Nervos à flor da pele são tão perigosos quanto os rivais para o Brasil
Fernando Duarte, Paulo Passos e Pedro Ivo Almeida
Do UOL, em Belo Horizonte
O sinal de que o controle emocional da seleção brasileira inspira alguns cuidados não aparece apenas nas situações de jogo, como nos pênaltis perdidos por Willian e Hulk na partida contra o Chile, neste sábado. Mas principalmente no momento em que, ainda no primeiro tempo, o coordenador técnico Carlos Alberto Parreira, normalmente um dos mais comedidos sujeitos que já se sentou à beira do campo, deixa o banco de reservas brasileiro e caminha furioso em direção ao quarto árbitro, o alemão Felix Brych, para protestar contra uma falta violenta em Neymar, punida com nada mais que um sermão pelo árbitro principal, o inglês Howard Webb.
"Se existe algum tipo de complô, ele é contra o Brasil. Tem muita gente aí que não gostaria de nos ver hexacampeões, porque assim a gente abriria distância para os outros", esbravejou Parreira num canto do auditório do Mineirão pouco após a entrevista coletiva de Luiz Felipe Scolari. Seu estado de espírito não era diferente de Felipão, que durante suas respostas para a mídia internacional ali presente ameaçara abandonar a diplomacia nos diálogos.
"Hoje discutimos que estamos sendo muito cordiais e educados com os estrangeiros. Está na hora de mudar o discurso. Não precisamos ser apedrejados todos os dia. Foi um jogo tenso em que o adversário reclamava, era invasão do nosso lado da área técnica. Era coisa de guerra", reclamou Felipão, que na entrevista voltou a se queixar das arbitragens e de uma "reticência" dos árbitros.
"Não é fácil jogar em casa. Assumimos as dificuldade que temos de ser campeões. O povo abraçou essa ideia. Podíamos fugir do assunto, mas não. É isso. Quando faz uma promessa tem que ir até fundo. Existe uma tensão, uma dificuldade, uma apreensão. Faltam três para atingir o céu", completou o técnico.
Felipão coloca calejados e novatos no mesmo grupo quando fala sobre nervosismo da Copa. "Quem disse que não sente, está mentindo. Não é um jogo comum. Como temos ainda muita gente nova, vamos acrescentar experiência. Willian errou [um pênalti], mas é uma experiência. Vai acrescentar algo para ele no futuro. Vamos ver se a gente comete menos erros por inexperiência. De repente pode não ter a mesma sorte que teve hoje, aos 118 [minutos] levar uma bola na trave", admitiu o técnico sobre o ameaça chilena no fim do jogo.
Fernandinho, o homem que havia virado a salvação para o meio campo, também não escondeu a tensão ao máximo e endossou o treinador. "O homem sente medo, isso é uma coisa normal. E diante disso, busca forças para superar. É o que está acontecendo. Sentimos um medo, sim, até por tudo que envolve. Somos pessoas comuns tentando cumprir uma missão para uma nação inteira. Vamos tentando administrar e superar isso", afirmou.
Willian, meia do milionário Chelsea mencionado por Scolari, é outro que confirma a percepção do treinador. "Emoção está muito intensa mesmo. Temos que segurar. Hoje [sábado] foi um pouco acima da média, mas o jogo explica isso", afirmou, para em seguida tentar relativizar e ver um lado bom na coisa toda. "E essa tensão toda pode ser boa. Acredito que no próximo [jogo] entraremos mais tranquilos, acostumados, depois de passar por essa decisão. Além disso, a confiança também aumenta. Estamos ficando mais preparados para decisões", completou.
O técnico também chamou a atenção pela comemoração efusiva ao final da disputa de pênaltis, em que as câmeras captaram uma expressão em júbilo que dividia espaço com o restante de 120 minutos de tensão. Mas é seu time que está preocupando mais os torcedores. Numa partida em que precisou jogar fora de sua zona de conforto e, literalmente, correr atrás da bola durante a maior parte do tempo, a seleção sentiu o peso das dificuldades e em diversos momentos houve discussões mais acaloradas entre os jogadores.
E o capitão Thiago Silva, que durante as cobranças de pênaltis pareceu quase tão abalado quando Hulk e Willian – ele não participou da operação "levanta-moral" em que companheiros foram buscar os "desperdiçadores" na volta para o centro do gramado, por exemplo – admitiu a intranquilidade. "É uma questão de pressão. Sabemos que só um título interessa. Se formos eliminados ou ficarmos em segundo, acabou tudo. É um peso, sim. Temos que saber trabalhar com isso".
No fim do dia, a seleção sobreviveu ao que poderia ser a pior campanha brasileira num Mundial desde 1990, mas com o "requinte de crueldade" de uma nova derrota traumática em casa. Mas as evidências de que a pressão está causando um pouco mais de problemas que os jogadores e a própria comissão técnica imaginavam apareceram abertamente em Belo Horizonte.