De olho no cofre

Desapropriações e problemas políticos atrasam VLT de Fortaleza; TCU aciona "alarme amarelo"

Roberto Pereira de Souza

Do UOL, em Fortaleza (CE)

  • Danilo Verpa/Folhapress

    Obra da Copa do Mundo de 2014, VLT de Fortaleza deverá desalojar 3,5 mil famílias da cidade

    Obra da Copa do Mundo de 2014, VLT de Fortaleza deverá desalojar 3,5 mil famílias da cidade

Se alguém perguntar a qualquer técnico do governo cearense sobre qual é a obra mais problemática para a Copa do Mundo de 2014, a resposta virá em três letras: VLT, ou Veículo Leve sobre Trilhos.

A obra, uma linha férrea de 11 quilômetros e dez estações, deverá custar R$ 265,5 milhões e tem financiamento da Caixa Econômica Federal de R$ 170 milhões. O governador Cid Gomes (PSB) assinou termo de responsabilidade pela construção, assumindo também a desapropriação das famílias em valor consolidado de R$ 92,2 milhões na forma de contrapartida (exigência do banco estatal). A linha de VLT Parangaba-Mucuripe vai ligar a zona hoteleira de Fortaleza (CE) à área do Castelão, estádio da Copa de 2014. 

DESAPROPRIAÇÕES DA COPA EM SP

  • Leandro Moaes/UOL

    Cerca de 200 famílias estão vivendo há pouco mais de dois meses entre escombros de casas demolidas, entulho e lixo gerados pela derrubada de casas desapropriadas na zona sul de São Paulo pelo Metrô. LEIA MAIS

O problema é que uma ação judicial movida pela Comunidade do Trilho, que será diretamente afetada pela obra, junto com o Ministério Público Federal impede que cerca de 580 casas sejam derrubadas e as famílias removidas para áreas distantes, sem um cuidadoso acordo de compensação de prejuízos e danos morais. Ao todo, a obra prevê que 3,5 mil famílias sejam desalojadas.

A obra deveria estar com mais de 70% dos trabalhos concluídos para ser entregue em junho de 2013. Iniciada em 2011, porém, a construção tem menos de 20% de execução.

Em setembro de 2012, o governo do Estado se negou a fazer as desapropriações, alegando que a responsabilidade seria da Prefeitura de Fortaleza (CE), contrariando o que estava assinado na Matriz de Responsabilidades da Copa desde 2010. O documento está disponível no site do Ministério do Esporte.

"O governo achou que a obra era do município porque está dentro da cidade", explicou, sem rir, o engenheiro do Estado, Cyro Regis, em entrevista ao UOL Esporte. "Mas o metrô de São Paulo está no município e é todo feito pelo governo do Estado..", insistiu a reportagem. "É, eu sei, eu sei, mais foi uma interpretação", disse Regis.

Fontes da Prefeitura dizem que a Matriz é clara quanto à responsabilidade do governo do Estado e "que o conflito de competência foi forjado para que as desapropriações não causassem desgaste político durante a eleição municipal".

"A responsabilidade do governador está materializada na assinatura dele nos documentos oficiais arquivados em Brasília e no pedido de empréstimo junto a Caixa Econômica Federal", explicou uma fonte da Prefeitura de Fortaleza.

"Tivemos problemas, mas, passada a eleição municipal, os ânimos estão menos exacerbados", falou o secretário especial da Secopa do Ceará (secretaria extraordinária criada para coordenar as ações preparatórias para 2014), Ferrucio Feitosa, na última terça-feira, diante de uma comissão de deputados federais e técnicos do TCU (Tribunal de Contas da União).

O secretário preferiu passar o tema  indigesto do VLT a Edilson Aragão, diretor da Metrofor (empresa estatal que opera o metrô de Fortaleza) e responsável, no Estado, pela malha de mobilidade urbana que será usada na Copa do Mundo. 

Aragão disse que foi pego de surpresa e que "não tinha tido tempo de trazer fotos mais atualizadas das obras do VLT". "Já retomamos o credenciamento das famílias que serão removidas mediante indenização. Tivemos problemas durante a eleição, mas agora temos um projeto de lei do Executivo sendo aprovado pela Assembleia Legislativa cearense: as casas avaliadas em até R$ 40 mil darão ao proprietário seu valor em dinheiro mais um apartamento quitado do programa Minha Casa Minha Vida", explicou Aragão.

"Casas avaliadas acima desse valor darão ao proprietário o correspondente em dinheiro e um financiamento com prestações de cerca de R$100 ao mês, também do Minha Casa Minha Vida. E, para esperar alguma casa, temos também o aluguel social de R$ 300,00".

Aragão exibiu um mapa em que detalhou as etapas da obra e desabafou: "estamos trocando os pneus do carro em movimento. Existe uma linha férrea de carga (operada pela empresa Transnordestina) que precisa de reparos. Estamos consertando esses trechos urbanos sem interromper o tráfego e, depois, faremos mais duas linhas para o VLT ao lado. As  desapropriações  devem ocorrer a partir de janeiro e fevereiro de 2013 com toda força."

Obras para a Copa de 2014
Obras para a Copa de 2014

O técnico disse que está cumprindo a decisão da Justiça Federal de só voltar a avaliar as casas depois que o plano de indenização estivesse pronto. "A medida cautelar está em vigor e só voltaremos ao trabalho mais forte em 2013. Espero não encontrar conflitos com as famílias. O governo está sendo generoso, magnânimo com as avaliações, porque é uma área da União invadida por essas famílias há muitos anos", disse o diretor da Metrofor.

Por estar com apenas 20% dos trabalhos concluídos, o TCU colocou a obra do VLT, já em setembro deste ano, "sob luz amarela", seguindo sugestão do Ministério das Cidades.

A luz amarela do TCU tinha um foco específico:  a obra dependia de desapropriações que estavam sendo questionadas na Justiça Federal e a solução poderia levar um "tempo infinito", muito além daquele estabelecido na Matriz de Responsabilidade assinada pelo governador Cid Gomes e pela prefeita de Fortaleza, Luizianne Lins (PT).

Sem as desapropriações, o VLT estará comprometido no traçado do projeto original e a mudança implicaria em alterações no financiamento e custo da obra.

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