Empresa que vende ingressos para a Copa está na mira do Cade
Tiago Dantas*
do UOL, em São Paulo
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Reinaldo Canato/UOL
Possibilidade de Match fazer venda casada de ingressos e reservas em hotéis poderá ser investigada
O Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) pode abrir uma investigação contra a Match Services AG, empresa escolhida pela Fifa para fornecer ingressos para a Copa do Mundo de 2014 e acomodação para atletas e dirigentes durante o Mundial. Segundo o MPF (Ministério Público Federal), a Match cometeu infrações contra a ordem econômica ao adotar práticas semelhantes à venda casada, proibida no país, e que limitam a livre concorrência.
Após analisar os contratos que a Match firmou com 929 hotéis brasileiros, o procurador Frederico Paiva, do Ministério Público Federal de Brasília, afirma ter encontrado três problemas. Em primeiro lugar, ao reservar parte dos quartos para acomodar seleções, a Match proíbe o hotel de negociar as demais reservas por preços mais baixos, o que pode inflacionar o preço das demais acomodações. O segundo ponto é a possibilidade de que a empresa faça venda casada, já que detém o monopólio sobre os ingressos. Por fim, o procurador acusa a parceira da Fifa de praticar uma taxa de lucro muito acima do que fazem as operadoras de turismo nacionais. A Match nega todas as acusações.
O MPF encaminhou uma representação ao Cade em 13 de agosto. O conselho informou que ainda está analisando o pedido. Caso os conselheiros encontrem indícios de irregularidades na conduta da Match, uma investigação será aberta. A análise pode durar até 90 dias, mas o resultado deve ser divulgado antes, já que foi determinada urgência para o caso.
"A Match procura hotéis de alto padrão e reserva uma parte dos quartos por um valor alto. Por contrato, ela obriga o hotel a não cobrar um preço menor nos quartos restantes. Assim, o céu é o limite para os valores desses outros quartos", afirma o procurador. Segundo ele, os contratos apresentam inícios de práticas que limitam a concorrência. A Match nega que tenha influência sobre os preços de hotel. "Nem a Match nem a Fifa regulam os preços. Eles são fixados pelos donos de hotel e pelo mercado turístico", informou a empresa, por meio de nota. Há, porém, um "pequeno número de exceções nas quais a Match teve que aceitar tarifas mais altas que as normais".
Os valores médios das diárias de hotéis devem subir até três vezes durante a Copa, segundo pesquisa feita em junho pela Embratur, empresa ligada ao Ministério dos Esportes. Em São Paulo, o preço médio de um quarto deve saltar de R$ 165, em agosto de 2013, para R$ 332, em junho de 2014. No Rio de Janeiro, a variação no mesmo período deve ser de R$ 184 para R$ 461 – a pesquisa mostrou que, durante a Copa das Confederações a taxa ficou em R$ 203.
Paiva afirma ter encontrado sinais de ao menos mais duas irregularidades. A primeira é a possibilidade de ocorrer a chamada transferência de poder de mercado. Como detém exclusividade no fornecimento de ingressos, a Match poderia oferecer pacotes que incluem hospedagem ao público geral por meio de um programa chamado "Hospitality", o que representaria uma vantagem ilegal em relação a outras agências de turismo, que não podem fazer barganha com o preço do ingresso. A venda casada é proibida pela legislação brasileira.
Lucro alto
A Match Services informou que foi escolhida pela Fifa para reservar hotéis em "condições justas e preços razoáveis" apenas para as seleções participantes, "autoridades, representantes, convidados e funcionários da FIFA e do Comitê Organizador Local", além de "prestadores de serviços nas áreas de transmissão de TV, emissão de ingressos e serviços de TI". Outro grupo de quartos é reservado a parceiros comerciais e integrantes da imprensa. Sobre o programa "Hospitality", a empresa disse que ele envolve apenas a venda de camarotes nos estádios, embora os nomes dos hotéis possam ser consultados em seu site oficial.
O segundo ponto, segundo o MPF, é o que Paiva classificou de "lucro muito alto" da Match. Ao negociar os pacotes com os hotéis, a empresa fixa uma margem de lucro de 30%. O procurador afirma que, segundo dados da Embratur, os operadores de turismo brasileiros costumam praticar taxas entre 10% e 15%, o que os colocaria em desvantagem. A prática estaria ferindo os princípios a livre concorrência. "Entendo que algumas práticas da Match são anticoncorrenciais, por isso procuramos o Cade, responsável por analisar essas questões. Mas o MPF não exclui a possibilidade de tomar outras medidas", disse Paiva.
Com relação à taxa de lucro, a Match declarou que opera com margens entre 10% e 30%, que estão "dentro das normas da indústria turística". "Também deve ser notado que a Copa do Mundo é um evento único, tornando difícil a comparação com outros eventos", afirmou a empresa, em nota.
Fifa defende empresa
Questionado sobre os serviços da Match na quarta-feira, o secretário-geral da Fifa, Jérôme Valcke, defendeu a empresa . Afirmou que a Match é parceira da entidade máxima do futebol há anos e, assim como a Fifa, é favorável que o maior número de pessoas assista aos jogos do Mundial pagando pelo menor preço possível em hotéis. "O que queremos que as pessoas possam aproveitar a Copa do Mundo", disse.
O diretor de Marketing da Fifa, Thierry Weil, afirmou que a Match não trabalha com qualquer tipo de prática comercial irregular. Disse também que isso já será explicado ao Cade caso seja necessário. "Não há qualquer monopólio. O assunto está claro."
*Atualizada às 13h, com a colaboração de Vinicius Konchinski, do UOL, no Rio de Janeiro
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