Dirigentes que cobram renovação da seleção estão no poder há até 40 anos

Danilo Valentini

Do UOL, em São Paulo

  • Leandro Moraes/UOL

    José Maria Marin, presidente da CBF, e Marco Polo Del Nero, seu sucessor em 2015

    José Maria Marin, presidente da CBF, e Marco Polo Del Nero, seu sucessor em 2015

O impacto provocado pela goleada de 7 a 1 aplicada pela Alemanha contra o Brasil, há uma semana, foi a gota d´água para que algumas das figuras mais influentes e menos conhecidas do futebol brasileiro clamassem pela demissão de Luiz Felipe Scolari e, principalmente, por uma renovação generalizada na seleção. Quem clama por mudanças e novos ares, porém, são justamente dirigentes que estão entranhados na estrutura da CBF por até 40 anos: os presidentes das federações estaduais.

Foi o que aconteceu logo no dia seguinte ao massacre imposto pela seleção alemã, a futura campeã da Copa de 2014. Delfim Pádua Peixoto Filho, presidente da Federação Catarinense de Futebol há 29 anos, foi aos microfones para declarar que Felipão "está ultrapassado, obsoleto". Nos bastidores, ele e outros presidentes não deixaram de cobrar de forma enfática ao presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), José Maria Marin, que havia chegado a hora da mudança. Um pedido que o responsável pela administração do futebol brasileiro não tem como não levar em conta.

Porque são os 27 presidentes das federações e os 20 presidentes dos clubes da Série A do Campeonato Brasileiro que são os responsáveis pela escolha do presidente da CBF e, indiretamente, dos caminhos que serão percorridos pela seleção brasileira. A trombada contra a Alemanha no Mineirão, entretanto, despertou uma série de críticas à forma como a gestão do futebol brasileiro vem sendo executada.

O último alerta foi feito nesta segunda (14) pelo jogador Paulo André, o representante mais atuante do Bom Senso FC, movimento que prega mudanças na gestão da modalidade no país. O ex-zagueiro do Corinthians atacou o fato de que são os presidentes das federações estaduais que têm pressionado o presidente da CBF, José Maria Marin, a promover a renovação no futebol brasileiro. Para isso, listou dirigentes que comandam sua entidade há até quatro décadas. No total, são 16 dirigentes que comandam o futebol em seus estados há mais de dez anos.

Como é o caso de José Gama Xaud, presidente da federação de Roraima há exatos 40 anos. Em seu 11º mandado consecutivo, o dirigente não pode ser apontado como alguém que conseguiu fazer o futebol de seu estado ser desenvolvido: o último estadual teve apenas seis equipes, e o profissionalismo só foi implantado no futebol roraimense em 1995, 21 anos depois que ele já estava no poder.

Mesmo assim, Zeca Xaud, como é mais conhecido, é figura decisiva na atual estrutura mantida pela CBF. Ele foi um dos 44 votos que garantiram Marco Polo Del Nero como o próximo presidente da entidade. Atual-vice presidente da confederação e braço direito de Marin, o advogado de 73 anos assumirá o cargo em abril de 2015. Enquanto isso, seguirá como presidente da Federação Paulista de Futebol. Que também vota na eleição para presidente da CBF.

Na eleição realizada no último mês de abril, Del Nero só não teve três dos 47 votos: dois brancos e uma abstenção, do presidente do Figueirense, Wilfredo Brillinger, em função de uma pendência jurídica que envolvia seu clube e o Icasa. Resultado que deixa claro como as federações se alinham a CBF, seja pelas liberações de verbas para as respectivas entidades ou para agrados políticos, que incluem a indicação de presidentes para chefiarem a delegação da seleção brasileira em jogos e competições internacionais.

Gustavo Dantas Feijó, por exemplo, acumulou no meio de 2013 a função de chefe da delegação durante a Copa das Confederações ao cargo de presidente da Federação Alagoana de Futebol e de prefeito de Boca da Mata, município de 25 mil habitantes no interior do estado nordestino. A escolha não levou em conta que sua candidatura à prefeitura chegou a ser impugnada pela lei da Ficha Limpa nem o fato de o político do PDT já ter sido detido por desacato e desordem, acusado de fazer boca de urna.

Afilhado político de Renan Calheiros, presidente do Senado, Feijó assumiu a função em um período que a CBF enfrentava o risco de ser submetida a uma CPI para investigar sua administração, que chegou a José Maria Marin depois que Ricardo Teixeira renunciou ao cargo, em março de 2012, 23 anos depois de ter herdado a vaga de Otávio Pinto Guimarães.

Ricardo Teixeira, por sinal, foi peça decisiva na concessão de poderes e benesses que presidentes de federações usufruíram durante a Copa do Mundo realizada no Brasil. Presidente do Comitê Organizador Local (COL) até deixar sua vaga para Marin, foi o ex-presidente da CBF quem costurou quais seriam as cidades-sedes e quais cargos seriam entregues aos seus fiéis aliados.

Ednaldo Rodrigues Gomes, por exemplo, ficou com o cargo de chanceler do COL em Salvador. Ele é presidente da Federação Bahiana desde 1990. Mesmo privilégio objetivo por Evandro Barros Carvalho, que foi vice-presidente por 16 anos antes de assumir, em 2011, a entidade pernambucana.

Mas poucos dirigentes agradecem tanto publicamente pelo papel que a CBF desempenha perante as federações quanto Carlos Orione, presidente da federação do Mato Grosso desde 1976 e com mandato garantido até 2017. O Barão, como é chamado por amigos e companheiros políticos, é grato por Cuiabá ter sido uma das cidades a receber (quatro) jogos do Mundial. Mesmo em licença médica, o dirigente não deixou de mencionar que sua relação de longa data com João Havelange (ex-presidente da CBD, a antiga CBF, e da Fifa), Ricardo Teixeira e José Maria Marin foi fundamental para que a capital de seu estado estivesse na Copa.

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