Messi entra em campo para sua maior conquista: a do povo argentino

Carolina Juliano

Do UOL, em São Paulo

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    Estátuas de Messi e Maradona estão lado a lado em praça da Recoleta, na cidade de Buenos Aires

    Estátuas de Messi e Maradona estão lado a lado em praça da Recoleta, na cidade de Buenos Aires

Quando Lionel Messi pisar o gramado do Maracanã neste domingo para tentar levar a Argentina ao tricampeonato mundial terá pela frente um desafio muito maior do que levantar a taça com sua braçadeira de capitão. Aos 27 anos recém-cumpridos, 16 deles vividos na Espanha, 'la pulga' busca conquistar, antes da terceira estrela na camisa, o seu lugar como argentino no coração do seu povo.

Os argentinos costumam dizer que "ser profeta em sua terra não é fácil", e para Messi realmente não é. Com vários troféus de melhor jogador do mundo, com títulos de campeão de quase tudo o que jogou, ainda não conquistou por inteiro a sua gente. Os meninos e meninas o adoram, os adolescentes o idolatram, e é a sua cara que é onipresente em cada esquina de Buenos Aires em outdoors e propagandas. Mas as gerações mais exigentes, que viram jogar Diego Maradona e Alfredo Di Stéfano dizem, sem problema algum, que ele precisa demonstrar algo para ser um ícone nacional.

Discreto e avesso a grandes exposições na mídia, Messi nunca bradou aos quatro cantos a sua mágoa, mas em uma publicação lançada pelo jornal "La Nación", na Argentina, pouco antes de começar a Copa, intitulada "Messi, o Patriota" com a clara intenção de dar uma mãozinha nessa conquista, o maior craque do país na atualidade escreveu sobre o assunto e deixou claro que, sim, isso é um problema para ele.

'Muitos me batiam injustamente'

Foi depois que a Argentina perdeu a Copa América de 2011, jogada em casa, que Messi recebeu as mais duras críticas. Ele comentou: "Disseram muitas coisas sobre a Copa América que foi jogada na Argentina, mas nada tinha a ver com a verdade. Claro que chegavam até mim todos os comentários: que eu não demonstrava vontade de jogar pela seleção, que não cantava o hino e que não sentia a camisa. Doía chegar ao meu país e ver que muitos me batiam injustamente".

As críticas o fizeram, inclusive, repensar o seu papel na seleção. "Uma vez me perguntei se eu era o problema, se eu era a causa dos maus momentos que a equipe atravessava", escreveu Messi. "Mas a culpa só dura um momento, até que você reage e segue em frente. Ainda que às vezes não consiga acreditar por que acontecem certas coisas. Você fica sem respostas quando coloca o melhor de si e as vitórias não chegam".

AFP PHOTO / DANIEL GARCIA Chegavam até mim todos os comentários: que eu não demonstrava vontade de jogar pela seleção, que não cantava o hino e que não sentia a camisa. Doía chegar ao meu país e ver que muitos me batiam injustamente Lionel Messi

Os jornalistas Cristian Grosso e Martín Castilla, que organizaram o livro, afirmam que "mesmo quando Messi governava o planeta futebol, quando o mundo reconhecia seu domínio, sem questionamentos, na Argentina, no seu próprio país, ele era discutido". E explicam que discutir Messi passou a ser um esporte nacional. "E também uma imprudência que a sensatez demorou mais do que o razoável para reparar. Messi estava sempre sob suspeita porque não parecia o suficientemente argentino".

"Ele não sua a camisa, é mais um jogador em campo", diz o comerciante Juan Pablo Perez, 32 anos, fã de Carlito Tevez. "Messi entra em campo e joga, mas não como um defensor do país."  "O garoto é bom, mas não é daqueles argentinos que se descabelam, rasgam a camisa, se machucam para levar a Argentina à vitória, não se envolve", completa o amigo Jorge Aguirre, 42 anos.

As comparações com Diego Maradona sempre vêm à tona. Muitos citam que não encontram em Messi a garra, a determinação e a paixão que Maradona demonstrava quando entrava em campo com a camisa alviceleste. Diego, no entanto, defende 'la Pulga' desde sempre. Em declaração ao livro, conta que até hoje tem nos ouvidos o choro de "Lío" quando foram eliminados pela Alemanha, na Copa de 2010.

Enrique Marcarian/Reuters Ele estava deitado em um canto do vestiário, chorando. Isso é algo muito forte. Porque quando se fala de amor à camisa e de que ele não canta o hino... não, não, o contrário! Ele quer jogar sempre! Isso de que Lío não sente a camisa é um absurdo total Diego Maradona, sobre a eliminação na Copa de 2010

"Todos já estavam pensando na volta, nas passagens... E ele estava deitado, barriga para baixo, em um canto do vestiário, chorando. Isso é algo muito forte. Isso é o que os argentinos devem saber. Porque quando se fala de amor à camisa e de que ele não canta o hino... não, não, não, o contrário! Ele quer jogar sempre! Isso de que "Lio" não sente a camisa é um absurdo total", declarou Maradona.

Sempre sonhou com a seleção e se negou a jogar pela Espanha

Ao contrário do que muitos argentinos pensam, Messi diz que sempre sonhou com a seleção argentina, mesmo de longe. Que acompanhava todos os jogos e sofria com as derrotas. "Sempre fui muito fanático da seleção. Assistia aos jogos pela televisão porque nunca pude ir ver no estádio, como torcedor. A lembrança mais forte que tenho de um Mundial foi o de 2002, quando ficamos de fora na Copa da Coreia-Japão. Vivi aquilo com dor, à distância, porque já estava em Barcelona".

Julio Cesar Guimaraes/UOL Uma vez me perguntei se eu era o problema, se eu era a causa dos maus momentos que a equipe atravessava. Mas a culpa só dura um momento, até que você reage e segue em frente Lionel Messi

Messi diz ainda que ficou muito ansioso à espera da primeira convocação porque chegaram a cogitar que ele jogasse pela Espanha. "Houve contatos informais para saber se eu queria jogar pela seleção espanhola, mas eu sempre disse que queria jogar para minha seleção, porque amo a Argentina e só sinto essas cores".

Para o jornalista Hernán Clauss, editor do diário "Olé" em Buenos Aires, Messi já está consagrado como argentino e essa discussão ainda existe, mas só entre os saudosistas. "O povo sabe que ele é muito importante para a seleção atual e já o recebe como argentino", diz. "Messi é ovacionado nos estádios, a nova geração está toda motivada por ele."

"A Argentina é o meu país, minha família, minha maneira de me expressar. Quando me perguntam por que não peguei o sotaque espanhol é simples: não quero pegar nem perder nenhuma identificação com o meu país", escreve Messi. "É um lugar para onde quero voltar. Não sei quando. Se me perguntam em que lugar eu quero estar sempre vou dizer Rosário. Com meu povo eu sou feliz".

AFP PHOTO / ADRIAN DENNIS Confio que na Copa do Mundo do Brasil podemos alcançar esse objetivo que nós nos propusemos. Estamos fortes, convencidos, sinto que vamos por um bom caminho Lionel Messi

E é na Copa do Mundo do Brasil que o craque argentino aposta que vai encontrar o reconhecimento que procura. "Trocaria todos os recordes por nos consagrarmos em um Mundial. Por fazer feliz ao povo do meu país. Confio que na Copa do Mundo do Brasil podemos alcançar esse objetivo que nós nos propusemos. Vimos trabalhando muito e bem, estamos fortes, convencidos, sinto que vamos por um bom caminho".

Agora resta esperar o apito final para saber se, além de melhor do mundo, Messi é também um visionário.

Os dados do craque

O livro traz boas estadísticas sobre o futebol argentino, e claro, sobre o Messi. Nelas pode observar-se que Lionel é o jogador argentino da história com mais gols em um ano, 12 em 2012; tem 84 jogos pela seleção argentina (sem contar os jogados pela Copa 2014); é um dos poucos jogadores a fazer gols em jogos consecutivos, Messi fez 10 gols em 6 jogos (2011-2012, ficando atrás de José Sanfilippo (1959-61) 12 em 6, Domingo Tarasconi (1928) 11 em 3 e René Pontoni (1945) com 10 em 5 jogos.

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