. Muito pelo contrário. Outros times que foram campeões mundiais mostram que o bicampeonato é uma missão quase impossível e que, se não houver renovação, o vexame é quase certo.
Só uma vez na história um time conseguiu levantar a taça por duas vezes consecutivas mantendo a mesma base. E não foi qualquer seleção. O feito coube justamente ao Brasil de Pelé, Garrincha, Pepe e Zito, em 1958-1962. Naquela ocasião, só oito nomes foram trocados em quatro anos. E, entre as novidades, surgiram reforços de peso como Mengálvio, Coutinho e Amarildo.
Depois, em 1966, houve a tentativa de renovação no elenco, mas o esqueleto era o mesmo, com Gilmar, Djalma Santos, Altair, Bellini, Zito, Garrincha e Pelé indo para mais um Mundial consecutivo. A tragédia era anunciada por quem acompanhava de perto aquele time.
"Se os brasileiros encararem a realidade, vão perceber que o tri só virá por um milagre" disse Ernesto Santos, olheiro da seleção na Copa do Mundo de 1966, antes mesmo da estreia. O Brasil foi eliminado na primeira fase.
Até mesmo no bicampeonato de 1934 e 1938 da Itália a mudança foi fundamental. Só quatro jogadores entraram para a história como bicampeões. Entra neste contexto um fator importantíssimo para a troca. Os italianos conseguiram a medalha de ouro das Olimpíadas de 1936 e usaram a base do time para renovar o elenco no Mundial seguinte.
Na história recente, outras equipes sofreram do mesmo mal. Em 1998, a França que atropelou o Brasil na final tentou repetir a façanha em 2002 usando 14 jogadores iguais. O resultado foi a eliminação ainda na primeira fase, com atletas como Djorkaeff, Desailly e Lebouef sofrendo com efeitos da idade.
Entre o Brasil campeão em 2002 e o time de 2006, convocado por Carlos Alberto Parreira, o mesmo problema foi sentido. Roberto Carlos e Cafu são os melhores exemplos de atletas rodados que já não rendiam mais o mesmo, assim como Emerson. Isso sem contar Ronaldo, que, mais do que pela forma física do que pela idade, não mostrou o futebol que o havia colocado entre os melhores do mundo.
Na sua coletiva de despedida, no dia seguinte à eliminação, o treinador avisou. O único remédio era a renovação imediata. "Quem assumir esse barco, não interessa quem continua ou não, já começa a projetar alguma coisa para a Copa de 2010. Eles (parte do time de 2006) jogaram quatro Copas do Mundo e venceram duas, é uma geração que cumpriu um ciclo vitorioso".
Adivinha o que derrubou a Itália em 2010? Campeã em 2006, o time tentou usar a base do sucesso anterior para buscar mais uma dobradinha. O técnico Marcelo Lippi repetiu seu esqueleto com Buffon, Cannavaro, De Rossi, Camoranesi e Pirlo. Não deu certo, e os campeões saíram humilhados, mais uma vez, ainda na primeira fase.
No Mundial do Brasil, a Espanha tentou o quase impossível com 15 nomes iguais aos que foram campeões na África do Sul em 2010. Também pudera. O time ganhou tudo o que disputou e ainda mostrou ao mundo o seu estilo de jogar, o Tiki-Taka.
A equipe, no entanto, dava mostras de que não era a mesma em 2013. Na Copa das Confederações, quase não viu a cor da bola na final e foi derrotada pelo renovado Brasil de Luiz Felipe Scolari por 3 a 0.
Outro sintoma era, também, a decadência do grande espelho da seleção espanhola. O Barcelona, idealizado por Pep Guardiola e depois liderado por Tito Villanova e Tata Martino, encerrara há pouco o seu ciclo após um declínio gradual. Pouco antes de sair, Guardiola previa que a renovação era necessária não só para ele, mas também para sua equipe.
"O próximo ano será o quarto consecutivo como treinador do Barcelona. Um clube como este deve ter muita coragem para manter um treinador por tanto tempo, porque os jogadores se acomodam com ele e vice-versa", disse ele na ocasião.
Na hora de montar a equipe de 2014, Felipão priorizou justamente a renovação. Não à toa, ele foi responsável pela maior mudança em 64 anos na hora de convocar os nomes que estão nesta Copa. Apenas cinco estiveram na Copa de 2010 - Júlio César, Maicon, Thiago Silva, Daniel Alves e Ramires.