Protagonistas no banco: oito técnicos que mudaram história da Copa de 2014
Fernando Duarte e Guilherme Costa
Do UOL, em São Paulo
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Xinhua/Chen Jianli
Jorge Sampaoli, técnico do Chile, é um dos que mudaram seleções que estão nas oitavas de final da Copa
Em campo, não faltaram protagonistas na primeira fase da Copa de 2014. Benzema, James Rodríguez, Messi, Neymar, Robben e outros tantos jogadores foram fundamentais para as seleções que avançaram às oitavas de final. Contudo, a história dos 16 times que ainda sonham com o título do Mundial poderia ser bem diferente se fossem outros personagens sentados nos bancos de reservas. O destino do Mundial deste ano também tem relação direta com os treinadores.
Os técnicos que mudaram a história da Copa de 2014 são profissionais que tiveram papel determinante para a montagem de suas seleções. As escolhas que os treinadores fizeram e os atributos que eles priorizaram foram diferentes – tão diferentes quanto os perfis desses personagens.
Veja abaixo um pouco sobre treinadores que mudaram a história da Copa de 2014:
Jorge Sampaoli (Chile)
É difícil lidar com a sombra do técnico Marcelo Bielsa no Chile. O argentino levou a seleção vizinha de volta à Copa após duas edições de ausência, chegou às oitavas de final em 2010 e se despediu com lágrimas e status de ídolo no ano seguinte. Claudio Borghi, o primeiro substituto, não conseguiu. Deixou a equipe nacional após cinco derrotas consecutivas nas Eliminatórias, com o time fora da zona de classificação para o Mundial de 2014.
Para o lugar dele, a ANFP (Associação Nacional de Futebol Profissional) recorreu ao que havia dado certo no passado. Contratou outro treinador argentino, Jorge Sampaoli, que é fã declarado de Bielsa e implantou na seleção uma filosofia muito próxima do que havia sido feito até 2010, com apostas na marcação pressão e na saída de bola.
Com Sampaoli, o Chile acumulou 13 vitórias, três empates (um deles contra o Brasil) e quatro derrotas desde dezembro de 2012. O técnico montou um time que une destaques do Mundial sub-20 de 2007 (Medel, Vidal e Alexis Sánchez) e uma base que ele já havia comandado na Universidad de Chile (Mena, Aránguiz e Vargas).
O Chile de Sampaoli consegue reproduzir características do Chile de Bielsa, mas também tem traços da Universidad de Chile que o atual técnico da seleção havia comandado. As duas equipes têm muita movimentação, com jogadores que fazem mais de uma função em campo. Na Copa, isso funcionou até aqui: vitórias sobre Austrália (3 a 1) e Espanha (2 a 0, resultado que eliminou os atuais campeões mundiais) valeram aos sul-americanos uma vaga entre os 16 melhores do torneio.
Jorge Luis Pinto (Costa Rica)
A relação de Jorge Luis Pinto com o Brasil começou muito antes da Copa de 2014. Colombiano, o atual comandante da Costa Rica morou no país-sede do Mundial e virou até corintiano.
Pinto assistia acompanhava a torcida organizada Gaviões da Fiel em jogos do Corinthians na década de 1970. Ele esteve, por exemplo, na partida que deu ao time da capital a taça do Campeonato Paulista de 1977 – vitória por 1 a 0 sobre a Ponte Preta, que encerrou jejum de quase 23 anos sem títulos no clube do Parque São Jorge.
A carreira de Pinto como treinador foi quase toda desenvolvida em times colombianos. Ele também passou pela seleção da Costa Rica (entre 2004 e 2005), por equipes peruanas e pelo futebol venezuelano antes de voltar à seleção da América Central.
Contratado pela Costa Rica em 2011, Pinto montou um time de muita velocidade e conseguiu a segunda posição nas Eliminatórias da Concacaf para a Copa de 2014 – a seleção da América Central só ficou atrás dos Estados Unidos.
O grande feito do treinador, porém, foi registrado na Copa de 2014. A Costa Rica estava num grupo com três campeões mundiais (Inglaterra, Itália e Uruguai), mas somou sete pontos e conseguiu a primeira posição. "É a batalha da minha vida", resumiu Pinto numa entrevista coletiva em que ele ficou com a voz embargada ao lembrar do passado. Por causa desses arroubos emotivos, o técnico é conhecido na América Central pelo apelido "El explosivo".
José Pekerman (Colômbia)
A Colômbia, já classificada para as oitavas de final, venceu o Japão por 4 a 1 no último jogo da primeira fase da Copa de 2014. A vaga, a goleada e o grande número de colombianos na Arena Pantanal transformaram as arquibancadas do estádio de Cuiabá em grande festa. Nos últimos minutos da partida, alguns jogadores tiveram o nome gritado pelo público que estava no local. O técnico José Pekeman também.
O reconhecimento dos colombianos é uma boa medida do quanto o trabalho de Pekerman mudou a seleção local. O argentino assumiu a equipe em janeiro de 2012, quando os Cafeteros tinham quatro pontos em três jogos das Eliminatórias para a Copa de 2014. Conseguiu a classificação para o Mundial, o que o país não obtinha desde 1998, e ainda moldou o time que venceu as três primeiras partidas no Brasil.
Antes de 2014, a Colômbia só havia vencido três jogos em Copas. Além disso, o país nunca foi além das oitavas de final, campanha que o time de Pekerman já conseguiu ao menos igualar neste ano.
Um dos motivos para o sucesso de Pekerman na Colômbia é a segurança. Antes de 2014, o time sul-americano havia sofrido 23 gols em 13 jogos de Copa do Mundo. Neste ano, foram apenas dois em três partidas da primeira fase.
Outro atributo fundamental para a Colômbia de Pekerman é a aposta em jovens. O argentino comandou a seleção de seu país na Copa de 2006, mas suas campanhas de maior destaque aconteceram no futebol de base. Na Argentina, ele foi responsável pela primeira chance de Messi na seleção principal. Na Colômbia, deu a camisa 10 a James Rodríguez e apostou em garotos como Quintero e Ibarbo.
Vahid Halihodzic (Argélia)
Em 1982, quando participou pela primeira vez de uma Copa, a Argélia conseguiu duas vitórias (uma delas sobre a Alemanha Ocidental) e só foi eliminada no saldo de gols. Era um início promissor para a equipe africana, mas isso não se confirmou. O país só voltou ao Mundial em 1986 e 2010, mas nunca conseguiu superar a fase de grupos.
Vencer a primeira fase era o grande objetivo da Argélia em 2011, quando o técnico bósnio Vahid Halihodzic foi contratado. Famoso pelo estilo durão, ele havia feito carreira em clubes – o Paris Saint-Germain foi o maior deles.
A Argélia de Halihodzic venceu Romênia e Armênia nos dois últimos amistosos antes da Copa. Chegou ao Mundial como 22ª seleção no ranking da Fifa – a melhor posição entre os times da África. "Nós evoluímos muito nos últimos três anos e fizemos a melhor preparação possível", disse o treinador em entrevista coletiva antes de viajar ao Brasil.
A melhor preparação possível, porém, foi uma surpresa positiva até para os argelinos mais otimistas. Depois de ter dado trabalho para a cabeça de chave Bélgica, os africanos golearam a Coreia do Sul por 4 a 2. Foi a primeira vez em que um time do continente anotou quatro gols numa partida da fase de grupos da Copa. A classificação para as oitavas aconteceu num empate por 1 a 1 com a Rússia. Depois da vaga, até o durão Halihodzic chorou ao abraçar atletas e dirigentes. "Eu estou muito orgulhoso. Nós merecemos", afirmou ele.
Jürgen Klinsmann (Estados Unidos)
Há vários motivos para os alemães idolatrarem Jürgen Klinsmann. Centroavante da seleção em três Copas (1990, 1994 e 1998) e treinador em outra (2006), ele é um dos símbolos do futebol germânico. Em 2014, porém, o ex-jogador pode entrar na história de outro país. Ele é o comandante dos Estados Unidos no Mundial disputado no Brasil.
Semifinalistas da Copa do Mundo em 1930, os Estados Unidos nunca conseguiram repetir esse desempenho. Depois disso, a melhor campanha foi a de 2002, quando os norte-americanos chegaram às quartas de final. Em 2010 eles foram eliminados por Gana nas oitavas.
Klinsmann foi contratado para dar aos Estados Unidos exatamente a experiência que ele conseguiu em Copas como jogador. O alemão assumiu a seleção norte-americana em 2011 e montou um time que aposta em variações táticas – a escalação e o posicionamento oscilam de acordo com o adversário.
Em 2006, Klinsmann recebeu muitas críticas porque treinava a Alemanha, mas morava nos Estados Unidos. O carinho pelo país também apareceu no hino nacional em 2014 – ele cantou como se fosse norte-americano.
Além da experiência, da variação tática e do comprometimento, Klinsmann tem adicionado um bom ambiente à seleção dos Estados Unidos. Ele é um treinador de personalidade, que conversa com todos e dá espaço a todo o grupo.
Louis Van Gaal (Holanda)
A primeira impressão que a Holanda deixou na Copa de 2014 foi a goleada acachapante sobre a Espanha – na rodada inicial, os campeões mundiais de 2010 foram superados por 5 a 1. Ainda assim, o principal debate que envolve a seleção laranja no atual Mundial é o setor ofensivo. E o responsável por isso é o técnico Louis Van Gaal.
Ex-jogador, Van Gaal foi técnico do Ajax por seis anos na década de 1990. Depois, assumiu o Barcelona e ficou até 2000 – saiu depois de um ano sem conquistas e de uma série de brigas, até com o brasileiro Rivaldo.
Van Gaal foi contratado em 2000 para comandar a seleção holandesa, mas não conseguiu sequer classificação para a Copa de 2002. Voltou ao Barcelona e ainda passou por AZ Alkmaar e Bayern de Munique antes de assumir a seleção holandesa.
Contratado pela Holanda em 2012, Van Gaal foi escolhido por ser disciplinador. Com ele, o time europeu abriu mão da posse de bola e das trocas de posições que durante anos marcaram o estilo do país. O treinador prefere um desempenho mais pragmático, com bolas longas e velocidade pelas pontas.
Isso funcionou muito bem no começo da Copa de 2014, e a Holanda venceu os três primeiros jogos a despeito de não contar com titulares importantes, como Strootman e Van der Vaart, ambos cortados por lesão. Van Gaal também virou alvo de críticas de parte da mídia do país por ser excessivamente cauteloso.
Miguel Herrera (México)
O México sofreu demais para se classificar para a Copa de 2014. Após quase ter sido eliminado no hexagonal da qualificação da Concacaf, o time da América do Norte teve de disputar uma repescagem contra a Nova Zelândia. Foi esse o primeiro desafio de Miguel Herrera no comando da seleção.
Herrera, 46, construiu carreira de técnico em times mexicanos. Com ele, a seleção bateu a Nova Zelândia nos dois jogos e obteve vaga na Copa. No Mundial, foram duas vitórias (sobre Camarões e Croácia) e um empate sem gols com o Brasil.
A base de toda a mudança provocada por Herrera na seleção mexicana é o bom ambiente. O técnico é extremamente aberto. Famílias de jogadores podem frequentar as concentrações, por exemplo, e brincadeiras são comuns no grupo.
Fora dos treinos, Herrera chama atenção pelas comemorações expressivas em jogos do México. E pelo grande número de "selfies" que o treinador posta em redes sociais – muitas delas até com os próprios atletas.
Luiz Felipe Scolari (Brasil)
Luiz Felipe Scolari tinha sido rebaixado com o Palmeiras no Campeonato Brasileiro de 2012. A seleção brasileira tinha com o técnico Mano Menezes uma sina de não vencer clássicos. E aí, tudo mudou.
Campeão mundial com a seleção brasileira em 2002, Scolari voltou ao comando da equipe nacional em novembro de 2012. Sofreu no primeiro semestre do ano seguinte, período em que o time dele só bateu Bolívia e França, mas conseguiu montar uma equipe que venceu a Copa das Confederações.
A seleção brasileira de Felipão mudou aspectos como a presença de um centroavante (Mano vinha jogando com Neymar como referência), um volante à frente da zaga (Luiz Gustavo) e mais variação tática. Na Copa das Confederações, o time passeou por diferentes formações de acordo com a necessidade de cada partida.
Scolari também contou com a consolidação de Neymar como referência da seleção principal. Aos 22 anos, o atacante do Barcelona já é o sexto maior artilheiro da equipe nacional. Quatro desses gols foram marcados na primeira fase da Copa de 2014.