Fan Fest que nada. Eu vou curtir a Copa em Manaus na praça!

Felipe Pereira

Do UOL, em Manaus (AM)

Manaus voltou no tempo na Copa do Mundo. Como na época dos nossos avós, a cidade se encontrou na praça. O Largo São Sebastião, em frente ao majestoso Theatro Amazonas, se tornou o ponto de convergência de torcedores de todas as nacionalidades. Até daqueles que não tinham seleção na cidade.

Desde que a Copa começou, os moradores da cidade viram croatas cantando na chuva da meia-noite, ingleses fantasiados cercados por pedidos de fotos e portugueses aos berros, com bumbo e apito para fazer a marcação.

Na praça, nem todo grupo de amarelo torcia pelo Brasil. Teve bolinho de colombianos comemorando mais uma vitória de Armeiro & cia. E australianos pulando da cadeira a cada lance perigoso de Tim Cahill – detalhe: uma dessas partidas foi em Porto Alegre, lá, do outro lado do Brasil. Teve também grito de "Chi Chi Chi Le Le Le" quando a Espanha experimentou seu Maracanazo. E o que dizer dos venezuelanos? Nem no Mundial eles estão, mas fizeram festa. E peruanos? Tinha também.

Resumindo: se tinha torcedor na capital amazonense, ele passou pelo Largo São Sebastião. Mesmo que esse ponto não tenha sido o escolhido pelas autoridades amazonenses. A ideia era reunir todo mundo a 13 km do centro da cidade, na praia de Ponta Negra. Teve bastante gente? Teve, mas não era o lugar para se estar. O "point", mesmo, era a praça. Foram os torcedores que decidiram ocupar o Largo, na imitação mais alegre do "Occupy Wall Street" que Manaus já teve. E, passavam os dias, a cidade ia se adaptando.

Na primeira noite do "Occupy Largo", a polícia apareceu porque era tanta gente andando que o espaço acabou. Uma rua foi fechada. Rendidas à realidade, agora são as próprias autoridades que proíbem a circulação de carros. No sábado, o quarteirão inteiro foi cercado por grades.

E não foi a única mudança. O local foi ganhando infraestrutura. E o que era só uma praça, ao longo da Copa, ganhou um palco com um telão. Foi pouco. E logo ele ganhou a companhia de outro telão. E cadeiras de plástico, para que as pessoas acompanhassem as partidas sentadas. O sol, vilão dos jogadores dentro de campo, foi só um amigo que aproximava as pessoas. Conforme o dia avançava, a sombra diminuía e todos se espremiam embaixo das árvores, confraternizando.

O avanço do relógio também mudava a característica dos frequentadores do espaço. As famílias chegavam para ver o primeiro jogo. E como Manaus está uma hora atrasada em relação ao horário de Brasília, pouco antes do meio-dia já tinha gente no local.

Eles assistiam à partida e, na sequência, almoçavam nos restaurantes próximos. Nas mesas, tambaquis, o peixe amazônico que pode chegar aos 30 quilos, com espinhos tão grandes que viram um selfie obrigatório de cada turista. Um registro para poder provar que o peixe não é história de pescador.

Quem aparece quando a primeira partida está acabando está no limite entre a torcida e a balada. Estes dão suas voltas, param para uma bebida aqui, para uma isca ali, mas voltam e ficam até altas horas. A animação cresce não conforme o tempo avança, mas com a quantidade de cerveja aumentando na corrente sanguínea.

É nesse momento que esses turistas ganham reforço dos moradores de Manaus, que vão para a praça mais tarde, quando estão livres dos compromissos mundanos. Surgem moças maquiadas, montadas no salto, sonhando com um príncipe encantando estrangeiro. Os rapazes reclamam, dizendo que são bobas, que não podem ver um gringo.

Elas apenas lamentam a barreira do idioma. São poucos os moradores da cidade que sabem inglês. A solução era estar sempre com o celular em mãos, com Google Tradutor sempre pronto a funcionar. Para os meninos, não há muita saída. A pequena presença de estrangeiras faz a ferramenta ser inútil para o público masculino.

Outra consequência do horário é onde fica a maior concentração de pessoas. Pela manhã, o coração do Largo bate perto dos restaurantes. Por motivos óbvios, o Bar do Armando, do outro lado, é o centro das atenções na noite. O monumento que fica no meio da praça é ponto de encontro, com suas escadas servindo de banco.

Dezenas de policiais, espalhados pelos cantos da praça ou postados ao lado das viaturas com seus giroflex ligados, só observam o movimento. Quando o "Jornal Nacional", da Globo, termina, o clima de festa impera. Aí prostitutas e travestis aparecem buscando clientes.

O sinal de que a festa está acabando é a fila de táxis no entorno do largo. As pessoas começam a ir embora à 1h. A tabela faz com que muitos torcedores estrangeiros saiam da capital amazonense no dia seguinte, para outro jogo, outra cidade, outra balada, outras descobertas. Mas quem passou por Manaus vai sempre lembrar daquele dia em que ficou na praça, tomou uma cerveja, comeu um peixe gigante, conversou com um manauara e viveu a Copa no coração da Amazônia.

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